17 janeiro 2020

Estética nazista


Documentário ajuda a entender os significados do discurso de Roberto Alvim
Jornal GGN

Veiculado na noite de quinta-feira (16), o vídeo com o anúncio do Prêmio Nacional das Artes, feito pelo secretário da Cultura, Roberto Alvim, chamou a atenção por usar trechos de um discurso de Joseph Goebbels, ministro da Propaganda da Alemanha nazista. O HuffPost apurou que o presidente Jair Bolsonaro decidiu demitir Alvim após a polêmica.
No vídeo, Alvim diz: “A arte brasileira da próxima década será heróica e nacional. Será dotada de grande capacidade de envolvimento emocional e será igualmente imperativa, posto que profundamente vinculada às aspirações urgentes de nosso povo, ou então não será nada”.
Veja aqui o trecho do discurso de Goebbels documentado no livro Joseph Goebbels: Uma biografia, do historiador alemão Peter Longerich.
“A ARTE ALEMÃ DA PRÓXIMA DÉCADA SERÁ HERÓICA, SERÁ FERREAMENTE ROMÂNTICA, SERÁ OBJETIVA E LIVRE DE SENTIMENTALISMO, SERÁ NACIONAL COM GRANDE PÁTHOS E IGUALMENTE IMPERATIVA E VINCULANTE, OU ENTÃO NÃO SERÁ NADA”.
Mas o que Alvim quer dizer quando fala de arte “heróica”, “romântica” e “nacional”? E por que ele se apropria da fala de Goebbels e usa o prelúdio de Lohengrin, ópera do compositor alemão Richard Wagner (1813-1883) como fundo musical para seu anúncio?
Todas essa questões podem ser compreendidas ao assistir a um filme: o documentário Arquitetura da Destruição(1989), do sueco Peter Cohen. Filho de um judeu alemão que fugiu de Berlim em 1938, em seu filme/tese, Cohen apresenta o nazismo como uma ideologia estética.
Arquitetura da Destruição mostra o importante papel da arte nos ideais de Adolf Hitler, um pintor frustrado que sonhava em ser arquiteto, que serviram de base para uma empreitada que visava “embelezar” o mundo, destruindo o que ele considerava como arte “degenerada”.
Um ideal de homogeneização estética de tamanha importância para os nazistas, que extrapolou as fronteiras da arte, sendo aplicado nas ciências por meio da eugenia — estudo pseudocientífico que visava a selecionar qualidades humanas baseadas em genética e raça — e no “desenvolvimento” social que serviu de desculpa para o que Hitler chamava de “solução final”. Ou seja, o assassinato de milhões de judeus, povo que ele viu da mesma forma que via a arte moderna, como algo a ser descartado em favor da beleza e superioridade da arte clássica.
Hitler era obcecado pela arte greco-romana que ressaltava a beleza heróica de de corpos perfeitos e desprezava movimentos artísticos modernos como o impressionismo, o cubismo, surrealismo, entre outros.
Arquitetura da Destruição disseca de forma didática (no bom sentido) essa narrativa “heróica” – como Alvim ressaltou no vídeo – baseada na arte clássica e no nacionalismo tão presente nas obras de Wagner (compositor que Hitler amava). Tudo isso serviu de base para conformar o discurso nazista de “purificação”da sociedade.
Sucesso cult no início da década de 1990, o documentário ganhou o Prêmio do Júri na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo em 1992. A própria mostra lançou o filme em VHS e DVD. Porém, infelizmente, o filme não consta no catálogo de nenhuma plataforma de streaming no Brasil, mas pode ser visto no YouTube: https://bit.ly/2TwVsVi
[Ilustração: Charge de Gilmar]
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