Luciano Siqueira
Publicado no Blog da Folha
Outro dia, após ler um artigo meu com título assim curioso, aparentemente desconectado, uma amiga sapecou: “Li porque me pareceu estranho e me surpreendi porque alhos tinha tudo a ver com bugalhos...”.
Mas é isso mesmo. A dialética nos demonstra que tudo se relaciona, nós é que às vezes não percebemos – ou não queremos perceber.Veja as declarações do meio-campista Ramires, do Chelsea, ao comentar a vitória sobre o Barcelona: “O Chelsea não quis agradar”; “o Barcelona era favorito. A gente transformou a desconfiança em motivação.” Tudo a ver com o ambiente das disputas eleitorais, onde a arrogância, a presunção de que a vitória é certa e a subestimação do adversário frequentemente contribuem para derrotas surpreendentes.
Subestimar o adversário, numa peleja eleitoral, confunde-se com certo desprezo pelo eleitor. Porque o que ocorre, na prática, em toda eleição, sobretudo no caso de eleições para cargos executivos, quando há polarização, é que qualquer que seja a correlação de forças inicial há sempre a possibilidade de deslocamento da parcela majoritária do eleitorado, aquela situada no meio entre os dois extremos contendores.Então, tal como fez o Chelsea, uma boa dose de humildade diante do eleitor e de competência para transformar a adversidade inicial em desafio e fator de motivação, cabe a todos os que buscam a vitória com consciência da realidade e determinação. Sem querer “agradar”, como disse Ramires – ou seja, sem muita firula nem pirotecnia, com os pés no chão e o discurso objetivo e certeiro, que corresponda aos anseios e inquietação dos eleitores e que emocione.
O pleito de outubro vindouro certamente será palco de vitórias surpreendentes. Em São Paulo, por exemplo, fala-se que Serra é favorito e se espera uma polarização entre ele e Haddad, do PT. Será? Devagar com andor que a maioria do eleitorado paulistano, embora de inclinação meio que conservadora, tem a insatisfação à flor da pele e pode optar por uma alternativa de extração popular. E assim pode ocorrer em muitas outras cidades, na medida em que o eleitorado urbano é cada vez arredio ao controle do que aqui no Recife sempre se chamou de “coronéis do asfalto”, para caracterizar os detentores de nichos eleitorais mantidos sob controle por meio do assistencialismo. O ambiente urbano brasileiro dos nossos dias vive certa efervescência, lócus de transformações econômicas e sociais e de acúmulo de demandas sociais e infra estruturais não satisfeitas. Quem não souber se mover nesse ambiente pode dar com os burros n’água.
Moral da história: vale aprender com Ramires e, com serenidade, conhecimento de causa e sensibilidade para com o que sente e pensa o cidadão comum, apresentar sob a forma de programa de governo o projeto político-administrativo que se pretende necessário para a cidade.
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