Coluna semanal no portal Vermelho
Carnaval, preconceito e alianças
Luciano Siqueira
Cá em terras maurícias já é Carnaval desde o primeiro dia do ano. E Carnaval é tempo de botar de lado preconceitos, inibições e extravasar frustrações, sonhos, esperanças. Ao modo de cada um – e há modos para todos os gostos.
Também é tempo de eleição – e, após o Carnaval, caem as máscaras e todos se lançam aos finalmente na tentativa de ajuntar forças e enfrentar a guerra, que nas ruas começa em julho, após as convenções partidárias e tão logo o Tribunal Regional Eleitoral homologue as candidaturas. Aí cada um vai com o que tem e com o que consegue juntar. E toda aliança é benéfica, desde que fundada em compromissos mútuos assumidos perante o povo, devidamente explicitados numa plataforma (ou, como alguns preferem chamar, programa).
Na construção das alianças, se a pedra de toque é a plataforma não cabe nenhum tipo de preconceito. Muitas vezes líderes e partidos que assumiram antes posturas conservadoras, hoje se colocam em favor de proposições avançadas, mesmo que não as assumam em sua inteireza. Mas as apóiam e se dispõem a somar energias na luta para torná-las vitoriosas. É por isso que se diz que não se deve fazer política olhando pelo espelho retrovisor.
Também é preciso considerar que numa coligação partidária cumpre preservar a identidade de cada partido coligado, numa relação de respeito mútuo. Estão juntos, porém diferenciados aos olhos do eleitorado – que os vê unidos em prol da plataforma, mas percebe que se trata de uma união entre diferentes. É como o óleo e a água postos num mesmo recipiente.
A História do Brasil é rica de conquistas populares apoiadas em alianças amplas e heterogêneas. Desde a Insurreição Pernambucana, talvez a primeira experiência de frente ampla em nosso país, que uniu trabalhadores rurais, índios, donos de engenhos e comerciantes e conseguiu expulsar o invasor holandês. Havia claras contradições entre esses segmentos sociais, mas havia também um ideal comum que os impeliu à luta. Por isso venceram.
Outro exemplo recente foi o fim da ditadura militar. Tancredo Neves se elegeu presidente num terreno preparado para perpetuar o regime, o Colégio Eleitoral, numa eleição indireta, derrotando Maluf (candidato dos militares) através de uma ampla frente que incluiu parcelas dos antigos integrantes da situação, que vieram a formar o recém-extinto Partido da Frente Liberal (atual DEM). Sem aquela amplitude a vitória seria impossível e vencer foi decisivo para o início, em 1985, do atual ciclo democrático que vivemos.
Então, entre a alegria geral e os passos do frevo e do maracatu, vale cantar os versos de Pedro Mariano (que Elis Regina imortalizou em bela interpretação): “Com esse que eu vou sambar até cair no chão/Com esse eu vou desabafar na multidão”.
Porque após o Carnaval, será a hora da onça beber água – e de concretizar as alianças, sem preconceito nem sectarismo.
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