A pouca cultura nossa de cada dia
Luciano Siqueira
Quando subi ao palco – a contragosto, pois palco em evento cultural é para os artistas – ao lado do então prefeito João Paulo, no Marco Zero, numa tarde de domingo, por ocasião de um concerto da Orquestra Sinfônica do Recife, não contive a emoção ao perceber a composição do público de cerca de cinco mil pessoas ali reunidas: gente do nosso povo, boa parte vinda de bairros periféricos, a quem se atribui (erroneamente) a preferência quase exclusiva por produtos musicais de baixa qualidade popularizados pela grande mídia.
Cena semelhante pôde presenciar durante os oitos anos em que estivemos na Prefeitura do Recife. Em espetáculos gratuitos, pois produto cultural de qualidade custa caro.
A observação vem a propósito de um estudo feito há algum tempo pela Universidade Federal de Minas Gerais, a propósito do baixo dispêndio do brasileiro com cultura: apenas 40% dos habitantes de nossas regiões metropolitanas tem esse item em seu orçamento familiar.
A estimativa se apóia em informações contidas na Pesquisa de Orçamento Familiar, realizada entre 2002 e 2003 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O estudo focou nove regiões metropolitanas – Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Salvador, Recife, Fortaleza e Belém – e do Distrito Federal e procurou cruzar idade, escolaridade e renda no consumo de artigos de áudio, vídeo, leitura e arte, além de ingressos de teatro, shows, cinema, museus e estádios. Também incluiu a aquisição de instrumentos musicais, aparelhos de televisão, máquinas fotográficas e gastos com internet e TV por assinatura.
Na interpretação dos pesquisadores, dois fatores principais determinariam esse perfil de baixo consumo de cultura: preço e nível de escolaridade.
Pode ser. Quanto a preço cobrado em casas de espetáculo e por produtos como CDs, DVDs e livros, por exemplo, está longe do alcance da média de uma população cuja massa salarial é baixa.
Mas quanto à escolaridade, cabe dúvida. Pelo menos pela observação empírica das bem sucedidas tentativas de ofertar no Recife produtos de qualidade para grandes públicos formados por extratos mais populares e de reconhecido baixo nível de instrução formal.
O problema não é simples, é evidente. Reclama inclusive políticas públicas que convirjam no sentido de baratear custos dos produtos culturais – algo complexo que implica ação sobre toda a cadeia produtiva da cultura – e, obviamente, melhorar a qualidade de vida da população que vive do próprio trabalho, do ponto de vista material e espiritual. Vale refletir.
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