Bolsonaro na ONU: ditadura petista, Amazônia intocada e índios
querem se desenvolver
Jornal GGN
O
discurso de Jair Bolsonaro na 74ª Assembleia Geral das Nações Unidas foi
marcado por ataques contra países e a imprensa internacional, tom bíblico e de
campanha eleitoral, negando que a Amazônia estava sendo destruída, acusando o
clima seco e ações criminosas “inclusive de indígenas” de terem provocado as
queimadas, fazendo ironias à ONU, enobrecendo o ex-juiz Sérgio Moro e afirmando
que seu governo estava salvando o Brasil do socialismo, colocando fim ao
“acordo entre a ditadura petista e a ditadura cubana”.
Logo na abertura de sua fala, Bolsonaro agradeceu à Deus, em tom
religioso, e disse que estava ali para “restabelecer a verdade, porque é bom
para todos nós”. “Apresento aos senhores um novo Brasil que ressurge, após
estar a beira de um socialismo”, introduziu. Os primeiros minutos do discurso
foram de ataques direto aos governos dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff,
no qual além de descrever como “ditadura petista” ou “socialismo” em tom de
ofensa, também caracterizou como “absolutismo”.
Em seguida, usou como exemplo a Venezuela, afirmando em ironia
que essa “ditadura deu certo”, mencionando que há fome, desemprego e violência
no país vizinho. Disse que “o Brasil também sente os impactos da ditadura
venezuelana”, ao receber os imigrantes da fronteira.
Após discursar contra as “ditaduras socialistas”, Bolsonaro
começou criticar as notícias divulgadas pelo mundo sobre as queimadas na
Amazônia, e contrariando todos os dados do Instituto de Pesquisas Ambientais
(INPE) e de fiscalizações ambientais, disse que “a Amazônia permanece
praticamente intocada”. Sobre as queimadas, tratou como consequências do clima
quente e seco, “espontâneas”, mas também “criminosas”: “existem queimadas
ocasionadas por indígenas”, exemplificou. Ainda, confrontou “os
ambientalistas”, dizendo que eles mentem sobre a Amazônia ser o pulmão do
mundo.
E
foi neste tema que Jair Bolsonaro encontrou o eixo para levantar a bandeira
nacionalista: “Os ataques sensacionalistas que sofremos por grande parte da
mídia internacional despertaram nosso sentimento patriótico. É uma falácia
dizer que Amazônia é patrimônio da humanidade, e é mentira o que tratam
ambientalistas que a Amazônia é o pulmão do mundo. O Brasil embarcou nas
mentiras do mundo”, disse, confrontando a próprio ciência.
Juntamente com a bandeira patriótica e quase em versão
estadista, o mandatário sugeriu desenvolver e explorar a Amazônia, afirmando
que “nossos nativos [os indígenas] são serem humanos, eles querem e merecem
usufruir dos mesmos meios que nós”. “Muitas comunidades estão sedentas para que
boa parte dessa parte do Brasil se desenvolva.”
Desqualificou a visibilidade internacional do cacique Raoni,
respeitando por indigenistas, diversas tribos indígenas e entidades de direitos
humanos no Brasil e no mundo, sendo sugerido ao prêmio Nobel da Paz pela luta e
atuação em defesa da Amazônia. “A visão de um líder indígena não representa a
de todos os brasileiros, muitos vezes alguns deles são usados como uma peça de
manobra por governos estrangeiros, para avançar contra a Amazônia”, defendeu.
E como se atuasse em defesa dos indígenas brasileiros, Bolsonaro
afirmou: “Tratam nossos índios como homem das cavernas, o Brasil se preocupa
com aqueles que estavam antes de nós. Mas o índio não quer ser pobre em terra
rica”, sugerindo o desenvolvimento das reservas ambientais.
“As reservas indígenas têm grande abundância de ouro, diamante,
urânio e minérios raros, entre outros. A reserva Yanomami, por exemplo, conta
com 95 mil km2, o equivalente a Portugal ou Hungria, embora apenas 15 mil
índios vivam na área”, continuou, na lógica de que explorar o local é positivo.
“Os que nos atacam não estão preocupados com os índios, mas com as riquezas
minerais existentes nessas áreas”.
E
para tentar desqualificar o cacique Raoni e demais lideranças indígenas de todo
o Brasil, omitindo as manifestações do Acampamento Terra Livre, a maior mobilização
nacional indígena do país, com a presença de milhares de indígenas, em abril
deste ano contra o governo Bolsonaro, o presidente disse que há comunidades
indígenas que querem o desenvolvimento de seu governo. Para isso, leu uma carta
da indígena Ysani Kalapalo, do Parque do Xingu, no Mato Grosso, que esteve
na comitiva do Bolsonaro. Kalapalo é repudiada por 16 povos de sua própria
comunidade do Xingu.
Voltando a falar sobre o desenvolvimento na Amazônia, Bolsonaro
citou a França e a Alemanha, que “usam mais de 50% de seus territórios para a
agricultura”, comparando que “o Brasil somente 8%”, e criticando que “61% do
nosso território é preservado”, mostrando que isso irá acabar.
No discurso corrosivo, propôs um “novo ambientalismo” contra o
“velho ambientalismo e indigenista ultrapassado”, associando a preservação
ambiental ao que ele acredita ser o colonialismo: “Acabou o monopólio do senhor
Raoni. A ONU teve papel fundamental na superação do colonialismo e não pode
aceitar que essa mentalidade regresse a esta sala e corredores sobre qualquer
pretexto”, afirmou.
Também fez menção a passagens da Bíblia, como “a verdade vos
libertará” e “a ideologia invadiu a própria alma humana para dela expulsar
Deus”. E sem ter manifestado nenhum posicionamento para se solidarizar pela
menina Ágatha, morta no Morro do Alemão, falou da perversão de “nossas
crianças”, e exaltou “valores da família”, afirmando que a “ideologia” de
governos anteriores tentou “corromper a família”, com uma “ideologia” que se
“instalou na Cultura, na educação, comprando a imprensa”.
Ao
tratar do tema da criminalidade, uma de suas bandeiras de governo, Bolsonaro
disse que o compromisso do Brasil “caminha junto com o combate à corrupção e a
criminalidade, demandas urgentes” e que trabalha “dentro e fora das Nações
Unidas” para que “não haja impunidade para criminosos e corruptos”. Citou as
extradições feitas, como a de Cesare Battisti à Itália: “Terroristas
disfarçados de exilados políticos”.
Quando falou de criminalidade e corrupção, mostrou que a crise
interna de seu governo com o ex-juiz da Lava Jato e atual ministro da Justiça
foi solucionada e elogiou Sérgio Moro: “O combate à corrupção com patriotismo,
perseverança, graças a um juiz, o doutor Sergio Moro”.
Ao falar de “violência”, ignorou a periferia e os pobres, além
da própria letalidade policial, e disse que as principais vítimas são os
policiais militares como “alvo da prioridade do crime”, que hoje em seu governo
estão mais protegidos. Ao falar de “perseguição religiosa”, ignorou as religiões
espíritas e afrodescendentes, mas defendeu a proteção a “igrejas, sinagogas e
mesquitas”. “Recordaremos anualmente aqueles que sofrem a perseguição
religiosa”, disse.
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