02 setembro 2017

Bumerangue

Fisiologia pode brecar fetichismo da Lava Jato

André Singer, na Folha de S. Paulo

A fixação da Operação Lava Jato são as algemas, não o bigode de Romero Jucá (PMDB-RR). Dessa vez quem matou a charada foi José Simão. O principal desejo de Sergio Moro, Deltan Dallagnol e Rodrigo Janot, líderes do Partido da Justiça (PJ), é punir. Eles querem meter na cadeia o maior número possível de corruptos.
No limite, tal como no romance de Machado de Assis, ninguém escaparia "aos emissários do alienista", uma vez que Itaguaí inteira, perdão, o Brasil todo, teria parte com a corrupção, inclusive o próprio trio justiceiro. Vejamos.
O braço direito de Janot na Procuradoria trabalhou para escritório contratado pelo empresário Joesley Batista. Prenda-se Janot. Deltan aproveitou a fama adquirida para cobrar R$ 40 mil por palestras. Prenda-se Deltan. O padrinho de casamento de Moro prestou serviços para um acusado na Lava Jato. Prenda-se Moro.
É claro que, em algum ponto dessa dança das cadeiras, a música vai parar. Quem caiu saiu do jogo. Quem se salvou ficou. O primeiro sinal de parada veio um mês atrás, quando, ao contrário do relatado em "O Alienista", a Câmara não "entregou o próprio presidente", sabendo-se que Michel Temer é, na verdade, o chefe dos 263 deputados que decidiram protegê-lo.
Agora a nova e, quiçá, última grande ofensiva dos bacamartes deve ser a segunda denúncia contra o ocupante do Palácio do Planalto.
Metido no bambuzal plantado pelo doleiro Lúcio Funaro, Janot prepara as derradeiras flechas de que dispõe, antes de deixar o cargo. Pelo que foi cuidadosamente vazado até aqui, Funaro revelou detalhes sobre entrega de dinheiro ao ex-presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), também preso, e ao ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB-BA), que curte prisão domiciliar. Ambos são aliados históricos do atual presidente da República.
Para também ajudar Janot, o placar de 2/8, quando Temer teve a primeira vitória, mostrou uma diminuição da blindagem presidencial. Cerca de cem parlamentares dos que optaram por destituir Dilma em 2016 escolheram agora jogar Temer no caldeirão da Lava Jato. Com isso, a facção anti-Partido da Justiça ficou restrita ao número que elegeu Eduardo Cunha (PMDB-RJ) à presidência da Casa no começo de 2015.
Trata-se do velho blocão/centrão. Ele não é suficiente para fazer mudanças constitucionais, mas, bem alimentado por verbas, consegue sustentar governos.
Foi assim que Sarney chegou ao fim do seu arrastado mandato em 1990. Vai ser interessante assistir ao novo embate entre os fisiológicos e os alienistas, loucos para algemar as mãos esvoaçantes do sucessor de Rousseff. 

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