Luciano Siqueira
Publicado no Blog de Jamildo (Jornal do Commercio Online)
Que os mais céticos permitam a analogia: a política é como o amor. Sob muitos aspectos. A começar pela mescla de paixão e tolerância, ingredientes aparentemente contraditórios, porém complementares e indispensáveis.
A paixão por uma causa, ou mesmo por um objetivo de curto ou médio prazo, ou ainda por interesses, digamos, questionáveis. É preciso estar apaixonado para dedicar-se à arte e ao ofício da política com desprendimento e até com sacrifício parcial da vida pessoal. Isso vale para todas as correntes políticas, para todas as causas – justas ou não – e para todos os indivíduos. Mas o que se pretende nem sempre é possível, ou fácil de alcançar. Depende de outros atores envolvidos na cena, remete a uma hábil e equilibrada abordagem de interesses contraditórios e de discrepâncias conceituais.
Ninguém faz política sozinho, nem alcança grandes êxitos sem a conjugação de forças numa mesma direção. Daí a necessidade da tolerância, irmã gêmea da paciência e da persistência na busca de determinado objetivo, que implica em respeitar diferenças e tratar a todos como iguais a despeito da força relativa de cada um.
Em certas circunstâncias, é preciso “ficar rouco de tanto ouvir”, aconselhava Tancredo Neves, mestre da articulação política. Ouça e não ache nada estranho – modestamente, com alguma estrada percorrida cá na província, acrescentamos nós. No ponto de partida, via de regra, predominam as diferenças e a explicitação de desejos contraditórios, porém legítimos. O ponto de chegada requer convergência de propósitos em torno de uma plataforma comum que conduza ao somatório das energias, e não à dispersão.
Parece papo furado. Mas não é. É assim que as coisas acontecem, vistas sob o ângulo de quem pretende, sinceramente, unir forças em torno de objetivos nobres. Como agora, nas eleiçõs municipais, na construção de uma base partidária, parlamentar e social suficientemente ampla e consistente para que o futuro governo possa cumprir a contento a missão que o povo lhe terá confiado. Impossível ir adiante sem forjar uma verdadeira vontade coletiva (suprapartidária e socialmente ampla) na direção de uma cidade mais humana – a causa mais justa da atualidade, pela qual devemos estar apaixonados; e a mais difícil, em favor da qual precisamos juntar forças, sem preconceitos nem supervalorização de interesses grupistas subalternos.
A analogia vale também para entender os acontecimentos nos quais estamos diretamente envoltos, em nossa urbe. No horizonte, a possibilidade real de uma mudança de rumo sem, entretanto dispensar importantes conquistas acumuladas particularmente nos últimos doze anos. Num cenário cujo desenho algo surpreendente só se fez real em razão de divisões e subdivisões que descrendenciaram o parceiro que deveria agir como fator de unidade de todos. Infelizmente, ao invés do diálogo esclarecedor e convergente, a desconfiança e a troca de farpas em público, a dispersão – pondo em risco a continuidade dos avanços. Seguindo a analogia, a raiva estéril se superpondo à paixão e ao bom senso; a tolerância e a paciência esgarçadas pelo imediatismo grupista.
Assim, não há amor que se sustente, nem postura política que agregue e motive. Daí a busca de um novo caminho.
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