Miguel Rossetto, na Carta Maior
Nestas semanas em que o país
acompanha eletrizado o andamento do pedido de afastamento da presidenta Dilma,
devemos, com sinceridade, perguntar: afinal, o querem os que querem o golpe?
Uma resposta possível seria a de que
querem mais democracia. Uma versão radicalizada de soberania popular na qual a
vontade do povo fale mais alto que qualquer mandato eleito. Seria uma resposta
bela, não fossem os fatos.
Como falar em democracia quando pessoas
são espancadas pela cor roupa que usam ou pela opinião política que expressam?
Como falar em democracia quando entre seus líderes, está Bolsonaro que
abertamente pede a intervenção dos militares numa reedição farsesca de 64.
Quando manifestantes lamentam em cartazes que a presidenta não tenha morrido na
tortura? Quando artistas são atacados por sua opinião, como Chico Buarque, Letícia
Sabatella, Porta dos Fundos e tantos outros?
Não, democracia, diversidade ou
pluralidade não são conceitos que se articulem no discurso golpista.
Outra resposta, também generosa,
seria a de querem mais ética e menos corrupção. Mas de novo os fatos insistem
em desmenti-la. Não há vírgula deste tema no pedido que agora está no Congresso
Nacional, ele versa exclusivamente sobre registros fiscais. Não há nada no
pedido porque não há nada contra a presidenta. Nenhuma delação, nenhum dos
vazamentos do Panamá Papers, HSBC ou qualquer outro, nenhum inquérito, nenhuma
ação.
Pode-se dizer o mesmo de quem quer o
golpe? A resposta é não.
Tem interesse sincero no combate à
corrupção, o presidente da Câmara e condutor do golpe, Eduardo Cunha, flagrado
com contas na Suíça e presente em 9 de cada 10 delações? Tem este interesse
Aécio, octa-citado nas delações premiadas como beneficiário das propinas? Tem
este interesse Serra, também multiacusado e presente também no escândalo do
trensalão? Ou o PP gaúcho, acusado maciçamente de recebedor de verbas ilegais?
Não. Não há sinceridade neste
discurso, como não havia quando acusavam Vargas, Jango ou JK, de forma
semelhante.
A pergunta permanece. O que querem os
que querem o golpe? A forma mais clara de responder a isto é olhar o próprio
documento programático do golpe, "Ponte para o futuro" apresentado
pelo vice-presidente Michel Temer.
Ali, com uma clareza cristalina,
estão propostas para desindexar o salário-mínimo do piso previdenciário,
desindexar o próprio salário-mínimo da inflação, retirar verbas garantidas de
saúde e educação, acabar com o regime de partilha do pré-sal, retomar as
privatizações, rasgar a CLT e suas garantias trabalhistas e o fim de uma
política externa independente com MERCOSUL, Unasul e Brics.
Pode-se acusar o documento de muitas
coisas, menos de não ser sincero.
A questão é que um programa tão
agressivamente antipopular e antinacional jamais teria viabilidade se submetido
à população. A fraude jurídica (impeachment sem crime de responsabilidade, é
golpe) finalmente se encontra à fraude política (a imposição de um programa que
retira direitos e igualdade sem voto e sem legitimidade é golpe). O cavalo de
Tróia com aparência moralista tem, finalmente, um conteúdo selvagemente
neoliberal.
É isto o que eles querem.
De nossa parte podemos dizer o que
não queremos.
Não queremos que o Brasil de amanhã
seja o desastre argentino de hoje, que em apenas três meses mandou para a
pobreza 1,3 milhão de pessoas. Não queremos que a riqueza do Pré-Sal seja
entregue às mesmas petroleiras internacionais que tanto dano causaram a
democracia em várias regiões do planeta, não queremos, uma Constituição e
direitos sociais apenas no papel, queremos que eles façam parte da vida dos brasileiros,
não queremos um regime democrático apenas no nome, em que a soberania
popular seja subjugada pela opinião publicada de meia dúzia de famílias ou por
decisões arbitrárias de meia dúzia de tecnocratas.
Acreditamos no Brasil e nos
brasileiros.
O que queremos?
Podemos resumir numa frase: Mais
democracia e mais direitos!
Leia mais sobre temas
da atualidade: http://migre.me/kMGFD
Nenhum comentário:
Postar um comentário