O imediato e o estratégico no debate eleitoral
Luciano Siqueira
Fosse a cidade um indivíduo sob cuidados médicos, o prognóstico não seria nada alentador: diante de um quadro clínico complexo e arriscado (são graves os impasses que vivem nossas cidades hoje), o que se vê são diagnósticos apressados e superficiais e condutas terapêuticas não raro pontuais e imediatistas.
É o que se constata no debate eleitoral que se inicia, inclusive em grandes cidades. É como se a busca do voto justificasse palavras de efeito e promessas retumbantes, em detrimento da busca de soluções reais para problemas de fundo.
Claro que isso não acontece com todos os candidatos. Mas acontece com a maioria.
Ninguém desconhece que é preciso sensibilizar amplas parcelas do eleitorado e que, para tanto, é preciso difundir duas ou três idéias-força, traduzidas em palavras de ordem, em marca desta ou daquela candidatura, para atrair simpatia e despertar emoções. Assim acontece inclusive em lutas políticas de maior envergadura, como em rupturas revolucionárias. Na velha Rússia a palavra de ordem Pão, Terra e Paz é que concentrou as energias de milhões que lograram instaurar o poder proletário no lugar do tzarismo (mas a palavra de ordem remetia ao programa socialista).
Mas daí a subestimar a necessidade de formular proposições consistentes e factíveis para os problemas que afligem a cidade há uma distância enorme. O candidato a governante tem que dizer a que veio, assumir compromissos com soluções de cunho estratégico para problemas estruturais; e, ao mesmo tempo, agitar bandeiras imediatas que não neguem esses compromissos, antes os traduzam de modo simples e compreensível por todos.
Não adianta debater agora o que o povo não entende, costumam dizer alguns dos chamados marqueteiros. Interessa, sim, conquistar o voto – em muitos casos a custa inclusive de agressões pessoais ou de promessas vãs. Plano de governo é assunto para depois, dizem.
Nada mais equivocado. Quem disse que o povo não entende, por exemplo, de um problema crucial que é a ocupação e o uso do território – motivo de conflitos cotidianos em grandes e médias cidades, tema nodal na revisão do Plano Diretor. Entende, sim. Tanto que organiza movimentos em prol da moradia e debate em fóruns diversos os impasses econômicos e jurídicos que envolvem o tema.
Eleição é, a um só tempo, conquista de postos de mando e oportunidade de elevação da consciência do povo. Sem um debate de idéias esclarecedor não se constrói base social sólida para arrostar os problemas cruciais da cidade.
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