Veja o texto publicado na última quinta-feira:
“Data vênia, Palavra de honra”
Havia pedido uma audiência ao “Exmo. Sr. Vice-Prefeito” – as palavras pronunciadas assim, entre aspas e com toda a formalidade -, anunciando apenas que o tema seria de “alta relevância para a comunidade”, sem entretanto declinar os detalhes.
Umas três semanas após nossa breve conversa ao telefone, o atendemos em nosso gabinete. Já nem nos lembrávamos ao certo de quem se tratava. Nem do assunto. Apenas o nome, anunciado pela secretária, pouco comum (que não declinaremos aqui, pois raro que é pode fazer dessa crônica um ato de imperdoável indiscrição), nos fez recordar a voz e os termos alegóricos com que se expressa.
E bote alegoria nisso. Moreno claro, cabelos grisalhos, magro e ligeiramente alquebrado em seus talvez setenta anos, porém de olhar firme e gestos largos. O terno preto e a pasta tipo 007 também preta, ambos surrados, sugeriam um aposentado de poucas posses.
E assim tivemos o que ele chamou de “colóquio” entre um “ínclito homem público” (esse amigo de vocês) e um “emérito assessor informal de diversas entidades e instituições de utilidade pública”, ele próprio, assim auto-apresentado.
Tinha queixas a fazer. Quase todas procedentes, de vendedores ambulantes ocupantes de calçadas no centro da cidade, a impedir o livre deslocamento dos transeuntes; a sujeira do canal Farias Neves, no Arruda, que a Prefeitura limpa mas o povo cuida de novamente encher de lixo; da irregularidade das aulas de uma professora de matemática numa escola (esta estadual) do bairro; da má qualidade do transporte coletivo em algumas áreas... e assim por diante. Uma lista alentada. E para cada problema, organizadas em pastas, cópias de memorandos, ofícios, apelos; e de respostas, poucas, aos expedientes que havia enviado aos órgãos públicos.
Documentos à mão, ao final da “sustentação oral” de cada um dos seus reclamos e das suas propostas:
- “E em assim sendo, diante de tais fatos sobejamente comprovados e devidamente documentados, como V. Exa. pode constatar, aqui me encontro para reiterar este pleito ao qual aduzo a minha palavra de honra.”
- Sim, amigo, compreendi. Mas, veja, alguns dos problemas que o senhor me apresenta carecem de um exame mais atento e de providências que prometo tomar, juntamente com o nosso prefeito, junto à Secretaria da área.
- “Acredito e confio, porém quero aduzir, com a devida vênia de V. Exa., que será da maior importância para o bom termo dessas providências, que esse “emérito assessor informal” tenha o ensejo de fazer a mesma sustentação oral que acabo de proferir.”
- Seus argumentos são válidos (e eram mesmo, apenas empolados em demasia), mas não é necessário uma audiência para cada um desses problemas. Podemos agir com rapidez e garanto que o senhor será informado de tudo e em tempo hábil.
- “Isto posto e diante da ponderação de V. Exa., resta-me aceitar que assim seja, mas permita sugerir que as informações emanadas dos órgão municipais me sejam comunicadas por escrito, para que possa arquivar a documentação correspondente.”
A essa altura cabia encerrar a conversa e escalar um integrante de nossa equipe para lidar com tão ilustre cidadão no desdobramento das providências que passamos adotar. Para a tranqüilidade do “emérito assessor informal”.
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