Adivinhação rima com ciência?
Luciano Siqueira
Desde priscas eras seres humanos de diferentes culturas perseguem o desejo de prever o futuro. Seria uma beleza. Quem sabe pudéssemos evitar catástrofes – ou melhor nos prepararmos para enfrenta-las -, saber antecipadamente o time campeão em torneio duramente disputado e mesmo a sorte no amor.
De vez em quando surge alguém que se diz dotado de premonição, que não é exatamente a capacidade de adivinhar, mas chega perto; serve para “ler” em fatos fortuitos o “sinal” de que algo pode acontecer. E se o dito cujo estiver envolto numa aura de misticismo ou excentricidade, aí é que a coisa pega.
Quando vivia clandestino, junto com Luci, no sertão das Alagoas, à época do regime militar, passou por nossa cidade, Santana do Ipanema, frei Damião. Tido como santo, desde o meio da madrugada a comandar procissões, tinha também a fama de “ler” o pensamento dos fiéis e antecipar o futuro. Pior: quem fosse ao confessionário e ocultasse algum pecado (não apenas atos, mas também maus pensamentos) pagaria caríssimo: repreensão em regra, em voz alta para que todos ouvissem, e a penitência de incontáveis Pai Nossos e Ave Marias.
Complicada essa coisa de adivinhar e prever. E polêmica. Um ex-professor de Harvard, hoje professor emérito de psicologia social da Universidade Cornell, em Nova York, Daryl J. Bem, divulgou artigo no prestigiado "Journal of Personality and Social Psychology" dando conta de um estudo feito com 1.100 voluntários que tentaram adivinhar o futuro. Percepção extrassensorial (PES) é o atributo desses voluntários, isto é, a capacidade de pressentir o que está para acontecer.
Causou a maior balbúrdia. Cientistas de diversos naipes protestaram veementemente contra o que lhes parece ser a vulgarização da ciência – eufemismo para charlatanice. Ou as duas coisas, pois os tais voluntários fizeram mesmo foi dar palpites sobre se uma fotografia vai aparecer do lado esquerdo ou direito da tela do computador ou descobrir onde está a imagem erótica (sic). Quem acertou mais vezes ganhou o status de dotado de premonição.
Sei não, o problema foge em muito à minha compreensão, mas que valeria a pena selecionar uma turma dessas e submete-la a uma agenda de previsões de acontecimentos importantes para a vida de todos nós. Numa lista se anotaria as coisas boas que estão para acontecer, noutra as coisas ruins. E se constituiria um fórum internacional destinado a indicar as providências necessárias que para vingassem só as boas, evitando-se ou amainando-se ao máximo possível as consequências das coisas ruins.
Mudaria algo? Muito pouco, talvez. O acirramento das contradições sociais, por exemplo, poderiam ser previstas – mas aí uns tratariam de aproveitá-las em favor da ruptura com status quo, enquanto outros cuidariam de preservar seus privilégios e interesses. Donde o polêmico pesquisador ianque poderia concluir: há premonição, sim; porém nada impede que a roda da História se mova.
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