A estratégia de Macri e a prisão de Milagro Sala
Pedro de Oliveira, no portal Vermelho
Não é por acaso nem por
acidente processual que a dirigente política Milagro Sala -- líder do movimento
argentino Tupac Amaru e deputada do Parlasul -- foi presa na província de Jujuy
no interior da Argentina.
O juiz responsável direto pela detenção a mando do
governador da provincia, disse que ainda terá alguns dias para se pronunciar
sobre o pedido da defesa de Milagro para que libertem a líder dos
cooperativados e dos trabalhadores daquela região,que estão acampados já há
praticamente um mês na principal praça da cidade.
Esta semana uma delegação de solidariedade a
Milagro esteve em Jujuy para entregar às autoridades locais uma carta dirigida
ao governador de Jujuy, Gerardo Morales, para expressar a condenação do que
consideram uma “violação clara dos direitos humanos na Argentina”. A carta vai
assinada por eurodeputados da Espanha, Reino Unido, Eslovênia, Suécia,
Alemanha, Bélgica, do bloco da Esquerda Unida Europeia composta de deputados da
Finlândia, Chipre, Grécia, Reino Unido, Irlanda, Portugal, de deputados do
bloco Socialista e Democrático, de Portugal e Reino Unido, entre outros.
Desde o início da semana passada grandes
manifestações foram realizadas na Praça de Maio, em Buenos Aires, e em várias
outras cidades importantes do país, com a participação ativa de vários
movimentos sociais, de partidos políticos argentinos e do movimento das Mães da
Praça de Maio contra a prisão de Milagro Sala e contra as demissões de
funcionários públicos e de trabalhadores em geral -- que se contam em dezenas
de milhares -- fruto da política implantada a partir da posse do novo
presidente Mauricio Macri.
A prisão se revelou claramente política e mostra o
nível da ofensiva que o governo neoliberal que assumiu a Casa Rosada em 10 de
dezembro do ano passado está determinado a desencadear. O alvo são as
organizações e movimentos sociais que se estruturaram principalmente a partir
da crise política de 2001. Estes movimentos sociais, alguns ligados a partidos
políticos, outros aliados a grandes sindicatos e outros ainda independentes de
qualquer instituição foram engrossados por grande número de desempregados que
de um dia para o outro perderam suas possibilidades de participar do mercado de
trabalho. Os jornalistas e os grandes meios de comunicação argentinos passaram
a denominar estes movimentos como dos “piqueteiros”.
O Kirchnerismo com seu discurso nacional e popular
foi abarcando estes movimentos alguns deles encabeçados por antigos militantes
de esquerda da luta contra a ditadura militar argentina. É assim que a política
atual colocada em prática por Macri e seus ministros foi a de assumir a tarefa
de desbaratar toda esta organização social de massa, enraizada nos setores
populares e nos movimentos dos excluídos.
Outro alvo permanente é a famosa Ley de Medios
aprovada durante os governos anteriores de Néstor e Cristina Kirchner,
expressão da luta pela democratização dos meios de comunicação no país, e que
agora sofre intervenção direta do governo em seus órgãos máximos de decisão
como a AFSCA, a Autoridade Federal de Serviços de Comunicação Audio-visual, que
teve seu presidente Martín Sabatella afastado sumariamente do cargo, enquanto
vários jornalistas progressistas têm sido igualmente demitidos de vários órgãos
de imprensa.
Na esfera jurídica e política a ofensiva
antidemocrática macrista instituiu por decreto presidencial a declaração de
Emergência Nacional de Segurança – provocando imediata reação de setores
democráticos e progressistas e a organização do que se chama Acordo sobre a
Segurança Democrática e um grupo de Convergência da sociedade civil argentina
que alerta o povo para os perigos desse decreto. O governo Macri tenta criar a
ideia de que o narcotráfico é a base do delito generalizado e da violência que
vive o país – mas que na prática o decreto dá mais poderes para as Forças
Armadas e para as forças de Segurança para o combate ao crime. Vários juristas
renomados e o próprio Adolfo Péres Esquivel, prêmio Nobel, se declararam contra
o sentido e a prática decorrente deste decreto que tem validade de um ano e
envolve manobras conjuntas do Exército e das forças de segurança do país.
No plano das relações internacionais o novo governo
está em pleno giro de prioridades, atacando diariamente o governo venezuelano,
articulando com Israel apoio logístico na área de segurança e utilizando a
morte de um agente de inteligência para tentar criminalizar personalidades do
governo anterior de Cristina Kirchner. Foi sintomático o périplo de Macri junto
aos grandes nomes das finanças internacionais em Davos e seu encontro com o
Primeiro Ministro de Israel. Logo em seguida negou-se a comparecer ao encontro
de cúpula da CELAC utilizando-se de uma desculpa esfarrapada, que se realizou
em Quito, no Equador.
Ou seja,como o Congresso argentino está em recesso,
Macri governa por decreto e tenta aplicar em todos os setores sua política
reacionária e neoliberal de desconstrução de tudo o que foi realizado no ultimo
ciclo político avançado dos governos anteriores especialmente no que se refere
ao plano social e econômico. Milagro Sala sofre na carne esta ofensiva mas
conta com amplo apoio nos setores mais organizados e avançados da sociedade
argentina e com a solidariedade ativa de organizações e personalidades
políticas do mundo inteiro. Com a experiência e capacidade de organização dos
movimentos sociais argentinos o povo do país irmão saberá dar respostas aos
intentos retrógrados de Macri e Cia.
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