O debate necessário, porém impossível
Luciano Siqueira
Impossível, sim, nas circunstâncias de hoje. Refiro-me a um esclarecedor debate entre os candidatos finalistas à presidência da República, em cadeia única de TV e rádio (e transmissão direta pela Internet). Com tempo suficiente para que os litigantes pudessem expor claramente suas opiniões e propostas programáticas.
Uma coisa assim: no primeiro bloco, Dilma e Serra teriam dez minutos para apresentarem as linhas essenciais dos seus programas de governo. Num segundo bloco, ambos teriam igual tempo para tecerem considerações críticas sobre as propostas do adversário, cotejando-as com suas próprias propostas, de modo a distinguir e aprofundar divergências. Num terceiro bloco, a possibilidade de ambos responderem, à luz de suas linhas programáticas, perguntas feitas pelo público ou mesmo por jornalistas credenciados acerca de questões específicas ou setoriais – tipo enfrentamento da violência criminal urbana, política de juros, transporte, política agrícola e quejandos.
Antes das clássicas “considerações finais”, os candidatos ainda teriam um tempo para uma síntese de suas opiniões e para sublinharem o que considerassem mais importante em suas propostas de governo.
Por esse modelo, é claro que a polêmica seria estabelecida sem o constrangimento de perguntas de um minuto, respostas de dois e réplica ou tréplica de um minuto e meio. Não; haveria tempo para que o raciocínio de cada um viesse à luz em sua inteireza. E, ao final da peleja, o eleitor guardasse elementos suficientes para fazer o seu próprio juízo de valor.
Isso seria o inverso do que ocorre hoje, onde quem ganha ou quem perde um debate é aquele ou aquela que dê a impressão de ter vencido. O gesto momentâneo, a frase bem sucedida ou o argumento bem ou mal formulado, por um brevíssimo instante, e mesmo o semblante de cada um é que formam, no conjunto, a impressão que fica aos olhos do telespectador.
Mas o modelo que sugiro parece impraticável. Primeiro que tudo porque esse certamente não seria o formato mais adequado à espetacularização da cena, ao estilo de rinha de galos, supostamente capaz de manter o telespectador interessado, enquanto nos sucessivos intervalos são divulgados os caríssimos e altamente rentáveis anúncios comerciais. Também provavelmente as diversas redes de TV e rádio não se dispusessem a se constituir em cadeia para a mesma transmissão, como já chegou a acontecer, por exemplo, em coberturas da Copa do Mundo. Seria alterar a rotina da concorrência – e, como meios de comunicação são empresas, visam ao lucro acima de tudo.
Lamentável. Pois enquanto não mudar o formato atual, estamos todos condenados a assistir debates enfadonhos e nada produtivos.
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