O estranho mundo das taxas de juro negativas
Lecio Moraes, no
Blog de Renato
O QUE ESSAS
TAXAS REVELAM SOBRE A CRISE CAPITALISTA NO OCIDENTE.
Nos onze
anos decorridos desde a crise de 2008, houve muitas mudanças no sistema
econômico mundial, algumas extraordinárias, outras muito estranhas. Parte
dessas mudanças decorre de alterações na dinâmica do sistema capitalista
internacional, determinadas por fatores que vêm alterando seu ciclo de
valorização e de acumulação – como o deslocamento de seu centro produtivo para
o Leste Asiático, a forte intervenção dos Estados e a extravagante ação dos
principais bancos centrais, em 2008, quando absorveram as fortes perdas de
capitais em crise. Outra transformação foi o surgimento de uma tendência
prolongada de estagnação, que vem determinando taxas de inflação e de juros
muito baixas.
Entre os
fenômenos estranhos, chama a atenção o aparecimento de títulos de governos com
juros negativos, títulos comprados por uma classe de investidores por um valor
superior ao que irão receber no vencimento. Um fenômeno que tem acontecido com títulos negociados em mercado e que vem
se difundindo em economias maduras, como as da Europa Ocidental e a do Japão.
Este artigo
analisa esse fenômeno, classificando-o como uma manifestação tardia da crise
iniciada em 2008. Ele revela um processo conhecido como entesouramento,
definido como um movimento preventivo de capitais que optam por sair do mercado
frente à atual incerteza presente no sistema, trazendo um risco não
quantificável de perdas generalizadas.
Como juros
se tornam negativos
O juro
negativo é fenômeno contra-intuitivo, mas as regras de dívida pública na forma
de título tornam possível sua existência. Títulos públicos não têm uma taxa de
juro determinada, os governos vendem seus papéis informando qual o valor que o
Tesouro pagará por eles na data de seu vencimento (o “valor de emissão”). O
preço de um título é sempre inferior ao “valor de emissão”. A diferença entre o
valor da emissão e o preço pago é o
juro, e sua taxa será o juro dividido pelo preço.
Quando
disponíveis no mercado, os preços dos títulos do governo (o mercado secundário)
flutuam e, junto com eles, as taxas de juro. Esses mercados e suas flutuações
têm importância sistêmica, pois os títulos de governo atuam como os ativos de
referência dos mercados financeiros, servindo de parâmetro para as taxas de
juro e de lucro praticadas nos mercados financeiros do sistema capitalista
internacional.
Considere um
investidor que compre um título que tenha como valor de emissão mil reais,
pagando 900 reais. Ele ganhará 100 reais, a uma taxa de 11,1%. Mas, se ele o
vender no mercado secundário por R$ 950, o comprador ganhará de juro, agora, R$
50, e sua taxa cai para 5,26%. Note-se que quanto maior o preço do título,
menor será a taxa de juro, e vice-versa.
O juro
negativo se dá no esdrúxulo caso em que o valor pago supera o valor de emissão.
No exemplo, para um preço de R$ 1.050, o investidor está “pagando para
emprestar”, e sua taxa será de -5%.
O
entesouramento como fenômeno da crise capitalista
A existência
de títulos com taxa de juro negativa revela haver a existência de uma incerteza
duradoura para investimentos e empréstimos, indicando a impossibilidade de se
determinar, sequer, o grau de risco.
Nessas
condições, conforme analisou Marx, os capitalistas começam a retrair sua ação,
mudando sua pulsão de acumulação para uma pulsão de preservação do valor
presente de seus capitais. Transformando a acumulação em entesouramento e o
capitalista em entesourador. Para tanto, capital já convertido em moeda terá
que buscar abrigo em um locus fora do ciclo de valorização, transformando-se em
tesouro estéril.
No ciclo do
capital que abrange as fases de expansão, crise e retomada, o entesouramento
está associado à fase da crise. A crise acontece quando se constitui uma
superprodução relativa de capital, proliferando capitais de baixa taxa de lucro
que prejudicam a eficiência do sistema e também causam distúrbio nos
referenciais de taxa média de lucro. Cria-se um ambiente de incerteza, em que
as expectativas se deterioram e as decisões de investimento são suspensas ou
adiadas, provocando uma “parada súbita” da acumulação. Essa parada, reduz
bruscamente toda a demanda, tanto a do capital como a dos trabalhadores, e a
crise se instala. Os capitais ineficientes precisam ser destruídos de modo a se
restabelecer as condições de uma nova expansão, com expectativas de taxas de
lucro crescentes para recompor a eficiência do sistema.
A crise é
superada quando, eliminados os capitais ineficientes, neutraliza-se a pressão
baixista sobre as taxas de lucro, reduzindo também a taxa de juro no sistema.
Só então as expectativas de ganhos melhoram, permitindo que volte a se
elevar novamente o patamar da taxa de
investimento, o que abre o caminho para um novo ciclo de valorização e de
expansão.
A destruição
de capitais é o centro da crise e sua consequência necessária. Mas essa
destruição não se dá pela falência involuntária ou pela forma voluntária do
entesouramento. Para tanto, é preciso que o capital seja monetário e haja um
refúgio: um substrato que permita a guarda do valor. A forma clássica do
refúgio sempre foi o ouro ou outros metais preciosos.
A ação de
entesourar é uma parte da dinâmica da crise, porém, o processo atual tem duas
novidades: o seu volume extraordinário; e a nova forma que toma, ao fazer de
títulos da dívida de governos como seu principal refúgio.
O
aparecimento dos títulos com juros negativos
O fenômeno
dos títulos públicos com juros negativos tornou-se relevante especialmente a
partir de 2014, coincidindo com a redução de aquisições de títulos privados
pelos principais bancos centrais, no âmbito das políticas de quantitative
easy (“flexibilidade monetária”, explicada mais abaixo) que reduziram a
compra de novos títulos da dívida privada, embora tenham mantido os estoques
dos títulos já em carteira. Desde então, a demanda geral por títulos de
governos se acentuou em todos os mercados maduros do Ocidente e do Japão,
elevando seus preços. Sem a garantia de compra dos títulos privados pelos
bancos centrais, a incerteza cresceu e a demanda por títulos de governo
aumentou, elevando seus preços até alcançarem, em alguns casos, um preço maior
do valor a ser recebido. A busca por títulos mais seguros da dívida pública,
mesmo com a perda exposta pelos juros
negativos, revelou a emergência do fenômeno do entesouramento, um
movimento de busca de refúgio dos capitais frente a expectativa de perdas
relevantes, típicos da fase de crise.
A princípio,
os juros negativos restringiam-se aos títulos de países de economia maduras e
com sólidos resultados fiscais, como Alemanha, Suíça, países nórdicos e o
Japão. Mas logo a demanda por entesouramento em títulos em euros e yens
expandiu-se para títulos de outros países europeus, bem como, também, na
direção de títulos de vencimentos mais longos. Essa expansão de títulos com
taxas de juro negativas chegou a todos os países do Ocidente Europeu, até para
as pequenas economias como Portugal e as de difícil situação fiscal, como a
Itália.
Em 2017, a
Suíça e a Alemanha, por exemplo, tinham taxas negativas em títulos com
vencimento de 30 e 20 anos, respectivamente. Hoje, os títulos suíços com taxa
de juro negativa chegaram até aqueles de vencimento até 50 anos e aos alemães
de até 30 anos. No Japão e nos países nórdicos os títulos de 10 anos, estão com
taxas negativas. Até mesmo em pequenos países como Portugal, as taxas negativas
chegam a títulos com vencimento de até sete anos; também a periférica Bulgária,
ou a problemática Itália, contam com títulos negativos para suas dívidas com
prazo de até três anos.
Segundo o
Financial Times (com dados da Bloomberg), em 2015, o valor total de títulos com
taxas nominais de juros negativas era de US$ 2 trilhões. Após uma redução do
ritmo em 2016, os títulos nessa condição voltaram a crescer forte, chegando a
US$ 12,5 trilhões em julho de 2019, e a 17 trilhões em setembro. A
característica específica do entesouramento atual tem como sua principal forma
os títulos da dívida pública. Essa preferência por títulos públicos pode ser
explicada pelo volume extraordinário de capitais em busca de entesourar, uma
demanda que tornou os mercados de ouro estreitos e inelásticos. Essa opção
reforça ainda mais a crescente centralidade que as dívidas governamentais vêm desempenhando
no sistema capitalista internacional.
Por enquanto
os juros negativos só existem basicamente nos mercados secundários, embora
Banco Central Europeu já estejam a emitir títulos à taxa de juro zero. A única
exceção é a do Banco do Japão que opera com uma taxa de -0,10% (o que traz o
ganho para o próprio Estado). Embora, todos os demais bancos centrais
ocidentais contam com taxas reais negativas (taxas nominais inferiores aos da
inflação).
REPORT THIS AD
A expansão e
disseminação de títulos com juro negativo, revela a existência crescente de uma
fuga do risco, tanto sobre empréstimos como para o investimento.
A ausência
de títulos com juro negativo nos EUA e no Reino Unido parece revelar uma
situação particular. Uma possibilidade é a de que seus títulos (os treasuries),
estejam mais baratos (e, portanto, pagando uma taxa de juro mais alta),
permitindo, assim, que um movimento de entesouramento em treasuries
exista, sem que haja as taxas negativas de juro presentes nos títulos em euros
ou em yens. No entanto, essa explicação, admite que os treasuries e o
dólar sejam menos confiáveis que os da zona do Euro e do Japão, que não parece
razoável.
As políticas
dos bancos centrais em 2008: a origem
No dia 15 de
setembro de 2008, houve uma falência simultânea de várias grandes instituições
financeiras em Nova York. O entrelaçamento de ativos privados e de suas
garantias, bem como a integração em tempo real dos principais mercados
financeiros do Ocidente, provocaram uma paralisação dos negócios, e a maior parte
dos títulos de dívidas privadas tornou-se insolvente. O sistema parou, não
havia capitais líquidos a negociar.
O resultado
imediato da crise seria um forte aumento da taxa de juro da economia e uma
queda brusca na demanda, destruindo rapidamente os capitais mais expostos, com
alta dívida ou baixas taxas de lucro. Estaria aberto o processo para uma
possível recuperação posterior. Mas o resultado social seria catastrófico,
dezenas de milhões de famílias perderiam sua condição de consumo e os Estados
teriam sua receita drasticamente reduzidas.
A resposta
imediata dos principais bancos centrais ocidentais, em ação conjunta com seus
respectivos governos, inverteu essas consequências. As perdas de capital nos
mercados financeiros foram bastante reduzidas, limitadas a poucas grandes
falências, as perdas de outras empresas foram fortemente atenuadas; as taxas de
juro se reduziram; as perdas sociais iniciais foram grandes, mas certamente
muito menores do que aquelas resultantes das leis do capitalismo.
Frente a
crise, de imediato, os principais bancos centrais ocidentais (denominação que
daqui por diante incluirá também o Japão), liderados pelo FED e apoiados por
seus governos, adotaram uma inédita política de intervenção direta no mercado
de títulos da dívida privada comprando-os, em uma oferta ilimitada de fundos e
por preços pelos quais foram negociados na semana imediatamente anterior ao dia
15 de setembro.
Essa
política monetária de intervenção nos mercados, ficou conhecidas
eufemisticamente como de quantitative easy, ou QE (“flexibilidade
monetária”), foi uma verdadeira salvação geral de capitais constituídos por
títulos “podres”, já que, naquele momento estavam insolventes e nem mais valor
tinham. Em uma oferta sem limite, não foi uma compra por dinheiro, mas, equivaleu
a uma troca de os títulos “podres” por novos títulos da dívida pública de cada
um de seus governos, emitidos até o limite que fosse necessário. Para manter os
preços elevados nas trocas, o valor dos títulos públicos também se elevou e, em
consequência, suas taxas de juros foram reduzidas até abaixo de dois por cento
ao ano, um patamar também inédito.
A política
do “quantitative easy” fez com que os bancos centrais passassem de
reguladores e emprestadores de última instância em grandes proprietários de
títulos, na verdade no maior investidor individual em cada um de seus mercados
nacionais. Uma posição que se estende até hoje. Após a imediata crise, os
bancos continuaram ofertando, mensalmente, dezenas de bilhões de dólares (em
euro, libras e euros), um valor que posteriormente foi sendo reduzido.
As compras
do FED e do Banco da Inglaterra duraram até o final de 2013, enquanto o Banco
do Japão e o BCE, as mantém até hoje, embora em valor menor. Porém, o valor dos
títulos comprados e acumulados nas carteiras dos bancos centrais permanecem e,
à medida que vão vencendo, outros são adquiridos.
Estima-se
que o impacto direto da política quantitative easy na compra de títulos
privados “podres” nos primeiros anos pós-crise, elevou a dívida pública pelo
menos entre 8 ou 9 trilhões de dólares. Mas tais valores continuaram crescendo.
Os dois maiores balanços, os do FED e do BCE, juntos, registram, atualmente,
9,7 trilhões de dólares, correspondendo a um equivalente valor de emissão de
títulos públicos.
O resultado
final e desejado foi uma inversão das consequências da crise capitalista: os
capitais financeiros e também os capitais produtivos ligados a eles em vez de
destruídos, foram revividos; e a elevação da taxa de juro em vez de se elevar fortemente (visto
que os devedores dificilmente honrariam suas dívidas), foram reduzidos
drasticamente.
Ao trocar
“títulos podres” por títulos da dívida pública, milagrosamente, as carteiras
das instituições financeiras, virtualmente quebradas, voltaram a ter valor, o
que normalizou os mercados, tirando-os do choque. A emissão de títulos da
dívida pública necessária à “salvação”, elevou fortemente os déficits públicos
e suas dívidas.
Afora isso,
cada banco central tratou de apoiar seu próprio sistema bancário. Os bancos,
sem demanda de empréstimos, acumularam enormes reservas ociosas. Para aliviar
os custos dessas reservas para os bancos, o FED passou a aceitá-las como
depósitos remunerados. Um subsídio que também evitou instabilidades. As
reservas bancárias no balanço do FED – por exemplo – que até 2008 oscilavam em
torno de US$ 200 bilhões, em 2015 chegavam a US$ 1,3 trilhão.
Certamente,
os bancos centrais esperavam que, com balanços limpos e taxas de juros baixas,
haveria uma tomada de crédito para investimento, reduzindo a carteira de
títulos privados e as reservas bancárias. Mas, em vez de investirem, os capitalistas
tomavam créditos a baixíssima taxa de juro para especular, comprando suas
próprias ações na bolsa para valorizá-las, beneficiando seus acionistas.
Mas entre
2010 e 2011, os financistas utilizaram seus balanços fortalecidos pelos títulos
da dívida pública para empreender uma nova corrida especulativa de valorização.
Agora mais confiantes em assumir riscos de alavancagem, pois contam que os
bancos centrais voltarão a salvá-los. Em consequência, até 2019, os mercados de
títulos da dívida privada, da dívida e as bolsas de ações triplicaram de valor.
Nos EUA, por
exemplo, a dívida pública, cujo estoque, em 2008, era de oito trilhões de
dólares, elevou-se para 22 trilhões em 2019; os títulos da dívida privada
cresceram ainda mais, chegando a mais de 100 trilhões de dólares; o índice Dow
Jones da bolsa de valores de Nova York, que estava a nove mil pontos, em 2008,
oscila hoje entre 26 mil e 27 mil pontos.
É certo que
sem essa “salvação massiva” ocorreria uma cadeia de inadimplência e de
desvalorização de ativos em grande proporção com as nefastas consequências
sabidas. Mas o Ocidente passou a sofrer uma duradoura estagnação, com baixas
taxas de investimento e de produtividade e instabilidade. Aos povos, trouxe
pobreza e instabilidade e aos governos um pesado endividamento, a perda de
legitimidade e retrocessos políticos.
As
consequências dos quantitative easy e do
entesouramento
A “salvação”
de capitais na crise de 2008 e a posterior duplicação de seu valor, em meio a
crise, tem suas raízes na política adotada pelos principais bancos centrais do
Ocidente para enfrentar a crise. Essa política propiciou aos capitais
financeiros (inclusive a parte dele detida pelas empresas produtivas) que
continuassem a existir sob a forma segura dos títulos governamentais, livres de
riscos. Essa política, alavancando sua capacidade de assumir novos riscos,
criou uma nova base para expansão da acumulação de capitais. Porém, a demanda
de investimento em capitais produtivos não ocorreu e as taxas de investimento
no Ocidente continuaram baixas – em especial, aquelas da União Europeia e do
Japão.
Outra
consequência importante e duradoura do quantitative easy foi, como
vimos, a mudança no papel dos bancos centrais. A aquisição de títulos e a
assunção de sua gestão, transformou essas agências estatais nos maiores sócios
do capital, donos que são de uma importante fatia de títulos em mercado. O
banco central do Japão foi mais além, adquiriu também um montante tão elevado de ações na Bolsa de Tóquio que,
ao final de 2019, será o maior investidor desse mercado. Não bastando, as
reservas bancários remuneradas nos banco centrais continuam se elevando.
O importante
também é que esses ativos de posse dos bancos centrais, assim como as reservas
bancárias ociosas, não podem, atualmente, ser devolvidas ao mercado, pois sua
venda ou a devolução de reservas aos bancos comerciais, mesmo que parcelada,
ocasionará uma queda nos preços dos ativos privados com efeitos desastrosos e
os bancos não suportarão carregar suas próprias reservas fora de seus bancos
centrais. Até onde possa se prever, os bancos centrais do Ocidente continuarão
sócios de seus mercados e de seus bancos comerciais. Na verdade, são, para
todos os efeitos, os garantidores dos mercados contra a bancarrota. Uma
situação deveras extraordinária. Enquanto também passa a servir de refúgio a um
capital em fuga.
Dessa forma,
ao evitar as consequência terríveis da crise de 2008, o quantitative easy
não afastou a continuidade dela. Mesmo a redução da incerteza ocorrida nos EUA
até 2017, já se inverteu, enquanto a incerteza continua a ameaçar o resto do
Ocidente. Neste momento, a incerteza voltou a crescer com a ameaça de novo
recessão nos EUA. O BCE acelerou suas aquisições novamente e o FED retomou seu
programa de aquisição. Uma nova blindagem contra a destruição de capitais
excedente voltou a ser construída. Optaram por administrar, outra vez, o mesmo
veneno.
O importante
a destacar é que, apesar de ter evitado catástrofes, os QE não revogaram os
efeitos de uma crise capitalista. Seguindo o pensamento de Marx, sem uma
suficiente destruição do capital, não haverá uma nova fase de expansão. A
expansão de capitais financeiros causada pelo QE dificultará mais a remissão da
crise.
Há hoje um
empate no sistema capitalista ocidental. Enquanto há uma pressão sistêmica para
a destruição de capitais ineficientes, o que, como vimos, é a própria razão da
crise, ao mesmo tempo, essa pressão vem sendo contra-arrestada pela ação dos
governos, tendo como instrumento principal seus bancos centrais e suas dívidas
públicas, o que “protege” o capitalismo dele mesmo, e, ao mesmo tempo, cuidam
de evitar uma destruição de capitais com efeitos disruptivos sobre seus países
povos e sua própria estabilidade.
É nesse
contexto que se entende mais profundamente o fenômeno do entesouramento por
meio de títulos da dívida pública, onde os juros negativos revelam o custo
dessa opção. Ele é mais um fenômeno que integra as grandes mudanças que vêm
ocorrendo no sistema capitalista ocidental, mas que, inevitavelmente,
repercutirá em todo o sistema internacional.
Assim, o
estranho mundo do juro zero, que intitula esse artigo, é somente a ponta de um
extraordinário iceberg.
Notas
(1) Lecio Morais é economista e mestre em Ciência Política.
(1) Lecio Morais é economista e mestre em Ciência Política.
(2) Notem que a taxa nominal de juro se
diferencia de sua taxa real. A taxa real de juro é a taxa nominal descontada a
taxa de inflação no período. A diferença é que a taxa real negativa não
acontece por escolha do investidor, decorrendo de circunstâncias futuras, fora
de seu controle, mesmo que o risco de perda seja pressentido. A aplicação com
taxa nominal negativa, ao contrário, é a opção do investidor.
(3). Os bancos referidos são: o Federal
Reserve (FED), o Banco Central Europeu (BCE), o Banco da Inglaterra (BoE) e o
Banco do Japão (BoJ).
(4). Incluindo a carteira de títulos
privados adquiridos e o depósito de reservas bancárias. Em Trading Economics: https://tradingeconomics.com/
5. Ver Joseph Stiglitz: Economia:
“Porque perdura o risco de colapso”. Carta Maior, 16/02/2016: http://bit.ly/36kDb1c
6. Ver J. Stiglitz: Estará realmente de volta o capitalismo que
beneficia todas as partes interessadas? Project-syndicate, ago. 1919: http://bit.ly/2PsO37r
Acesse o canal ‘Luciano Siqueira opina’, no YouTube https://bit.ly/2NmRg71 Leia mais sobre temas da atualidade: https://bit.ly/2Jl5xwF
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