08 abril 2016

Objetivos escusos

O que querem os que querem o golpe?
Miguel Rossetto, na Carta Maior
Nestas semanas em que o país acompanha eletrizado o andamento do pedido de afastamento da presidenta Dilma, devemos, com sinceridade, perguntar: afinal, o querem os que querem o golpe?
Uma resposta possível seria a de que querem mais democracia. Uma versão radicalizada de soberania popular na qual a vontade do povo fale mais alto que qualquer mandato eleito. Seria uma resposta bela, não fossem os fatos.
Como falar em democracia quando pessoas são espancadas pela cor roupa que usam ou pela opinião política que expressam? Como falar em democracia quando entre seus líderes, está Bolsonaro que abertamente pede a intervenção dos militares numa reedição farsesca de 64. Quando manifestantes lamentam em cartazes que a presidenta não tenha morrido na tortura? Quando artistas são atacados por sua opinião, como Chico Buarque, Letícia Sabatella, Porta dos Fundos e tantos outros?
Não, democracia, diversidade ou pluralidade não são conceitos que se articulem no discurso golpista.
Outra resposta, também generosa, seria a de querem mais ética e menos corrupção. Mas de novo os fatos insistem em desmenti-la. Não há vírgula deste tema no pedido que agora está no Congresso Nacional, ele versa exclusivamente sobre registros fiscais. Não há nada no pedido porque não há nada contra a presidenta. Nenhuma delação, nenhum dos vazamentos do Panamá Papers, HSBC ou qualquer outro, nenhum inquérito, nenhuma ação.
Pode-se dizer o mesmo de quem quer o golpe? A resposta é não.
Tem interesse sincero no combate à corrupção, o presidente da Câmara e condutor do golpe, Eduardo Cunha, flagrado com contas na Suíça e presente em 9 de cada 10 delações? Tem este interesse Aécio, octa-citado nas delações premiadas como beneficiário das propinas? Tem este interesse Serra, também multiacusado e presente também no escândalo do trensalão? Ou o PP gaúcho, acusado maciçamente de recebedor de verbas ilegais?
Não. Não há sinceridade neste discurso, como não havia quando acusavam Vargas, Jango ou JK, de forma semelhante.
A pergunta permanece. O que querem os que querem o golpe? A forma mais clara de responder a isto é olhar o próprio documento programático do golpe, "Ponte para o futuro" apresentado pelo vice-presidente Michel Temer.
Ali, com uma clareza cristalina, estão propostas para desindexar o salário-mínimo do piso previdenciário, desindexar o próprio salário-mínimo da inflação, retirar verbas garantidas de saúde e educação, acabar com o regime de partilha do pré-sal, retomar as privatizações, rasgar a CLT e suas garantias trabalhistas e o fim de uma política externa independente com MERCOSUL, Unasul e Brics.
Pode-se acusar o documento de muitas coisas, menos de não ser sincero.
A questão é que um programa tão agressivamente antipopular e antinacional jamais teria viabilidade se submetido à população. A fraude jurídica (impeachment sem crime de responsabilidade, é golpe) finalmente se encontra à fraude política (a imposição de um programa que retira direitos e igualdade sem voto e sem legitimidade é golpe). O cavalo de Tróia com aparência moralista tem, finalmente, um conteúdo selvagemente neoliberal.
É isto o que eles querem.
De nossa parte podemos dizer o que não queremos.
Não queremos que o Brasil de amanhã seja o desastre argentino de hoje, que em apenas três meses mandou para a pobreza 1,3 milhão de pessoas. Não queremos que a riqueza do Pré-Sal seja entregue às mesmas petroleiras internacionais que tanto dano causaram a democracia em várias regiões do planeta, não queremos, uma Constituição e direitos sociais apenas no papel, queremos que eles façam parte da vida dos brasileiros, não queremos  um regime democrático apenas no nome, em que a soberania popular seja subjugada pela opinião publicada de meia dúzia de famílias ou por decisões arbitrárias de meia dúzia de tecnocratas.
Acreditamos no Brasil e nos brasileiros.
O que queremos?
Podemos resumir numa frase: Mais democracia e mais direitos!

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