07 julho 2015

Miopia de classe

A parte de cada um e a defesa da Nação 

Luciano Siqueira, no Blog da Folha

Quem ao longo da vida examina os fenômenos sociais pela ótica do conflito de interesses de classes não pode se espantar com o "egoísmo" reinante na cena política. Mas vale mencionar o problema.
A crise é global, atinge agora duramente os grandes países emergentes - inclusive a poderosa e ascendente China - e põe em causa o desenvolvimento do Brasil. Exige, aqui, um esforço comum hercúleo para que possamos ultrapassar o recessivo ajuste fiscal e, enfim, retomar a senda do crescimento socialmente inclusivo. 
Esforço comum não quer dizer supressão mágica do conflito social. Mas há que admitir o limite do razoável na defesa de interesses específicos.
Ora, se aos trabalhadores cumpre pugnar pela manutenção de direitos sob nuvens ameaçadoras, pondo entretanto em primeiro lugar a defesa da nação, aos empresários cabe igualmente uma irrecusável parcela de responsabilidade.
As medidas anticrise adotadas pelo governo desde Lula, referendadas no primeiro mandato de Dilma, incluíram a desoneração fiscal parcial da folha de pagamentos de empresas de cinquenta e seis segmentos da economia. 
A redução do IPI contemplou o setor automotivo e toda a indústria de bens de consumo duráveis da chamada linha branca.
Em contrapartida, além da manutenção dos postos de trabalho (para assegurar o nível do emprego), a esses segmentos caberia a expansão da produção, inclusive via novos investimentos. O que não ocorreu devidamente.
As políticas de valorização do salário, estímulo ao crédito e ao consumo dariam, como deram até recentemente, o respaldo de um mercado interno gigantesco.
Esse "modelo" se exauriu em face do agravamento da crise global e das suas repercussões sobre a nossa economia (incluindo a queda substancial de encomendas externas de commodities minerais e agrícolas), a que se associam a crise interna hídrica e energética, pressionando diretamente a inflação.
Um novo "modelo" haverá de pautar o reerguimento da economia, tendo a carteira de pesados investimentos em infraestrutura mediante parcerias público-privadas, anunciada pela presidenta Dilma, como carro chefe. De modo consonante, a reativação de nossa capacidade industrial com o necessário aporte tecnológico para desatarmos o nó da baixa competitvidade e de um melhor posicionamento no mercado exterior.
Nesse contexto, capitaneados pela Federação das Indústrias de São Paulo, empresários do segmento industrial miram o ajuste fiscal, precisamente o fim da desoneração da folha salarial. 
Por que não exibem igual combatividade contra a alta dos juros básicos? Certamente porque também lucram (grandes empresários, sem dúvida) na ciranda financeira.
Empresários do chamado segmento produtivo deviam mirar o setor rentista, principal adversário do desenvolvimento brasileiro, e não os esforços regeneradores da economia encetados pelo governo. Porém a ânsia do lucro máximo - é preciso ganhar sempre, mandando às favas o interesse nacional - os mantém míopes.
Fica o registro. E a constatação de que esse tipo de obstáculo há de ser enfrentado politicamente, como parte do jogo de forças que marca, na atualidade, a cena brasileira.
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