11 abril 2016

Conflito de classes

Base de massas e tropa de choque do golpismo
João Quartim de Moraes, no Blog do Renato

Grandes combates políticos como os que hoje opõem os golpistas aos defensores da causa do povo sempre refletem as contradições fundamentais da sociedade. A passagem da burguesia liberal e de largas massas da pequena burguesia ao campo da contra revolução fascista em momentos de crise grave com forte ameaça a suas posições de classe constitui regra geral da ordem capitalista.
Embora no Brasil nenhum de seus interesses básicos tenha sido ou esteja sendo ameaçado pelo governo federal, os patrões de choque da Fiesp e os ricaços do parasitismo financeiro juntaram-se ao cartel da intoxicação mediática na tentativa de desestabilizar o governo legítimo eleito em 2014. Os motivos que os impeliram a essa iniciativa politicamente criminosa podem se resumir num só: eles vislumbraram nas dificuldades econômicas do fim do primeiro e do começo do segundo mandato da presidente Dilma a ocasião para anular por meio de grosseira e hipócrita chicana parlamentar a eleição presidencial em que seu candidato foi derrotado.
É evidente que os empreiteiros do golpe só prosperaram porque conseguiram manipular com êxito frustrações, ressentimentos e ódios do reacionarismo latente nos setores mais obscurantistas e empedernidos da pequena burguesia (ou “classe média”, como dizem muitos). É hoje claro que o primeiro êxito importante dessa manipulação ocorreu no dia 20 de junho de 2013. No dia 10 daquele mês, cerca de cinco mil manifestantes vinculados ao Movimento Passe Livre de São Paulo foram bestialmente agredidos pela Policia Militar (PM) de SP, a mando do governador Alckmin. A indignação suscitada pelos relatos e imagens da estupidez policial, largamente ecoados nas redes sociais da internet, notadamente no facebook, levou muito mais gente às ruas, no dia 13, em solidariedade aos manifestantes agredidos e em defesa do direito imprescritível de se reunir para fazer valer suas reivindicações. Boa parte das reivindicações, centradas nos transportes, escola e saúde públicas, eram justificadas. Mas para espanto dos brasileiros mais jovens, que só conheciam o fascismo e o terrorismo reacionário pelos testemunhos do passado, os filhotes locais dos Arditi de Mussolini e das Sturmabteilung (SA) de Hitler irromperam bruscamente na manifestação da Avenida Paulista. Uma testemunha registrou a agressão neonazista:
“Fiquei horrorizada com o que vi na Paulista na quinta-feira passada (20 de junho). Os partidos escorraçados da manifestação, descendo pelas transversais da avenida e seus militantes baixando bandeiras. Tudo isso provocado por uma turba de alguns milhares de idiotas despolitizados que cantavam “sem partidôoo”, “sem bandeiráaa”, “eu, sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor” e outras coisas como “mensaleiros”, com uma linha de frente composta por 200 homens, só homens, de cabelo raspados e marombados que tentavam agredir fisicamente, o tempo todo, militantes de todo e qualquer partido ou movimento social. Vi uma bandeira da UNEAFRO sendo queimada e eles, eriçados, indo à euforia “sem partidoooo, sem bandeiraaaa”. Fiquei assustada mesmo com a agressividade e mais ainda, com a turba imbecil que acabava dando lastro a esses poucos nazistas e skinheads.”
Houve de fato imbecis que deram lastro aos nazistas e “skinheads”. Mas se agiram de modo imbecil, foi porque, já intoxicados pelas “notícias” diariamente marteladas pelo cartel mediático, eles foram manipulados por Skaf, o vulgar espertalhão que comanda a Fiesp. Candidato ao governo do Estado, com seu espaço político normal (a direita) já ocupado pelo reacionário explícito Alckmin, ele procurou se situar no centro e arrebanhar votos um pouco mais à esquerda, aproveitando a campanha anti PT já em pleno andamento. No dia 19 de junho, véspera do sequestro do movimento de rua pelas tropas de choque do golpismo, o prefeito Haddad atendeu à principal reivindicação dos manifestantes, renunciando à elevação da tarifa dos ônibus. Houve comemoração na avenida Paulista. Skaf mandou deixar iluminada com cores patrióticas a portentosa sede da Fiesp. Em êxtase, manifestantes coxinhas ajoelharam-se diante do templo do deus Capital. Era o prelúdio do que iria ocorrer no dia seguinte.
Nem todas as manobras dão certo, nem tudo que dá certo resulta de uma manobra. Skaf não conseguiu sequer levar a disputa para o segundo turno. Alckmin reelegeu-se governador no primeiro. Em compensação, ele logrou transformar a Fiesp em santuário dos coxinhas paulistas, estimulando o acoxinhamento de outras federações e da própria confederação dos patrões da indústria.
Sem dúvida, é justo cobrar da presidente Dilma sua parte de responsabilidade pela deterioração da economia. Mas incontestavelmente, os efeitos destrutivos da operação Lava Jato, operando como “poder paralelo” para atropelar com arrogante descaramento os direitos e garantias constitucionais, exercem efeito paralisante sobre os grandes conglomerados da engenharia nacional. Por isso os círculos dirigentes mais lúcidos do grande capital industrial e bancário marcam alguma distância em relação à aventura golpista em curso.
Na dialética da luta de massas, a grande manifestação de 18 de março passado contra o golpe e contra o Estado policial marcou o soerguimento, em São Paulo, da mobilização ampla das forças democráticas e populares. As ruas sequestradas em 20 de junho de 2013 pelas tropas de choque neonazistas (perante o olhar omisso da PM de Alckmin, sempre pronta a despejar sua fúria sobre os movimentos sociais) mostram que mesmo nesta região geopolítica do Brasil chamada Tucanistão é possível derrotar a reação e o fascismo em campo aberto.

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