27 maio 2009

Artigo de toda quarta-feira no Blog de Jamildo (Jornal do Commercio Online)

A Batalha de Itararé e a abortada reforma política
Luciano Siqueira


A historinha é do século passado e quase todo mundo a conhece – pelo menos os de minha geração. Por ocasião da Revolução de 1930, as forças da Aliança Liberal lideradas por Getúlio Vargas marchavam com destino a São Paulo e se esperava um choque de proporções imprevisíveis com destacamentos leais ao presidente Washington Luis em Itararé, município paulista de localização considerada estratégica. Mas ao contrário, Getúlio foi recebido com festa na estação ferroviária. O presidente havia sido deposto pouco antes e o poder mudara de mão.

Aparício Torelly, militante comunista e precursor do humorismo político brasileiro, diante da “batalha que não houve” não se fez de rogado: em seu jornal A Manha, se autoproclamou Duque "pelos relevantes serviços prestados no front".

A reforma política que ontem saiu de pauta na Câmara dos Deputados é uma espécie de Batalha de Itararé moderna e os vetustos parlamentares, refratários a toda e qualquer reforma de sentido democratizante, seus modernos duques. E haja comenda para dar conta de premiar a maioria conservadora!

Onde esbarrou a reforma? Justamente na falta de consenso em torno da adoção de dois dispositivos que se apresentavam como inovadores: o sistema de listas pré-fixadas para o pleito proporcional e o financiamento público das campanhas.

O primeiro fortaleceria os partidos, na medida em que o eleitor passaria a valorizar programas em lugar da escolha ultra personalizada nos indivíduos, como hoje acontece. Os candidatos teriam que defender o programa partidário e com ele se fazerem comprometidos – e, por conseqüência, em sua atuação parlamentar, guardar coerência com as idéias defendidas em praça pública. A fidelidade partidária, por essa via, seria natural e transparente, dispensando mecanismos de coação.

O segundo dispositivo, financiamento público das campanhas eleitorais, reduziria substancialmente a influência do poder econômico que corrompe e desvirtua o processo democrático, distorcendo a vontade do eleitorado.

Não se estabeleceu consenso em torno dos dois dispositivos, nem entre os partidos que dão sustentação ao governo, nem entre os que se situam na oposição. A rebelião nas “bases” das bancadas, estimulada pela grande mídia que torpedeou o tempo todo os dois dispositivos democratizantes, levou ao enésimo aborto da reforma. Uma cena recorrente a cada quatro anos, justamente no interregno de eleições gerais. E mais uma batalha de Itararé finda, sem tiros nem loiros. Que se distribuam então títulos nobiliárquicos para fazer jus à maioria conservadora.

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