19 abril 2016

Apartheid social

Uma difícil convivência na raiz do golpe
Luciano Siqueira, no Blog da Folha e no portal Vermelho
Bruna Ferreira da Silva
Aeroporto dos Guararapes, ontem, 23h40. Pessoas muito humildes recepcionam seus familiares, que chegam em voos de diversas partes do país. 
Pessoas bem trajadas, alguns traços no modo de agir e de se vestir próprios de um poder aquisitivo mais elevado, também aguardam familiares.
A elite dominante e a parcela da chamada classe média alta - fração minoritária da população, mas assim mesmo extensa - não suporta compartilhar o saguão do aeroporto com pessoas muito humildes.
Também na suporta encontrar os mais humildes no salão de embarque. Nem ter no assento ao lado, na aeronave, alguém que mal sabe lidar com o cinto de segurança. 
Pior quando se trata da sua empregada doméstica, ou do pedreiro que consertou algo em sua residência ou do porteiro do edifício onde mora.
Na condição de elite e de agregados à elite, essa parcela da sociedade está se lixando para o fato de que o processo de impeachment da presidenta Dilma carece de fundamentação jurídica, vez que a presidenta não responde por nenhum crime, sequer é indiciada. 
Importa a todo custo afastar a presidenta do governo da nação.
Importa interromper a ascensão social de cerca de 40 milhões de pobres, bloquear o acesso de milhões a cursos superiores e a escolas técnicas e ao mercado de consumo de bens e serviços.
Importa redirecionar a inserção do Brasil na cena internacional, retomando o antigo status de aliado prioritário e incondicional dos EUA, invertendo a diversificação das relações comerciais e diplomáticas com os países do Bric e da América Latina e de nações ascendentes da África, Ásia e Oriente Médio.
Importa restabelecer a relação autoritária e intolerante com os movimentos sociais, assim como dar um paradeiro na participação popular na formatação e no controle de políticas públicas através do sistema de Conferências e Conselhos.
A cena de ontem no Aeroporto dos Guararapes põe lado a lado gente de dois Brasis: o Brasil dos ricos e o Brasil dos pobres, num mesmo espaço.
Ainda que pacificamente, reflete a diáspora entre os dois Brasis nas ruas do País em função da luta pelo impeachment e contra o impeachment.
Diferenciação social visível a olho nu e comprovada por inúmeras pesquisas realizadas durante as manifestações.
O Brasil há de ser melhor não apenas para as minorias privilegiadas, há de ser melhor, sobretudo, para a maioria que só recentemente passou a ter vez. 
Esta é uma das variáveis essenciais da crise política e econômica em curso - que aponta para o caráter prolongado do conflito atual, que não se resolverá com a votação do impeachment no Senado, qualquer que seja o resultado.
A senzala obteve imensas conquistas nos anos recentes - e não abrirá mão dessas conquistas agora nem no futuro mediato, por mais que esperneie a casa grande. 
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