A controversa questão dos chimpanzés-cobaias
Luciano Siqueira
No começo dos anos sessenta fundei, com amigos, um Clube de Ciências que homenageava Oswaldo Cruz em sua denominação e pretendia despertar a vocação de possíveis futuros cientistas. Uma forma de contribuir para o desenvolvimento do Brasil como nação independente e soberana, dizíamos todos, inspirados no ideário anti-imperialista do movimento pelas reformas de base abortado pelo golpe militar de 1964.
Era uma coisa rudimentar, nosso Clube. Precário, para falar a verdade. Porém muito bem intencionado e atrevido. Chegamos a promover debates com expoentes do pensamento progressista cá da província, entre os quais Ricardo Ferreira, notável pesquisador de experiência e reconhecimento internacional, na fronteira do conhecimento em física e química fundamental.
Nossa prática é que era fraca. Não íamos muito além de experimentos simples baseados num livro muito interessante de Ricardo Ferreira e Ernesto Silva, que nos possibilitava realizar reações químicas em frascos usados de medicamentos. Na área da biologia e da botânica, patinamos feio. E, confesso, quando na condição de interessado em melhor conhecer o funcionamento dos seres vivos descobri que não havia como escapar ao uso de cobaias, senti-me constrangido. Nem fui adiante, além do sacrifício de alguns indigitados sapos capturados nas imediações de minha casa, que sediava o Clube.
Depois, convidado a integrar uma turma experimental reunida para a implantação de uma nova metodologia de ensino da química, no CECINE, órgão da Universidade Federal de Pernambuco, após seis meses de trabalho em laboratório, conclui que aquele ambiente silencioso e destinado a observar, medir e pesar meticulosamente não era bem a minha praia. E me direcionei para a medicina.
Mas o Clube pode se orgulhar de ter produzido um importante cientista – o professor e pesquisador Celso Pinto de Melo, destacado integrante do Centro de Ciências Exatas e da Natureza da Universidade Federal de Pernambuco.
Os outros associados ao Clube, cada um seguiu o seu caminho de apenas beneficiários do progresso científico.
Toda essa historinha eu conto a propósito de uma informação que li, dias atrás, sobre a ameaça de chimpanzés de Alamogordo (EUA) voltarem a ser usados como cobaia. A notícia corre o mundo porque desde 2001 os feios porém simpáticos animais haviam sido aposentados e agora a ameaça de retorno ao sacrifício desperta protestos de sociedades protetoras dos nossos irmãos irracionais, embora os cientistas afirmem que os primatas são essenciais para criação de vacinas.
O rolo é grande e envolve o NIH (Instituto Nacional da Saúde dos EUA) que quer a volta dos chimpanzés aos laboratórios, perturbando a tranquilidade de uma grande comunidade primata constituída a partir dos aposentados. Seriam indispensáveis à pesquisa relativa à vacina contra a hepatite C, motivo principal de transplante de fígado nos EUA.
Bem, faço o registro e escapo de tomar partido na polêmica. Afinal, não virei cientista nem pertenço ao NIH, já não existe o Clube Oswaldo Cruz de Ciências Naturais e, ao que sabe, no Brasil não se usa esse tipo de cobaia.
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