26 janeiro 2011

Meu artigo semanal no Blog de Jamildo (Jornal do Commercio Online)

A letra e a classe de cada um
Luciano Siqueira


Vou logo dizendo que me custa muito assimilar essa classificação social pelas letras de A a E. Coisa de pesquisa mercadológica, sem lastro teórico consistente. Pelo menos do ponto de vista marxista – e até hoje ninguém foi capaz de refutar a explicitação da natureza de classes da sociedade tal como a fez Marx, deslindando as contradições de classe como motor do desenvolvimento da sociedade.

Mas, para que possamos nos entender, incorporo esse artifício em voga, que identifica a letra (e a classe de cada um) cruzando nível de renda com escolaridade e algumas coisinhas mais – e não necessariamente pelo lugar ocupado no sistema produtivo. E o faço para ressaltar o quanto alvissareira é a notícia de que o número de integrantes da classe C deve chegar a 113 milhões de pessoas em 2014, correspondendo a 56% da população brasileira. Isto segundo previsão do ministro da Fazenda, Guido Mantega, esgrimindo documento com dados tidos como confiáveis, que indicam que a turma da letra C deve crescer quase 19%, considerando-se que em 2009 cerca de 95 milhões de brasileiros se encontravam nessa situação.

Tudo bem que você leia esses números com um pé atrás. Futurologia nem sempre dá certo – mesmo apoiada em dados objetivos. Mais ainda porque são tantas as variáveis que interferem nesse processo de mobilidade social que, ao final das contas, ninguém pode ter certeza de nada. Para que efetivamente parcelas de milhões de brasileiros continuem mudando para melhor suas condições de existência é necessário que o crescimento econômico se dê com sustentabilidade e seja capaz de promover uma efetiva melhoria na distribuição de renda.

É aí que a porca entorta o rabo. Distribuição de renda não se dá por um lance de mágica, implica transferência de renda, via partilha menos concentrada da produção e da riqueza, ampliação real do volume da massa salarial dos que sobrevivem à custa do próprio trabalho.

É possível realizar essa proeza sem ruptura com os condicionantes macroeconômicos que perduraram no governo Lula e ainda não há sinais de que serão removidos com Dilma? Com o câmbio sobrevalorizado e taxas básicas de juros elevadas não tem como se incrementar a produção na dimensão necessária. Então, cabe deduzir duas consequências da afirmação do ministro Mantega: saudar a expectativa otimista e lutar para que ela se concretize através dos ajustes necessários na condução da economia visando a destravar os investimentos produtivos, condição sine qua non da manutenção do crescimento.

A quem cabe essa empreitada? Cabe ao governo, claro, desde que a presidenta confirme suas convicções desenvolvimentistas e reúna força política para tanto. Cabe aos sindicatos e às organizações populares em geral fazer a pressão sobre o governo. E cabe o mesmo aos setores da economia que sobrevivem da produção isolando os que se banqueteiam com a usura e por isso preferem que as coisas fiquem como estão.

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