“A la manana tien”
Luciano Siqueira
Férias de quem dispõe de poucos dias e dinheiro curto no bolso. Porém bons dias, especialmente quando vividos em alguns lugares desse belo e sempre surpreendente litoral nordestino. Em algumas décadas Luci e eu (e as meninas quando ainda meninas) acumulamos uma larga vivência em praias e pousadas - do extremo sul de Alagoas, às margens do Rio São Francisco ao norte do Rio Grande do Norte. Sempre é prazeroso voltar, para rever o que a gente não esquece e conhecer lugarejos ainda não visitados.
Beleza de lugares e de pessoas. A gente cruza com gente de todo tipo, viajantes ou nativos. E se tivésse paciência para anotar, bem que daria para escrever alguns volumes de causos, alguns trágicos, outros (quase todos) cômicos.
Tem um troço que chateia e ao mesmo tempo diverte. É a mania de barraqueiros e balconistas de lojinhas macaquearem o sotaque de gente de outras regiões, do centro-sul do país, sobretudo. Beira ao ridículo e termina soando como um modo de falar estranho, que é de todos os lugares e de nenhum lugar especificamente, feito personagens das novelas da Globo. Ora é o “s” estalado na ponta da língua combinado com o “r” gutural, desencontrados entre si. Ora é o uso de expressões que nada têm a ver com a rapadura nem a cachaça e muito menos com a tapioca na palha da bananeira. “Uai” é coisa de mineiro, não soa bem na voz de um paraibano. “Trilegal” é uma expressão típica do gaúcho, dito por um alagoano de Barra de São Miguel tem jeito de uísque falsificado.
Pois bem. Estávamos num dos aglomerados de barracas de artesanato na orla de Maceió, de papo com um vendedor de bonés, um cara bem informado e espirituoso, grandalhão, musculoso e parcialmente desdentado, quando um turista italiano rosna qualquer coisa pedindo um boné ilustrado com coqueiros e jangadas. Não tinha na prateleira, mas o alagoano não se fez de rogado: “A la manana tiene, mister”.
Que diabo! Será que ele quis dizer que no dia seguinte (“a la manana”) teria o boné com os desenhos desejados e tratou o conterrâneo de Sofia Loren como americano (“mister”)?
No Alto da Sé e nas ruas enladeiradas de Olinda é comum ouvir de guias turísticos improvisados, diante de visitantes agalegados, a expressão “uno dólar”, como se todo mundo de pele branca e cabelos de milho seja necessariamente estrangeiro.
Turista aos olhos daqueles jovens arremedos de guia deve ser tudo babaca, desinformado, pois todos dizem que a casa rosada situada numa esquina da Praça de São Pedro pertenceu a Mauricio de Nassau – pura invencionice.
No dia que me for possível – quando? – vou fazer uma campanha pública para que todos os nordestinos falem o nordestinês e guias de araque deixem de enganar turistas desavisados. Sem perder o bom humor e a criatividade própria de nossa gente.
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