Devagar com o andor, os embates serão difíceis
Renato Rabelo*, no portal Vermelho
A investida
da oposição foi contida. Começou o ano novo com certo equilíbrio de forças, com
um viés desfavorável às forças de direita, sobretudo aquelas comprometidas com
o golpe reiterado através de um pedido de impeachment de jogo político, sem
base jurídica, não podendo ser acolhido nos marcos da Constituição.
Mas, acabamos de entrar em 2016, no
qual Fernando Henrique Cardoso -- o principal ideólogo da oposição -- afirma
com pose de pavão que, Dilma vai “cair” de qualquer jeito e a cúpula dirigente
do PSDB, com Aécio Neves à frente, continua na mesma cantilena golpista. E
nesse desiderato, na prática, eles nunca deixaram de se aliar com Eduardo
Cunha, ainda presidente da Câmara dos Deputados. Agora mesmo eles se juntam
para impetrar os embargos de declaração a fim de tentar mudar (ninguém suporta
mais!) o rito do processo de impeachment estabelecido pelo STF, que cumprindo
sua elevada função, pôs ordem na casa.
A questão nodal – o caminho e a
perspectiva - Os enormes
problemas vividos pelo país em 2015, potencializados pela ofensiva das forças
conservadoras, tinha como vetor político a insistência plantada por uma mídia
hegemônica de oposição, e setores políticos da direita, de que a queda da
presidenta Dilma atenderia ao interesse da nação. Esta assertiva revanchista e
golpista vai perdendo força. Outra situação vai ganhando expressão e amplitude,
com a elevação da consciência democrática, da defesa da legalidade e da
Constituição e a defesa do mandato da presidenta. E, também, com o crescente
anseio nacional e popular pela estabilização da economia e abertura do caminho
para sua rápida reativação e crescimento.
Neste início de 2016 começam a surgir
frestas de luz no horizonte, com a tendência ao isolamento das alas mais
recalcitrantes, golpistas, apesar de ainda persistir a estratégia oposicionista
-- e de grande parte das classes dominantes -- de tentar encurralar a
presidenta da República, desmoralizar o PT, o ex-presidente Lula e toda a
esquerda, e de impor os ditames da oligarquia financeira, com o poder de ação
global. Há ainda, entre eles, os setores que não desistem do “quanto pior,
melhor”, para seguir cavando de qualquer forma a queda da presidenta.
A questão nodal, agora, é assegurar o
caminho e firmar a perspectiva do projeto de desenvolvimento nacional, com base
nos fundamentos da soberania nacional -- na inserção internacional soberana --
e na autonomia da condução da política econômica, no aprofundamento da
democracia, no avanço da inclusão social e na redução da desigualdade, na
integração mutuamente vantajosa com os vizinhos do Continente.
Mas, consideramos que, para alcançar
esses objetivos, as forças comprometidas com as transformações progressistas e
civilizatórias -- a fim de melhor se situar melhor -- têm que compreender qual
é o exigente contexto do período histórico atual, correspondente aos dois
últimos anos do primeiro mandato da presidenta Dilma Rousseff e o seu segundo
mandato, iniciado em 2015.
Contexto de condições objetivas muito
adversas - A realidade
mundial e brasileira interagem entre si, impondo grandes desafios e perspicácia
na construção e aplicação da alternativa a seguir, no plano internacional: 1)
Vivemos uma grave crise econômica sistêmica global, prolongada, e que ainda
pode se agravar mais, atingindo agora mais pesadamente os países em
desenvolvimento; 2) Verifica-se o crescimento da contraofensiva conservadora e
da direita na América Latina, começando a provocar reversão no avanço
democrático e nas conquistas de progresso social e soberania nacional nos
países desse Continente. No plano nacional: 1) Com início em março de 2014, a
Operação Lava Jato poderá contribuir para melhores práticas nas empresas e nos
governos, mas objetivamente vem incorrendo também em práticas que atentam
contra o Estado democrático de Direito, questionada por juristas de renome, e
tendo como resultante econômica a redução do PIB nacional em dois pontos
percentuais e da massa salarial em cerca de 42 bilhões de reais; 2) Uma mídia
hegemônica, de grande estrutura de comunicação, que se transformou em
verdadeiro partido de oposição, agindo como tal, em combinação com uma
estratégia comum com as legendas oposicionistas oficiais; 3) E não se pode
deixar de ressaltar o tempo de seca prolongada que atingiu fortemente até a região
sudeste do Brasil, pesando no aumento das tarifas de eletricidade e de
água.
Do nosso ponto de vista é com o domínio
desse conjunto sistêmico de condições objetivas muito adversas – que geram em
grande medida as condições da crise multilateral pela qual atravessa o país --
é que se pode avaliar a saída para os objetivos de mudança que se persegue. A
oposição se aproveita da situação adversa para instrumentalizar mais ainda os
fatores da crise, buscando justificar um atalho para a tomada do poder central
da República, proclamando que toda responsabilidade pelas dificuldades cabe à
presidenta da República. Exacerbou, assim, o clima anti-Dilma, tornando a luta
política mais aguda e violenta.
Transição do ciclo de desenvolvimento -
É concebível que em face de tal
realidade complexa e desafiadora, na busca de saída e alternativa, a presidenta
Dilma possa ter cometidos equívocos e erros. Mais ainda, avaliamos que
continuar o processo transformador político, econômico e social, requer diante
dessa nova situação, um novo ciclo de desenvolvimento. Entretanto, para
torna-lo viável, só é possível através de uma transição que nos conduza a essa
nova etapa de mudança mais avançada. Situação que expõe a dimensão das tarefas,
nas quais a presidenta demonstra estar inteiramente empenhada.
Partindo desse viés, avaliamos que não
existe resposta simples e mágica. As experiências do modelo político-econômico
alternativo ao neoliberalismo na região, como no Brasil, ainda são primárias. E
tais processos acontecem em regimes capitalistas, sujeitos aos ciclos próprios
desse sistema e da dominância financeira rentista global. O agravamento recente
da crise mundial com seus efeitos restritivos, pesaram sobre essas novas
experiências.
O divisor de águas na relação da
unidade do movimento popular e da esquerda -- e no diálogo e concertação com o
governo Dilma -- é que não se pode retroceder e voltar ao modelo antipopular e
antinacional do passado: agenda destrutiva do Estado mínimo; aprofundamento da
exclusão social; sistema político inteiramente tutelado pelo capital;
realinhamento geopolítico com as grandes potências capitalistas, saída da crise
resgatando o grande capital financeiro e grandes monopólios, em detrimento da
maioria da nação. A relação de confiança com a presidenta tem aí sua base, por
ela demonstrado em toda sua trajetória.
Agenda convergente para retomar o
crescimento - Portanto, a
alternativa a seguir neste momento requer confiança mutua, dialogo e debate
mais amplo com a presidenta e seu governo. Isso em função de que o campo
popular e de esquerda não tem modelo alternativo concluído, sobretudo no
terreno econômico, onde apresenta até mesmo posições diferenciadas. É certo que
não se pode alimentar duas disjuntivas: de um lado, devaneios de pactos com a
oposição golpista e neoliberal, reerguendo pontes para o passado; por outro
lado, ilusões de que a solução está no voluntarismo político, ou em medidas
mágicas para a retomada rápida do crescimento, nas condições atuais.
Avaliamos que não devemos ser contra o ajuste nas contas públicas. O busílis está em que o equilíbrio fiscal depende da recuperação das receitas através do estímulo à atividade econômica, não o contrário. Por isso que Joaquim Levy teve que sair. O mais emergencial agora, além de abortar as investidas golpistas, é concretizar uma agenda de consenso para interromper a queda da atividade econômica e recuperar o seu crescimento.
Avaliamos que não devemos ser contra o ajuste nas contas públicas. O busílis está em que o equilíbrio fiscal depende da recuperação das receitas através do estímulo à atividade econômica, não o contrário. Por isso que Joaquim Levy teve que sair. O mais emergencial agora, além de abortar as investidas golpistas, é concretizar uma agenda de consenso para interromper a queda da atividade econômica e recuperar o seu crescimento.
As pontes para a retomada do
crescimento que vão reunindo maiores convergências são: redução progressiva dos
juros, pois o aumento da taxa Selic já não tem mais “funcionalidade” para
conter a inflação; câmbio realinhado na faixa atual, que permite a
competitividade, sobretudo da indústria; destravar os investimentos públicos e
privados na infraestrutura logística e no sistema energético; tratar legalmente
os acordos de leniência para preservação imprescindível das grandes empresas de
engenharia nacional e recompor financeiramente a Petrobras; ativar setores
produtivos que compõem ampla cadeia de empresas fornecedoras e receptoras.
Por fim, a evolução da unidade da
Frente Brasil Popular e a prova da capacidade mobilizadora popular do dia 16 de
dezembro passado, contribuíram significativamente para as vitórias mais
recentes. E o seu crescimento é uma garantia para reforçar o papel da força
motriz eficaz para barrar o golpe, pelas reformas estruturais e as mudanças
progressistas.
*Renato
Rabelo é ex-presidente nacional do PCdoB
Leia mais sobre temas da atualidade: http://migre.me/kMGFD
Nenhum comentário:
Postar um comentário