18 março 2020

Mais do que incompetência


Cuidado! O piloto quer sumir
Luciano Siqueira

A pandemia do coronavírus é real. Tanto quanto é verdade que a Terra não é plana.

Mas o presidente da República Federativa do Brasil, ex-capitão do Exército e ex-deputado federal por quase trinta anos, Jair Bolsonaro pensa diferente.

Mesmo ontem à noite, quando anunciou mensagem ao Congresso Nacional solicitando aprovação para a decretação do estado de calamidade pública, volto a dizer que há muito exagero quanto às implicações e consequências do coronavírus.

Drásticas consequências para a saúde pública, para a economia global e nacional e para as condições de sobrevivência do nosso povo mais pobre? Nada, é como se fosse a gravidez de uma mulher, diz ele, que “aos nove meses de gestação tem mesmo que trazer suas consequências” (sic).

Enquanto chefes de Estado do mundo inteiro tomam o comando das ações em seus países; e os presidentes sul-americanos nossos vizinhos realizam teleconferência para ajustarem ações comuns, Jair Bolsonaro segue dizendo bobagens sobre problema tão sério e agindo como criança indisciplinada quanto às recomendações médicas, ele que até ontem era um caso suspeito de haver contraído o vírus.

Mais uma vez, como tem acontecido nesses quase 15 meses de governo, diante de problemas mais complexos o presidente se esquiva, deixa a nau sob o comando de auxiliares e se a falar inconveniências como que fugindo do que lhe cabe.

Até ontem à noite sequer havia se reunido uma só vez com o grupo de ministros mais diretamente encarregados do assunto. Somente hoje, com evidente atraso, toma a iniciativa de constituir um comitê de crise em âmbito ministerial.

(Acresce que as medidas anunciadas até agora pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, são evidentemente insuficientes para um enfrentamento minimamente consistente das repercussões econômicas e sociais da pandemia em nosso país).

Incompetência, sim. E uma tremenda irresponsabilidade.

Tem razão o vizinho que encontrei aqui na padaria da esquina: “o piloto quer fugir“.

Nessas circunstâncias, amadurece um caldo de cultura alimentado por um misto de decepção (de parcelas expressivas dos eleitores do presidente) e revolta (da maioria da população).

O panelaço verificado ontem, que redes nacionais de televisão mostraram ao final da noite, em vários bairros do Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Recife e outras cidades foi apenas um ensaio do que poderá acontecer na noite de hoje.

Por mais que analistas credenciados se esforcem, ainda não se tem o tamanho da fatura econômica e social que nos aguarda.

Mas já são evidentes as implicações políticas.

Em situação de tamanha crise, não é bom para o Brasil ter um presidente da República politicamente isolado, reconhecidamente inepto e incapaz de compreender a dimensão do cargo que ocupa.

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