Luciano Siqueira
Publicado no Blog de Jamildo
(Jornal do Commercio Online)
Com a devida vênia dos especialistas em pesquisas eleitorais
– que têm o meu respeito -, arrisco dizer que transferir voto no Brasil é coisa
para poucos. Ou para ninguém.
Claro que, em certas circunstâncias, o quadro eleitoral é de tal ordem definido que poucas são as variáveis que mudam o curso dos acontecimentos; e aí fica mais fácil votar em Fulano porque é apoiado por Sicrano. Mas é raro. Mesmo em pleitos recentes, aqui e Brasil afora, em que a crônica política assevera perante a História que o apoiador foi decisivo para a eleição do apoiado.
Suponho que assim ocorre, quer dizer, é muito difícil transferir
votos justamente porque o sistema eleitoral brasileiro impõe o voto unipessoal,
no candidato. O eleitor não vota em partidos e programas, como ocorre em países
onde essa contingência decorre naturalmente da eleição para o parlamento
baseada em listas preordenadas pelos partidos. Aí, sim: embora conte o
prestígio pessoal dos integrantes da lista, o que se sobressai são as propostas
apresentadas por cada partido, alvo da escolha do eleitor.
Já citei aqui antes. Nas últimas eleições parlamentares em
Portugal eu me encontrava em Lisboa, cumprindo compromisso do PCdoB. Na TV,
onde o tempo destinado aos partidos é equânime, seja no noticiário convencional,
seja nos programas de debate, líderes das legendas litigantes expunham sua
análise acerca da crise européia, seus efeitos sobre a economia portuguesa e
soluções. Tudo muito claro.
Ora, nesses casos, a presença de um José Saramago, por
exemplo, na lista do Partido Comunista Português, representou, num dos pleitos,
um importante aval ao programa defendido pelos comunistas, importante por se
tratar de personalidade admirada e respeitada por toda a sociedade lusitana.
Não se enquadra no que aqui conhecemos como transferência de voto, é evidente,
mas é um caso emblemático de uma espécie de fusão entre prestígio pessoal e
proposta programática.
Voltando ao caso brasileiro, o assunto vem à tona porque, na
medida em que se inicia a fase pré-eleitoral propriamente dita – apesar de
estarmos a 8 meses das convenções partidárias, que acontecerão em junho -,
novamente se dá destaque aos “grandes eleitores”, assim chamados por terem o
dom de materializar seu prestigio pessoal e político em votações expressivas
para candidatos que apóiem.
Marina Silva, bem posicionada atualmente nas pesquisas, transferirá
o apoio de seu suposto eleitorado para Eduardo Campos? O apoio de José Serra
viabilizará Aécio Neves em São Paulo? Ou, descendo à província, é certo que
quem Eduardo apoiar para governador já pode providenciar o terno da posse?
Melhor ter cautela. A um ano das eleições, muitos fatores
que influenciarão o curso da disputa nacional e estadual ainda estão por entrar
em cena. Desde o desempenho da economia – elemento importante para Dilma, por
exemplo – aos arranjos locais envolvendo os diversos partidos e suas chapas de
candidatos proporcionais e à amplitude política e social das coligações. Assim,
será mais útil ater-se ao cenário em formação como um todo e especular sobre o
suposto peso dos “grandes eleitores” lá adiante. Até porque os quarenta milhões
de brasileiros que se viram inseridos socialmente na última década serão tão
importantes eleitoralmente, quanto ainda pouco avaliados nas análises das
pesquisas.
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