Recessão emocional
Paulo
Nogueira Batista Jr
Publicado no jornal O Globo
Estou
passando algumas semanas no Brasil, leitor, e constato horrorizado: pior do que
a recessão econômica, só a recessão emocional. O país, que há poucos anos era
um sucesso internacional, parece ter perdido a autoconfiança
definitivamente. Esquece seus pontos fortes e proclama aos quatro ventos
seus pontos fracos. E, pior,demonstra satisfação masoquista em proclamá-los.
Em outras
palavras, o complexo de vira-lata voltou com força total. Era de se esperar. Um
complexo assim secular não se supera num passe de mágica, em poucos anos de
sucesso. Mesmo nos nossos anos de prestígio internacional, o vira-lata estava
ali, à espreita, pronto para voltar à cena. Afinal, como dizia Nelson
Rodrigues, subdesenvolvimento não se improvisa — é obra de séculos.
A recessão
emocional alimenta a econômica, e vice-versa. O colapso da confiança prejudica
inevitavelmente o investimento e o consumo. A retração da demanda agregada
doméstica derruba a produção e o emprego. E o aumento da capacidade ociosa e do
desemprego deprime ainda mais o investimento e o consumo, jogando a economia
numa espiral descendente.
Nesse ambiente, as
políticas monetária e fiscal não podem continuar sendo pró-cíclicas, como foram
em 2015. Não há dúvida de que o espaço monetário e fiscal é limitado. Mas é
possível moderar a política de juros e espaçar o ajuste fiscal ao longo do
tempo. É o que parece estar tentando a equipe econômica. Sob protestos da turma
da bufunfa, o Banco Central interrompeu o ciclo de alta de juros. O Ministério
da Fazenda anunciou medidas de ampliação do crédito, centradas na atuação dos
bancos federais, e mudanças na política fiscal que tendem a torná-la mais
sensível ao ciclo econômico. Foi apresentado ao mesmo tempo um programa de
ajustamento estrutural das contas públicas.
A direção
tem que ser essa mesmo. Ou alguém imagina que num quadro de queda
acentuada do gasto privado o papel da política econômica possa continuar sendo
o de aprofundar a recessão com juros ascendentes e uma política fiscal
pró-cíclica? Mais do que nunca, o setor público deve desempenhar um papel
compensatório.
A recessão
emocional nos impede de ver os pontos positivos do quadro macroeconômico?
Alguns são tão evidentes que nem o mais tenaz dos vira-latas é capaz de
negá-los. Por exemplo: a dimensão e velocidade do ajuste das contas externas,
consideradas surpreendentes por analistas da economia brasileira. A combinação
de queda da demanda interna com acentuada depreciação do real produziu grande
melhora da balança comercial e da conta corrente do balanço de pagamentos em
2015, que só não foi maior porque o quadro internacional foi adverso em termos
de demanda externa e de troca.
Somado
às elevadas reservas em moeda estrangeira, que o Brasil ainda não
precisou utilizar, o fortalecimento do balanço de pagamentos nos dá condições
de enfrentar as turbulências internacionais que devem ocorrer em 2016.
A desvalorização
do real funciona, além disso, como estimulo à recuperação da atividade e
do emprego. As exportações de bens e serviços já começaram a responder ao
câmbio mais favorável. Ao mesmo tempo, a produção nacional se mostra capaz de
substituir importações em vários setores. Ainda que o setor externo da economia
seja relativamente pequeno, como costuma se verificar em países continentais, o
impulso cambial ajudará a estabilizar os níveis de atividade e de emprego.
Portanto,
deixo aqui o meu apelo veemente: sossega, vira-lata!
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