Alberto Burri
O
grande teatro do combate à corrupção
Aderbal Freire Filho, Brasil 247
Eduardo Cunha não estava nem aí para combater a corrupção, claro. Geddel
Vieira Lima, que dava entrevistas nas passeatas dizendo que era preciso acabar
com a corrupção, não estava nem aí para combater a corrupção.
A excelentíssima senhora do então prefeito de Montes
Claros, em MG, dando gritos inflamados contra a corrupção, não estava nem aí
para combater a corrupção. Aécio Neves, que liderou a cruzada de moralização do
Brasil, não estava nem aí para combater a corrupção. Romero Jucá, que assumiu e
desassumiu e assumiu de novo (na moita) o “cargo” de primeiro-ministro do
governo Temer, não estava nem aí para combater a corrupção. Michel Temer, que
acusou de ser bandido notório seu convidado da meia-noite para um papo ameno
sobre dietas e transporte de valores, não estava nem aí para combater a
corrupção.
A ministra Carmem Lúcia, que fez um discurso
austero e moralizante, quando assumiu a presidência do STF cercada da fina flor
da corrupção, não estava nem aí para combater a corrupção. Fernando Henrique
Cardoso não estava nem aí para combater a corrupção, tanto que criou o cargo de
Engavetador Geral da República, assumido em caráter vitalício por Gerardo
Brindeiro, que não estava nem aí para combater a corrupção. José Serra, Geraldo
Alkmin e Paulo Preto nunca estiveram nem aí para combater a corrupção.
A grande maioria dos jornalistas que defende a
moralização do país que estaria sendo feita pela Lava à Jato, não está nem aí
para combater a corrupção. Tanto que só atacam os corruptos quando eles são
presos ou surpreendidos com a boca na botija (nessa hora, a imprensa começa com
ahs e ohs, como pode, ah, oh, no Jaburu, ah, oh, de noite, ah, oh, a mala, ah,
oh; eu digo, ué, gente, todo mundo sabia que esse cara era um bandido, só esses
jornalistas não? não é da profissão de jornalista ser informado?). Fernando
Collor de Mello, que dizia que ia acabar com a corrupção, sem estar nem aí para
combater a corrupção, foi eleito graças a imprensa que o apoiou sem estar nem
aí para combater a corrupção.
Os militares nunca estiveram nem aí para combater a
corrupção. Alguns historiadores até contam que nunca houve tanta corrupção no
Brasil como na ditadura militar, o que é bastante lógico, tratando-se de um
regime que tinha o poder de proibir e censurar informações. A família Bolsonaro,
então, que mantém funcionários fantasmas, recolhe grana dos salários deles (e
dos outros também), dá medalhas a milicianos e sicários, monta um esquema de
influencia e poder que elege pai, mãe, filhos, tem patrimônio incompatível com
sua renda, nunca esteve nem aí para combater a corrupção.
Dalton Dallagnol, que foi na moita na Caixa
Econômica negociar juros para um dinheiro esquisitão, de uma jogada que armou
com os Estados Unidos e que a própria Procuradora Geral da República e o
próprio STF também acharam esquisitão, não está nem aí para combater a
corrupção. Sergio Moro nunca esteve nem aí para combater a corrupção, embora
isso só tenha ficado mais claro para muitos depois dele virar ministro de
corruptos e fazer cara de bobo (de cínico?) quando perguntam a ele pelo Onyx,
pelos laranjas, pelo ministro A, pelos milicianos, pelos filhos do chefe, pela
mulher do chefe, pelo ministro B, pelo Queiroz, pelo ministro C, todos esses
que, como ele, não estão nem aí para combater à corrupção.
Todos esses falsos heróis do combate à corrupção
têm um discurso que posso resumir. Mais ou menos assim.
“Hoje em dia, as pessoas já não respeitam nada.
Antes, colocávamos num pedestal a virtude, a honra, a verdade e a lei... A
corrupção campeia na vida do país nos nossos dias. Onde não se obedece a lei, a
corrupção é a única lei. A corrupção está minando este país. A virtude, a honra
e a lei desapareceram de nossas vidas”.
É o discurso síntese, uma palavra mais, outra
menos. Podia ter juntado vários discursos dessa gente, botado numa peneira e
feito esse. Mas nem foi preciso, peguei um que já estava pronto e que já fazia
a síntese de todos. Foi exatamente com essas palavras a declaração de um desses
heróis do combate à corrupção, em entrevista publicada na revista Liberty,
em 17 de outubro de 1931. Um que também não estava nem aí para combater a
corrupção, como vocês sabem. Qual deles? Al Capone. Pois é, assim falou Al
Capone, uns dias antes de ser preso.
Qual é então a esperança que podem ter os
brasileiros na luta contra a corrupção? É simples e não é simples: o verdadeiro
combate à corrupção é estrutural, envolve uma discussão maior, de educação,
cultura, modelos de sociedade.
Aderbal
Freire-Filho é Diretor e autor teatral, ator e apresentador
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