02 abril 2019

Sem eira nem beira


Pior do que na curta Era Collor
Luciano Siqueira

No auge do atribulado governo Collor, o então presidente da Câmara dos Deputados, Ibsen Pinheiro, do PMDB gaucho, em conversa com o presidente nacional do PCdoB, João Amazonas, manifestou estranheza diante do absoluto desprezo do presidente da República pela necessidade de estabelecer relações harmoniosas com o Congresso Nacional.
Não se governa sem o parlamento, dizia Ibsen. Ao que Amazonas acrescentava a impressão de que faltava a Collor a cultura política necessária ao exercício do cargo.
No Brasil dos nossos dias, o capitão presidente não apenas se relaciona com o parlamento aos bofetes, como demonstra maior pobreza cultural do que Fernando Collor.
É um presidente sem eira nem beira. Como a revista britânica The Economist, porta-voz do capital financeiro internacional, avaliou em artigo na semana passada, Bolsonaro ainda não compreendeu o que significa presidir um país da dimensão e da importância geopolítica do Brasil.
Demais, sua equipe ministerial — salvo o grupo de militares, que se mantém mais discreto — produz muito mais factóides do que ação administrativa.
Passa a impressão de despreparo, seja quanto a fazer moer a máquina montada (constituída de auxiliares em geral sem experiência de gestão), seja quanto a focar as iniciativas nos problemas prioritários e mais urgentes.
Nesse sentido, emblemática foi a postura do ministro da Educação, o colombiano Ricardo Vélez Rodriguez, em sabatina na Câmara dos Deputados. Perguntado sobre os principais planos de sua pasta, respondeu pateticamente: "aceito sugestões". 
Agora mesmo, em sua viagem a Israel, o próprio presidente anuncia escritório de representação do Brasil em Jerusalém — sem a menor necessidade operacional — e faz questão de dizer que até o final do seu governo haverá tempo para constituir ali a Embaixada, acicatando desastrosamente os países árabes, cuja presença nas trocas comerciais externas tem peso específico enorme. 
Ou seja, o presidente brinca com fogo, pondo sob risco 4% das exportações de carne e outros produtos, mais do que exportamos para toda a África. 
Entrementes, o capitão e seus diletos filhos seguem alimentando suas contas no Twitter com mensagens dirigidas à parcela da opinião pública ultraconservadora, que constitui o núcleo duro de apoio ao governo, como que com a intenção de consolidar um ponto de apoio com o qual possam se contrapor ao declínio de popularidade do presidente e do governo, que se acelera, sobretudo nos centros urbanos.
Fernando Collor deu no que deu. Para onde caminhamos com Jair Bolsonaro?
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