João Quartim de Moraes, no Blog
do Renato
Grandes
combates políticos como os que hoje opõem os golpistas aos defensores da causa
do povo sempre refletem as contradições fundamentais da sociedade. A passagem
da burguesia liberal e de largas massas da pequena burguesia ao campo da contra
revolução fascista em momentos de crise grave com forte ameaça a suas posições
de classe constitui regra geral da ordem capitalista.
Embora no
Brasil nenhum de seus interesses básicos tenha sido ou esteja sendo ameaçado
pelo governo federal, os patrões de choque da Fiesp e os ricaços do parasitismo
financeiro juntaram-se ao cartel da intoxicação mediática na tentativa de
desestabilizar o governo legítimo eleito em 2014. Os motivos que os impeliram a
essa iniciativa politicamente criminosa podem se resumir num só: eles
vislumbraram nas dificuldades econômicas do fim do primeiro e do começo do
segundo mandato da presidente Dilma a ocasião para anular por meio de grosseira
e hipócrita chicana parlamentar a eleição presidencial em que seu candidato foi
derrotado.
É evidente que
os empreiteiros do golpe só prosperaram porque conseguiram manipular com êxito
frustrações, ressentimentos e ódios do reacionarismo latente nos setores mais
obscurantistas e empedernidos da pequena burguesia (ou “classe média”, como
dizem muitos). É hoje claro que o primeiro êxito importante dessa manipulação
ocorreu no dia 20 de junho de 2013. No dia 10 daquele mês, cerca de cinco mil
manifestantes vinculados ao Movimento Passe Livre de São Paulo foram
bestialmente agredidos pela Policia Militar (PM) de SP, a mando do governador
Alckmin. A indignação suscitada pelos relatos e imagens da estupidez policial,
largamente ecoados nas redes sociais da internet, notadamente no facebook,
levou muito mais gente às ruas, no dia 13, em solidariedade aos manifestantes
agredidos e em defesa do direito imprescritível de se reunir para fazer valer
suas reivindicações. Boa parte das reivindicações, centradas nos transportes,
escola e saúde públicas, eram justificadas. Mas para espanto dos brasileiros
mais jovens, que só conheciam o fascismo e o terrorismo reacionário pelos
testemunhos do passado, os filhotes locais dos Arditi de Mussolini e das
Sturmabteilung (SA) de Hitler irromperam bruscamente na manifestação da Avenida
Paulista. Uma testemunha registrou a agressão neonazista:
“Fiquei
horrorizada com o que vi na Paulista na quinta-feira passada (20 de junho). Os
partidos escorraçados da manifestação, descendo pelas transversais da avenida e
seus militantes baixando bandeiras. Tudo isso provocado por uma turba de alguns
milhares de idiotas despolitizados que cantavam “sem partidôoo”, “sem
bandeiráaa”, “eu, sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor” e outras
coisas como “mensaleiros”, com uma linha de frente composta por 200 homens, só
homens, de cabelo raspados e marombados que tentavam agredir fisicamente, o tempo
todo, militantes de todo e qualquer partido ou movimento social. Vi uma
bandeira da UNEAFRO sendo queimada e eles, eriçados, indo à euforia “sem
partidoooo, sem bandeiraaaa”. Fiquei assustada mesmo com a agressividade e mais
ainda, com a turba imbecil que acabava dando lastro a esses poucos nazistas e
skinheads.”
Houve de fato
imbecis que deram lastro aos nazistas e “skinheads”. Mas se agiram de modo
imbecil, foi porque, já intoxicados pelas “notícias” diariamente marteladas
pelo cartel mediático, eles foram manipulados por Skaf, o vulgar espertalhão
que comanda a Fiesp. Candidato ao governo do Estado, com seu espaço político
normal (a direita) já ocupado pelo reacionário explícito Alckmin, ele procurou
se situar no centro e arrebanhar votos um pouco mais à esquerda, aproveitando a
campanha anti PT já em pleno andamento. No dia 19 de junho, véspera do
sequestro do movimento de rua pelas tropas de choque do golpismo, o prefeito
Haddad atendeu à principal reivindicação dos manifestantes, renunciando à
elevação da tarifa dos ônibus. Houve comemoração na avenida Paulista. Skaf
mandou deixar iluminada com cores patrióticas a portentosa sede da Fiesp. Em
êxtase, manifestantes coxinhas ajoelharam-se diante do templo do deus Capital.
Era o prelúdio do que iria ocorrer no dia seguinte.
Nem todas as
manobras dão certo, nem tudo que dá certo resulta de uma manobra. Skaf não
conseguiu sequer levar a disputa para o segundo turno. Alckmin reelegeu-se
governador no primeiro. Em compensação, ele logrou transformar a Fiesp em santuário
dos coxinhas paulistas, estimulando o acoxinhamento de outras federações e da
própria confederação dos patrões da indústria.
Sem dúvida, é
justo cobrar da presidente Dilma sua parte de responsabilidade pela
deterioração da economia. Mas incontestavelmente, os efeitos destrutivos da
operação Lava Jato, operando como “poder paralelo” para atropelar com arrogante
descaramento os direitos e garantias constitucionais, exercem efeito
paralisante sobre os grandes conglomerados da engenharia nacional. Por isso os
círculos dirigentes mais lúcidos do grande capital industrial e bancário marcam
alguma distância em relação à aventura golpista em curso.
Na dialética
da luta de massas, a grande manifestação de 18 de março passado contra o golpe
e contra o Estado policial marcou o soerguimento, em São Paulo, da mobilização
ampla das forças democráticas e populares. As ruas sequestradas em 20 de junho
de 2013 pelas tropas de choque neonazistas (perante o olhar omisso da PM de
Alckmin, sempre pronta a despejar sua fúria sobre os movimentos sociais)
mostram que mesmo nesta região geopolítica do Brasil chamada Tucanistão é
possível derrotar a reação e o fascismo em campo aberto.
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