Por Haroldo Lima*, no portal Vermelho
Chegamos a uma grande inversão de valores. O
"avesso do avesso do avesso do avesso" aconteceu aos nossos olhos, há
poucos dias: corruptos bradando contra a corrupção, numa Câmara presidida por
um corrupto, para retirar do poder uma mulher que não é corrupta. A história,
algum dia, contará todo esse transe.
Mostrará,
constrangida, como uma camada da população não aceitou que pobres tivessem
acesso à universidade e pudessem viajar de avião; como políticos, derrotados
nas urnas, em 2014, insurgiram-se contra a vontade do eleitorado; como
pautas-bomba foram explodidas no Parlamento para desestabilizar o governo e o
país.
Registrará,
encabulada, como Lula e Dilma não aproveitaram períodos de enorme prestígio que
tiveram para encaminhar reformas estruturais, medidas para democratizar a mídia
e iniciativas arrojadas para desenvolver o país.
Observará,
indignada, técnicos concursados fazendo conluio com empresários e políticos
para assaltarem a Petrobras e, por último, registrará, alarmada, como o Supremo
Tribunal Federal recebeu do Procurador Geral da República pedido para afastar
um corrupto aboletado na presidência da Câmara e, quase seis meses depois, nada
fez.
O
certo é que, quando parecia que íamos deslanchar como nação, tirando perto de
quarenta milhões de brasileiros da pobreza absoluta; quando o presidente dos
Estados Unidos referiu-se ao nosso dizendo "esse é o cara"; quando
passamos a ser credores do FMI; quando descobrimos o pré-sal, e a Petrobras,
dentre as empresas de capital aberto, se tornou a maior produtora de petróleo
do planeta; enfim, quando nos tornamos a sexta economia do mundo, de repente,
tudo desandou.
"De
repente não mais que de repente", como diria Vinicius de Moraes, "do
riso fez-se o pranto", "do momento imóvel fez-se o drama".
Drama
que está em curso, porque, se é verdade que o golpe, travestido de impeachment,
não resiste a um julgamento de base jurídica, e por isso, presume-se, será
barrado no Senado, é também verdade que isto pode não acontecer e que
aparecerão assombrações.
A
primeira é a de assumir a presidência um político sem apoio da população, sem
liderança, sem carisma. Michel Temer disputou eleição para deputado federal, em
2006, pela última vez. Ficou na 54ª posição, no meio dos 70 deputados
paulistas. Teve 0,476% dos votos do seu estado. Não fossem as sobras dos
outros, estaria fora. Seu PMDB, em São Paulo, só elegeu três deputados. Ele foi
o último.
Na Câmara, não se projetou como parlamentar de visão ampla. Nunca foi do
"baixo clero", tampouco dos quadros definidores de posições. Chegou a
presidente da instituição, mas, também o Eduardo Cunha aí chegou. Membro do
governo, classificou-se como "mero vice decorativo".
O Data
Folha realizou nos dias 7 e 8 de abril pesquisa sobre o preferido para
presidente da República em 2018. Lula ficou em primeiro lugar em dois cenários,
em um empatado com a Marina. Teve 21% e 22% das preferências. Michel também foi
pesquisado: ficou com 2%.
Já
pensaram como nosso povo reagiria ao homem dos 2% guindado à presidência da
República pelas mãos de um corrupto?
A
segunda assombração decorre da primeira. O substituto de Michel na presidência
será o Eduardo Cunha. O governo seria Michel-Cunha.
Ocorre
que ambos estão envolvidos na Lava Jato. E a Lava Jato então ficaria em
dificuldades? Parece que não.
A Lava
Jato começou contra a corrupção. Depois, contaminada com as inclinações
políticas do juiz Sérgio Moro, passou a combater a corrupção para mobilizar
apoios contra Lula e Dilma e o projeto que seus governos representara. Se esses
caem, a Lava Jato teria cumprido seu papel, e então se encerraria. Os corruptos
festejariam.
São
assombrações a serem espancadas.
*Haroldo
Lima é engenheiro, foi deputado federal pela Bahia e Presidente da Agência
Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. É membro do Comitê Central do
Partido Comunista do Brasil.
Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. É membro do Comitê Central do
Partido Comunista do Brasil.
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