11 agosto 2025

Abraham Sicsu opina

Financiar o Plano Nacional de Desenvolvimento: um debate ainda aberto
Abraham B Sicsu  


 

Muitos têm declarado que o problema do Brasil é a falta de um Projeto de Desenvolvimento. Ouso discordar. Na transição para o atual Governo, no meu entender, foi elaborado um plano bem definido, com Missões para resolver os principais problemas nacionais, com objetivos bem definidos, com metas realistas. Áreas como Educação, Saúde, Inovação, Combate à Fome, Emprego de qualidade, Moradias dignas, são tratados de maneira clara, com propostas viáveis.

Se é assim, a questão que fica é o porquê do avanço ainda lento nas direções desenhadas?

Muitos fatores podem ser apontados nessa direção. Mas, sem dúvida, dois entraves são os principais, a guerra política, a polarização radicalizada de nossa sociedade, e a dificuldade de financiamento do planejado.

Quanto ao primeiro, especialistas analisam de uma maneira clara a polarização e os entraves que a cada momento podem ser observados. Pouco teríamos a acrescentar.

Nossa preocupação atual é no que tange à possibilidade de financiamento do plano e avanços que possam ser dados nessa direção.

Deve-se partir de algumas constatações.

Vivemos num país muito desigual, seja de renda, seja regionalmente. Problema que tem de ser enfrentado para poder se avançar com maior equidade.

Nossa dívida pública não é descomunal frente à de outros países. Contudo, está concentrada nas mãos de capitais que exigem taxas de juros excessivamente altas como remuneração. Em outras palavras, viabilizar o financiamento do projeto desenvolvimentista passa por uma grande limitação da remuneração da dívida pública, a qual tolhe as possibilidades de implantar os programas conforme idealizados.

Pode-se argumentar que o Estado poderia emitir moeda para esse financiamento. Caminho impedido dadas as conseqüências inflacionárias em uma economia que está crescendo a taxas significativas, além de esse ser um caminho praticamente impedido tendo em vista os interesses dos capitais financeiros, dos ditos rentistas, o que levaria a uma instabilidade política ainda maior daquela que atualmente enfrentamos.

Com esse quadro, algumas opções parecem ser interessantes de ser analisadas e devem ser tentadas, com a urgência que o caso requer.

Um primeiro ponto a enfrentar é o escorchante nível da taxa de juros que é balizado pela SELIC. Evidentemente que interessa aos rentistas e todos os aplicadores financeiros. No entanto, traz dificuldades profundas para o Estado, através da Dívida Pública. O pagamento dos juros é o principal item de gasto governamental. E mais, afeta nitidamente o nível de investimento no País, bastante baixo.

Este item está fortemente condicionado pela lógica de atuação do Banco Central e pelas decisões do Conselho Monetário Nacional. Manter as decisões atuais sobre taxa inflacionária desejada não faz sentido. Ver fantasmas que elevariam a inflação a patamares inimagináveis parte de modelos de teorias da moeda que esquecem ser possível criar expectativas positivas como bem apresentadas na Nova Teoria Monetária.

Se não for criada confiança, fidúcia, nas instituições que pressionam a definição da banda desejada inflacionária, mude-se a meta inflacionária em meio ou um ponto percentual, mas faça-se um movimento para a redução já da taxa SELIC. Só isso fará com que se mude o patamar de investimento direto, patamar fundamental para o desenvolvimento desejado.

Um segundo ponto a ser tratado é a contribuição efetiva dos diferentes extratos de renda para as finanças públicas, a fim de permitir um desenvolvimento mais efetivo.

A Escola de Economia de Paris, escola que tem a frente de seus estudos Piketty e Zucman, entre outros, desenvolveu uma base de dados muito interessante. A World Inequality Database- WID. Nela se pode ver que o Brasil é um país extremamente desigual, onde o 1% mais rico detém mais de 50% da renda nacional. A questão básica é saber como eles, os mais ricos, contribuem para as finanças públicas e como auxiliam no desenvolvimento.

Zucman demonstra, por exemplo, que, nos países que estudou, inclusive o nosso, enquanto a alíquota média efetiva de imposto de renda era de mais de 30%, para os assalariados, a dos mais ricos ficava no entorno de 20% ou abaixo. Uma brutal desproporcionalidade e injustiça social.

No Brasil, mais alarmante, quase metade da arrecadação de impostos vem da tributação do consumo, o que, proporcionalmente, afeta muito mais as classes assalariadas e subempregadas que têm sua renda fortemente comprometida com este item. Bem diferente da dos super-ricos, os quais têm parcela bem reduzida nesse tópico de composição da alocação de sua renda.

Com esse quadro, existe uma proposta do Ministério da Fazenda de taxar os mais ricos, aqueles que ganham mais de um milhão de reais por ano, em pelo menos 2% das grandes fortunas, medida mais do que justa. Agregado a isso, se propõe a taxação dos dividendos distribuídos de ações, evitando o entesouramento excessivo, fazendo com que esses recursos voltem para a esfera produtiva. Medidas de justiça social que, infelizmente, por razões políticas e corporativas, não conseguem passar no Congresso Nacional.

Outro ponto fundamental a ser analisado é o do rompimento com o exclusivo padrão dólar nas relações internacionais. Isso inibe as relações com países que não têm reservas significativas de dólares, tolhendo as possibilidades de expansão produtiva e de investimentos de porte.

A China, recentemente, quebrou esse padrão com países da Ásia e pode servir de exemplo. Aceitar uma cesta de moedas de países como as dos BRICS  ou mesmo do MERCOSUL muda a lógica do comércio internacional e diminui a submissão que, atualmente, se tenta fazer com o Tarifaço e as imposições dos norte americanos.

Associado a isso, se um dos nossos principais problemas, do baixo padrão de produtividade e competitividade que apresentamos, é o custo Brasil, resolver problemas de nossa infraestrutura com financiamentos de longo prazo e parcerias como as oferecidas pelos chineses, pode ser caminho seguro para aliviar a dívida pública na medida em que se evita a emissão de títulos para captação de recursos a custos muito elevados como os praticados atualmente.

Em outras, palavras, com taxas bem menores do que as que pagamos enquanto País, o alongamento da Dívida Pública e seu custo menor a juros bem subsidiados, permitiriam um maior controle e diminuição das dificuldades atuais. Resolveríamos os principais problemas de infraestrutura sem comprometer as finanças públicas.

Ou seja, pode-se diminuir a necessidade de captação de recursos nos mercados financeiros, que aumentam e comprometem a dívida pública, com parcerias produtivas bem escolhidas e financiamentos de longo prazo. Um projeto como o Programa de Aceleração do Crescimento – PAC pode ser viabilizado dessa maneira, por exemplo, sem emissão de títulos adicionais aos custos exigidos atualmente, para seu financiamento.

Em síntese, há como financiar o desenvolvimento que desejamos. Como disse no início, isso passa necessariamente pela questão política, o que é muito mais difícil de resolver. O tema é complexo. Não existe uma fórmula pronta. Aqui se propõe apenas algumas alternativas e possibilidades. A efetivação passa por um firme posicionamento governamental de não continuaAbraham B. Sicsur refém do capital rentista.

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Leia também: Para além do “economicismo governamental” https://lucianosiqueira.blogspot.com/2025/07/minha-opiniao_5.html

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