A disputa internacional em torno do Brasil
Emir
Sader, na Carta Maior
O
Brasil havia desaparecido da agenda mundial desde o fim da ditadura.
Episodicamente reaparecia, como na campanha para a derrubada do Collor, na
eleição – e a euforia correspondente – de FHC como presidente, mas logo o
Brasil voltou para a penumbra. Ressurgia quando havia privatizações, com os
capitais abutres correndo para comprar na liquidação a bom preço do
patrimônio publico ou fugindo nas crises.
A
eleição do ex-presidente Lula desconcertou os meios que formam a opinião
pública mundial. Depois de superado o período histórico “populista, estatista”,
não se entendia bem como um ex-lider sindical, operário de um partido de
esquerda, fosse eleito presidente do Brasil em pleno século XXI. No começo, o
noticiário internacional era uma mistura de anúncios de “traição” do novo
presidente e de supostas manifestações populares contra ele, com denuncias de
corrupção. Mas tratavam o governo Lula como um fenômeno passageiro, ponto fora
da curva, caso folclórico, quase um mal entendido, que logo seria superado pela
realidade implacável da globalização.
De
repente, a imagem de Lula e a do Brasil mudaram. Era o país que, em meio ao
aumento da desigualdade e da pobreza no mundo, combatia a miséria e seu líder
se tornava o líder da luta contra a fome e a exclusão social pelo mundo afora.
Os lobbies midiáticos internacionais tiveram que se render, a contragosto, a
esse novo fenômeno. Wall Street Journal, Financial Times, The Economist, El
Pais ou calavam ou não mencionavam a liderança do Lula em escala mundial. Pelo
menos tiveram que reproduzir o Obama chamando-o de “the guy”.
Era um
gol que a luta pelos direitos de todos, contra o neoliberalismo, fazia, em
escala global. Lula era um intruso de sucesso nas reuniões internacionais, era
convidado para dezenas de países, especialmente da África e de outras regiões
que viviam problemas que o Brasil estava em vias de superar. Até que chegaram
as manifestações de junho de 2013 e começou um processo orquestrado de
desconstrução da incômoda imagem do Brasil por esses meios formadores da agenda
internacional da mídia. A eles se juntaram as vozes da ultra esquerda em órgãos
da mídia, igualmente incômodos com o sucesso do Lula e do Brasil.
A
imagem do Brasil foi rapidamente revertida, para o pais dos gastos milionários
para a Copa, cujo governo era repudiado por milhões de jovens por todo o pais.
A Copa não seria realizada ou, se fosse, o seria em meio a uma brutal repressão
de imensas manifestações populares de repúdio. Nada disso ocorreu, mas a
desconstrução da imagem do Brasil do Lula teve continuidade na imagem de um
país corrupto. Depois de breves lapsos de esperança de derrota do governo nas
eleições – que seria coerente com a imagem de um governo repudiado transmitida
internacionalmente – veio a onda do pais corrupto, a partir das denuncias sobre
a Petrobras.
É como
se todos os imensos avanços sociais tivessem sido abolidos, como se o Brasil do
Lula tivesse disso uma ilusão passageira, que a brisa primeira levou. Como se
se tratasse apenas de um pais violento, corrupto, com um governo repudiado pelo
povo. Qualquer noticia de suposta corrupção que envolveria o governo é
imediatamente reproduzida como se fosse uma realidade pelas agencias
internacionais.
Paralelamente,
se tentou levantar lideranças alternativas na America Latina, sem sucesso. O
caso do México não resistiu aos primeiros problemas do governo de Peña Nieto. Outro
lidere de direita, como Piñera, Uribe, foram derrotados pelo povo dos seus
próprios países, enquanto o PT triunfava pela quarta vez sucessiva.
Dificilmente vão conseguir fazer da Argentina de Macri uma alternativa ao
Brasil.
A
disputa em torno do significado do Brasil hoje no mundo é a disputa na luta
entre vias de superação do neoliberalismo e das desigualdades, de que o Brasil
é uma referencia central, ou a rendição aos velhos esquemas do Consenso de
Washington, que fracassam aqui e fracassam também na Europa e nos EUA – de onde
esses órgãos da mídia provêm.
Leia mais sobre temas
da atualidade: http://migre.me/kMGFD
Nenhum comentário:
Postar um comentário