Cada um com seu sonho, possível ou não
Luciano Siqueira, no portal Vermelho e no Blog da Folha
O sonho é
livre, fundado na realidade ou não. Ou no tempo. Como nesses últimos dias do
ano que finda, quando manda a tradição fazer planos para o futuro, ainda que no
horizonte limitado do ano vindouro.
Certa vez
Millor Fernandes, numa coluna “livre pensar é só pensar”, escreveu que uma das
ironias da vida é que quando crescemos, nos tornamos adultos, temos emprego e
salário, já não queremos comprar um imenso saco de bombons!
Ou seja, a
criança a quem os pais negam a quantidade (exagerada) de bombons desejada,
constata que a ameaça que fizera há 18 a 20 anos atrás já não tem sentido.
Mas há
adultos, como um tal Elon
Musk, bilionário fabricante de
foguetes, que simplesmente
quer colonizar Marte em 10 anos!
Ele fala sério,
conforme atestam diversos órgãos da imprensa norte-americana. Tanto que o cara
controla duas poderosas empresas de TI e resolveu criar a SpaceX, que constrói foguetes e
alimenta o sonho planetário do seu dono.
Na política
também é assim. Há sonhos para todos os gostos – sérios ou delirantes. De
objetivos estratégicos alicerçados na compreensão cientifica da realidade a
pretensões que, imediatistas, projetam aspirações tão audaciosas quanto
inviáveis.
É que a leitura
do curso histórico nem sempre considera toda a gama de variáveis que
concorreram para determinado desenlace tido como imprevisível e, por premiar a
ousadia, se convertem em falsos paradigmas.
Fernando
Collor, por exemplo, venceu as eleições presidenciais de 1989 como se fora um
outsider, batendo concorrentes que ostentavam muito mais bagagem e prestígio.
Desde então, são recorrentes as tentativas de repetir a proeza, mas sem a menor
consideração para o fato de que, então, se iniciava novo ciclo político e as
forças tradicionais, digamos assim, se subdividiram em mais de uma dezena de
candidaturas.
Em meio à dispersão
e à busca pelo novo por parte do eleitorado, no segundo turno se confrontaram
Collor e Lula.
As eleições
presidenciais de outubro se enquadram no novo ciclo conservador pós-impeachment
e, no estado atual, inicialmente comporta múltiplas candidaturas. Porém, em sua
essência, em nada se compara ao pleito de 1989.
Agora mesmo,
cá na província, já tem gente arrotando poder de fogo que na verdade não tem,
no intuito de criar o clima desejado para abocanhar o poder local em peleja
cujo cenário ainda não está definido.
Equilíbrio e
bom senso não fazem mal a ninguém, mais ainda quando se apoiam na avaliação da
real correlação de forças e na boa percepção de tendências no comportamento
futuro do eleitorado.
Enfim, nem
tanto o mar, nem tanto a terra. Nem a fragilidade do garoto sequioso por se
empaturrar de bombons, nem a ousadia do magnata que deseja povoar o planeta
Marte. Na política, vale sonhar sim, numa perspectiva dimensionada pela
realidade objetiva.
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Ilustração: Kandinski
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