Deutsche Bank: gigante de pés de barro, espelho do sistema financeiro
A aguda crise que atinge os
bancos da Europa ativou a luz de alerta no mundo, levantando questionamentos
sobre a capacidade dessas grandes instituições financeiras honrarem seus
compromissos. No olho do furacão, está o maior banco comercial alemão.
esquerda.net
A situação do Deutsche Bank, um dos maiores vendedores de títulos
lastreados em hipotecas de alto risco antes da crise financeira e um dos
primeiros bancos a apostar numa queda das mesmas fazendo seus próprios clientes
perderem milhões, está apavorando os mercados e torna até mesmo a maior
economia do Velho Mundo um poço de incertezas.
Nem a declaração do ministro alemão de finanças Wolfgang Scäuble, no
sentido de garantir que o banco é capaz de cumprir seus compromissos, foi capaz
de apaziguar a sangria que fez esvair 40% do valor de mercado das ações do
banco em pouco mais de um mês. A crise do Deutsche Bank adiciona combustível à
tormenta pela qual passam todos os bancos europeus ante o medo de que o mundo
entre em uma nova recessão com impactos para o setor bancário.
O primeiro banco alemão fez disparar o alarme amarelo, no final de
janeiro, ao anunciar uma perda monstruosa de 6,7 bilhões de euros relativos a
2015. Suas ações caíram drasticamente, depois recuperaram-se um pouco, mas o
fato é que, desde a crise de 2008, só desaba. Seus papéis, que à época estavam
cotados em 100 euros, na semana passada haviam caído para cerca de 17.
No ano passado, a instituição anunciou a maior reestruturação de sua
história, com o corte de 35 mil postos de trabalho nos dois anos subsequentes.
Também suspendeu os dividendos de 2105 e 2016 e divulgou que deixaria de operar
em 10 países.
Grande parte dos números vermelhos de 2015, cerca de 2,1 bilhões, foi
proveniente de ações judiciais motivadas por suas más práticas bancárias. No
ano passado, o grupo foi forçado a pagar às autoridades norte-americanas e
britânicas uma multa de US$ 2,5 bilhões por ter manipulado o libor, a taxa pela
qual se empresta o dinheiro no mercado interbancário.
Além disso, teve de manter um colchão de US$ 5,5 bilhões de dólares para
fazer frente a outras disputas legais acumuladas, que vão desde ter respaldado
operações com hipotecas subprime até por haver operado de forma opaca na
Rússia. A instituição está envolvida em 6 mil litígios.
De acordo com o diário El País, seu copresidente foi processado
por “lavagem de dinheiro e evasão fiscal, ao se esquivar do IVA nos
certificados de emissões de CO2. Apostou na baixa e a descoberto (desafiando
seu Governo) contra empresas espanholas. E espionou jornalistas e diretores”,
diz o jornal.
Mas nem todas as perdas podem ser explicadas pelo mal comportamento do
banco. Sem esses encargos, os prejuízos teriam superado os 600 milhões de euros
apenas no último trimestre. De acordo com El País, investidores detectaram que boa
parte do negócio da instituição é irrecuperável no curto prazo e que em muitas
ocasiões o banco maquiou sua contabilidade.
Insegurança - Desde que os
governos socorreram os bancos durante a crise financeira, os reguladores têm
forçado as instituições a operarem com menos dívida e fortalecerem o capital
próprio. A maneira mais fácil para capitalizar um banco é a venda de ações. Mas
essas fórmulas não são muito apreciadas pelos mercados. Ao se ampliar o
capital, o valor das ações existentes se dilui e se não se destina dinheiro ao
dividendo, investidores protestam.
Por esse motivo, os banco inventaram um novo instrumento sofisticado,
chamado de obrigações contingentes conversíveis (“ CoCos”, o apelido vem do
original em inglês, contingent convertible). Estes títulos são perpétuos, o que
significa que eles não têm uma data de vencimento estabelecida. O papel
“amadurece” quando o banco exerce uma opção, o que geralmente acontece após
cinco anos.
Os investidores recebem juros anuais entre 6% e 7%. Como contrapartida
existe o risco de que se as coisas correrem mal, o banco pode suspender o
pagamento dos juros ou converter o bônus em capital ou amortiza-lo
antecipadamente.
Apesar de todo o setor ter utilizado os ‘CoCos’ de forma generalizada,
os analistas passaram a ter sérias dúvidas sobre os bônus do Deutsche Bank,
questionando se o banco teria liquidez suficiente para pagar os juros do
próximo ano (350 milhões de euros). O temor sobre o risco de não cumprimento
pelo Deutsche Bank aumenta a cada dia e o efeito se espalhou para outros
bancos. Analistas apontam que seu colchão de liquidez é elevado (11%), mas veem
problemas mais na capacidade futura do banco de gerar lucros.
Para acalmar os mercados, o Deutsche Bank – que tem agora as cotações
mais baixas de sua história – anunciou uma operação de recompra de 4,8 bilhões
de euros de seus papéis. Era uma maneira de dizer que tem o suficiente para
continuar a pagar os compromissos apesar das perdas em 2015. Mas, no dia
seguinte, as ações voltaram a despencar.
No fundo, o Deutsche Bank, mais um gigante de pés de barro, é um espelho
do sistema financeiro de forma geral. E prova agora que nem a maior economia da
Europa está imune à tempestade que parece se aproximar.
Por Joana Rozowykwiat, do Portal Vermelho, com El Periodico
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