André Singer
A votação de domingo passado uniu extenso e variado bloco
com o propósito de expulsar o lulismo do poder e, talvez até, do próprio jogo
político, se possível por bom tempo. Para chegar aos 367 deputados que
derrotaram o projeto de reformas graduais lulistas, foi necessário juntar da
extrema-direita ao centro, passando por toda a gama ideológica intermediária.
Resta saber se a fauna amalgamada contra Dilma Rousseff continuará sob o mesmo
teto em caso de o Senado repetir a decisão da Câmara.
Aos que acham a pergunta irrelevante em face do caráter
despolitizado de muitos sufrágios, convém não se deixar levar pelas aparências.
É verdade que a maioria dos parlamentares responde a interesses fisiológicos,
mas isso não significa ausência de posição. As frequentes menções a Deus,
pátria e família durante a decisiva sessão dominical expressam certa visão de
mundo, própria e da base que cerca o declarante.
A fala propositadamente radical do deputado Jair Bolsonaro
(PSC-RJ), ao enaltecer famoso torturador, dialoga com o conservadorismo difuso
em setores da sociedade. Com 8% das intenções de voto para presidente da
República na última pesquisa Datafolha (8/4), o ex-militar carioca encontra-se em quarto lugar na
preferência do eleitorado e nada menos que 20% dos entrevistados com renda
acima de 10 salários mínimos familiares mensais declararam adesão a ele.
Aliás, para que se tenha ideia, na mesma faixa, o senador
Aécio Neves (PSDB-MG) obteve singelos 13% e a ex-senadora Marina Silva, 12%. Em
outras palavras, cresceu a inclinação de setores médios pelo fascismo.
No sentido contrário, opções tradicionais de direita e
centro-direita parecem murchar. Considerado o eleitorado em geral, o senador
Ronaldo Caiado (DEM-GO) aparece na mesma pesquisa com irrelevantes 1%. Os
tucanos, por sua vez, declinaram nesta última e decisiva fase da trama a favor
do impedimento. O neto de Tancredo, hoje com 17%, perdeu 10 pontos percentuais
entre o levantamento de dezembro e o atual.
Pesa contra os pessedebistas o mesmo fantasma que assombra
os líderes do golpe constitucional, Eduardo Cunha e Michel Temer. Sobre uns e
outros pairam inúmeras denúncias surgidas no bojo da Operação Lava Jato. Temer,
o futuro presidente em caso de vitória golpista, conta com apenas 2% das
intenções de voto, tecnicamente empatado com Caiado no fim da fila.
A espécie eleitoralmente forte dentre as que subiram à arca
do impedimento é a da líder da Rede, Marina, neste momento sem mandato, et pour
cause. Partindo de 19% das intenções de voto, constitui opção de centro sem
envolvimento com maracutaias. Aceitará navegar em companhia de Bolsonaro,
Caiado, Neves, Cunha e Temer?
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