23 maio 2011

Uma crônica minha no Blog da Revista Algomais

Tenho certeza que não era eu
Luciano Siqueira


Seguíamos, Luci e eu, rumo ao Café São Braz, no Shopping Tacaruna, quando ela se emparelhou com a gente, a passos tão rápidos quanto os nossos – talvez um pouco mais rápidos, sendo ela grandalhona, pernas longas e, é bom anotar, bem mais jovem do que a gente. Era intervalo do almoço e todos, creio que ela também, teríamos que voltar ao trabalho alguns minutos após.

- Olá, Como vai você?

- Olá, tudo bem? – respondi assim sem muita convicção, tentando me lembrar da figura.

- Minha mãe vai gostar quando eu disser que encontrei você.

- Pois mando um abraço para ela...

- Movimento grande aqui, né?

- É, muita gente por aqui nessa época do ano.

- E as meninas?

- Estão ótimas – respondi ainda sem conseguir identificá-la. Se conhece as meninas – pensei – deve ser de nossa intimidade...

- Olhe, agora estamos na mesma, eu e você.

- Pois é...

- Finalmente fui eleita síndica do “C”. Podemos conversar: você síndico do seu bloco e eu síndica do meu.

- Conversaremos, sim (a essa altura Luci já percebera o meu embaraço, apertava forte a minha mão dando sinal de que devíamos chispar dali para evitar o constrangimento: conversava com alguém que eu não sabia quem era e vice-versa, que me tratava com síndico que nunca fui por falta de motivação e votos...).

- Tô indo, que o tempo é pouco... Ligue pra mim, Oswaldo.

- Ligo, sim – respondi bem baixinho para não trair o meu incômodo.

Então era isso, a jovem grandalhona e bonita – já tinha dado tempo para perceber a beleza da dita cuja – me confundira com um tal Oswaldo que deve ser meu sósia. Ou eu dele.

Fui salvo pelo gongo, como se dizia antigamente. E por algumas semanas evitei passar pelo mesmo local com receio de encontra-la novamente e passar o vexame de esclarecer que não sou síndico, não conheço a mãe dela, as meninas de que falo são minhas filhas, que fui batizado Luciano e jamais mudei para Oswaldo. Nem quando usei nomes de guerra na militância clandestina na resistência à ditadura militar.

Claro, não posso esquecer: desejo para a bela síndica uma gestão profícua.

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