Por Frei Betto, no Jornal
GGN
Nos 54 países que reduziram a maioridade penal não
se registrou redução da violência. A Espanha e a Alemanha voltaram atrás na
decisão de criminalizar menores de 18 anos. Hoje, 70% dos países estabelecem 18
anos como idade penal mínima.
O índice de reincidência em nossas prisões é de
70%. Não existe, no Brasil, política penitenciária, nem intenção do Estado de
recuperar os detentos. Uma reforma prisional seria tão necessária e urgente
quanto a reforma política. As delegacias funcionam como escola de ensino fundamental
para o crime; os cadeiões, como ensino médio; as penitenciárias, como
universidades.
O ingresso precoce de adolescentes em nosso sistema
carcerário só faria aumentar o número de bandidos, pois tornaria muitos deles
distantes de qualquer medida socioeducativa. Ficariam trancafiados como
mortos-vivos, sujeitos à violência, inclusive sexual, das facções que reinam em
nossas prisões.
Já no sistema socioeducativo, o índice de
reincidência é de 20%, o que indica que 80% dos menores infratores são recuperados.
Nosso sistema prisional já não comporta mais
presos. No Brasil, eles são, hoje, 500 mil, a quarta maior população carcerária
do mundo. Perdemos apenas para os EUA (2,2 milhões), China (1,6 milhão) e
Rússia (740 mil).
Reduzir a maioridade penal é tratar o efeito, e não
a causa. Ninguém nasce delinquente ou criminoso. Um jovem ingressa no crime
devido à falta de escolaridade, de afeto familiar, e por pressão consumista que
o convence de que só terá seu valor reconhecido socialmente se portar determinados
produtos de grife.
Enfim, o menor infrator é resultado do descaso do
Estado, que não garante a tantas crianças creches e educação de qualidade;
áreas de esporte, arte e lazer; e a seus pais trabalho decente ou uma renda
mínima para que possam subsistir com dignidade em caso de desemprego.
Segundo o PNAD, o adolescente que opta pelo ensino
médio, aliado ao curso técnico, ganha em média 12,5% a mais do que aquele que
fez o ensino médio comum. No entanto, ainda são raros cursos técnicos no
Brasil.
Hoje, os adolescentes entre 14 e 17 anos são
responsáveis por consumir 6% das bebidas vendidas em todo o território
nacional. A quem caberia fiscalizar? Por que se permite que atletas e artistas
de renome façam propaganda de cerveja na TV e na internet? A de cigarro está
proibida, como se o tabaco fosse mais nocivo à saúde que o álcool. Alguém já
viu um motorista matar um pedestre por dirigir sob o efeito do fumo?
Pesquisas indicam que o primeiro gole de bebidas
alcoólicas ocorre entre os 11 e os 13 anos. E que, nos últimos anos, o número
de mortes de jovens cresceu 15 vezes mais do que o observado em outras faixas
etárias. De 15 a 19 anos, a mortalidade aumentou 21,4%.
Portanto, não basta reduzir a maioridade penal e
instalar UPPs em áreas consideradas violentas. O traficante não espera que seu
filho seja bandido, e sim doutor. Por que, junto com a polícia pacificadora,
não ingressam, nas áreas dominadas por bandidos, escolas, oficinas de música,
teatro, literatura e praças de esportes?
Punidos deveriam ser aqueles que utilizam menores
na prática de crimes. E eles costumam ser hóspedes do Estado que, cego, permite
que dentro das cadeias as facções criminosas monitorem, por celulares, todo
tipo de violência contra os cidadãos.
Que tal criminalizar o poder público por conivência
com o crime organizado? Bem dizia o filósofo Carlito Maia: “O problema do menor
é o maior.”
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