21 julho 2010

Meu artigo semanal no Blog de Jamildo (Jornal do Commercio Online)

Sonhando com arte
Luciano Siqueira


Das muitas formas com que a cidade se comunica com os seus habitantes e com aqueles que a visitam, as linguagens da arte certamente são as mais sensíveis. Expõem a cidade como ela é, com seus encantos e suas mazelas, seus amores e suas dores. E refletem, de uma maneira ou de outra, a alma do seu povo.

Certa vez, em 2003, no hall do Aeroporto dos Guararapes, pude inaugurar, na condição de prefeito em exercício, a mostra “Sonhando com arte” – uma amostragem do universo de sofrimento e de esperança de crianças e adolescentes da cidade do Recife em situação de rua, sujeitas a toda sorte de riscos, como a prostituição, a prática de delitos e o consumo de drogas. Uma denúncia viva, contundente. Também um grito de esperança. Daniel, Andresa, Michael, Rodrigo, Rafael, Vanessa, Williams, Cleiton, Michele, Cleidy, Jefferson - assim batizados por seus pais como que para exorcizar a perversa vida a que parecem eternamente condenados os chamados Josés e Marias, Raimundos e Joanas das nossas periferias urbanas - pintam, com traços toscos e cores vivas, sobretudo barcos, estradas floridas, montanhas e sol, revelando o desejo de se transportarem para outra realidade.

De fato, os depoimentos dos jovens pintores eram emblemáticos. “Eu quero ter um esposo e uma família”, diz Andresa, 12 anos. “Sinto desejo de estudar”, diz Lucas, de 11 anos. “Quero uma casa para pegar meu filho para criar”, sonha Michele, 17 anos.

A mostra fez parte do programa Educação Social de Rua, da Secretaria da Política de Ação Social da Prefeitura do Recife (em parceria com o Instituto de Ação Social e Cidadania, a Cruzada de Ação Social, o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, os Grupos Ruas e Praças e Pé no Chão), tendo como foco crianças até 17 anos, originárias de lares em condições de extrema pobreza. Oferecia aos meninos e meninas atividades lúdicas, tendo a arte como principal instrumento de abordagem, na expectativa de que a partir daí se pudesse promover a reintegração familiar, comunitária e escolar. Eram atendidas pouco mais de 230 crianças e adolescentes, 70% dos quais já conseguiam deixar as drogas – asseverava a então secretária Ana Farias.

O primeiro contato impressionava, doía, marcava. Mas ficava a sensação de que um mundo novo é possível se combinarmos a denúncia viva com a luta certeira para romper com os condicionantes fundamentais da proliferação de nossa população em situação de rua.

Este e mais oito programas desenvolvidos pela Prefeitura na gestão do prefeito João Paulo, centrados no protagonismo juvenil, atingiram mais de 40 mil crianças e adolescentes, inspirando-se no propósito da inclusão social e da afirmação da cidadania. E contribuíam certamente para elevar a consciência cidadã de todos nós que nos deixamos impressionar por aquele exemplo vivo de resistência e nos sentimos mais comprometidos ainda com a mudança de rumos em curso no desenvolvimento do nosso país.

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