Sem política soberana Bolsonaro afunda o
Brasil, diz Ildo Sauer
“Só se pensa em desinvestimento e em
queima de ativos. Não há uma política que leve em conta a geopolítica do
petróleo”, denunciou o especialista
Portal Vermelho
O professor Ildo
Sauer, titular do Instituto de Energia da USP e ex-diretor da Petrobras,
avaliou, em entrevista ao jornal Hora do Povo (HP), que a crise internacional,
agravada pela epidemia do coronavírus e pela guerra de preços do petróleo,
atinge o Brasil numa condição de total vulnerabilidade já que o país não dispõe
de nenhum projeto de desenvolvimento e ou mecanismo soberano de proteção de sua
economia.
“O Brasil já estava vivendo um processo de estagnação, de queda
de produção e desmonte de suas estatais, provocada pela insistência dos últimos
governos e, particularmente do atual, em aplicar as estúpidas políticas
neoliberais”, avaliou.
Não há plano de desenvolvimento
“Mesmo em relação à política de petróleo, o país está sem um
plano de desenvolvimento para o setor. Só se pensa em desinvestimento e em
queima de ativos. Não há uma política que leve em conta a geopolítica do
petróleo”, denunciou o especialista.
“Isso deixa o Brasil totalmente
submetido às oscilações e aos interesses de fora. Perde-se a capacidade de
planejamento e de investimento num projeto de retomada da economia. Não se tem
uma política nacional para o petróleo. A única coisa que se faz é entregar
ativos que pertencem à Petrobras para o capital estrangeiro”, prosseguiu
professor.
“A desaceleração da economia mundial, que já vinha sendo
sentida, agravou-se com o surgimento do coronavírus. Houve a necessidade de uma
contração da produção de petróleo, de cerca de 1,7 milhão de barris por dia,
por conta desta retração na economia. A China, grande importador de petróleo,
viveu intensamente as consequências da epidemia e foi obrigada a reduzir a atividade
econômica e, consequentemente, o consumo de petróleo.
Economia mundial combalida
A economia mundial que já vinha combalida. Com a desaceleração
da “oficina do mundo”, entrou em parafuso. As bolsas do mundo inteiro afundaram
e a bolsa brasileira derreteu.
“Já estava marcada a reunião da
Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), com a participação da
Rússia, para o enfrentamento da crise do coronavírus. A organização trabalhava
para que houvesse uma redução planejada, que seria distribuída entre os países
membros e a Rússia, mas não houve acordo”, avaliou Ildo Sauer.
“A Arábia Saudita e a Rússia não se entenderam e iniciaram uma
guerra de preços. A Arábia Saudita cortou entre 4 e 6 dólares o preço de seus
barris para entrega em abril destinados à Ásia e em 7 dólares os destinados aos
Estados Unidos. Além de cortar o preço, a Arábia Saudita anunciou planos de
aumentar a produção acima de 10 milhões de barris por dia (bpd) em abril”,
acrescentou.
O argumento da Rússia para não
aceitar o acordo é de que essa redução só vai beneficiar os produtores
americanos que não reduzirão sua produção de shail oil (óleo de xisto). Os
preços do barril já caíram 31%, atingindo mínimas que não eram registradas
desde fevereiro de 2016. O barril do tipo Brent chegou a atingir US$ 31,02 ,
enquanto o WTI chegou a bater em US$ 27,34.
Brasil vulnerável
Para o professor Ildo Sauer, “o
Brasil está totalmente à mercê da volatilidade do mercado internacional, que,
nesse setor, é dominado pelos interesses das potências e das grandes
multinacionais petroleiras”.
As grandes petroleiras, incluindo a Petrobras, tiveram perdas
enormes com a queda dos preços do barril e contribuíram para a derrubada nas
bolsas, inclusive no Brasil, onde as ações da estatal tiveram uma queda de 25%
só nesta segunda-feira (9).
Na opinião de Ildo Sauer, a Arábia
Saudita quer sinalizar ao mundo, como fez em 2015, que é ela e a OPEP –
hegemonizada pelo país árabe – quem decide o preço internacional do produto. É
o país que tem uma grande reserva e o menor custo de produção e, por isso,
considera ter força suficiente para impor aos outros exportadores a sua
política de preços.
A Rússia, outro grande exportador, por sua vez, explicou Ildo,
constituiu um fundo de reserva de cerca de US$ 170 bilhões para momentos de
crise e decidiu manter a produção, mesmo com elevação da produção e a redução
dos preços da Arábia Saudita.
“Não se sabe até onde vai esta
medição de força”, avalia. O fato, diz Ildo Sauer, é que países como o Brasil,
que não têm uma estratégia de desenvolvimento e não têm mecanismos de
compensação de preços para enfrentar momentos como este, tendem a perder muito.
Protofascitas controlam o governo
“Se o Brasil tivesse uma política soberana, poderia, num momento
grave como este, reduzir controladamente a produção de petróleo”, avaliou o
ex-diretor da Petrobras. “Mas”, segundo ele, “a traição dos últimos governos ao
projeto nacional de desenvolvimento e a consequente chegada ao poder de forças
protofascistas e entreguistas como essas comandadas por Bolsonaro, nos deixa
sem alternativas num momento como este”.
“Com o sistema de partilha de
produção adotado nos últimos anos, assim como o sistema de concessão, que ainda
persiste em alguns postos, não há como se tomar decisões soberanas sobre a
produção de petróleo”, acrescentou. “O país fica de mãos atadas”, avalia Ildo.
“Além disso”, afirmou Ildo Sauer, “a forma como foram feitas as
distribuições de transferências e royalties para estados e municípios propicia
uma pressão imensa para que haja cada vez mais produção, independente da
situação”.
Contrato de serviço
“Se fosse adotado pelo Brasil o sistema de contrato de serviço,
onde sua estatal seria a prestadora dos serviços contratada pelo governo, todo
o excedente obtido com a venda do petróleo poderia ser aplicado num fundo
nacional que teria como função investir em Educação Pública, Saúde Pública,
Ciência e Tecnologia, reforma urbana, conversão energética, etc”, explicou.
“Haveria possibilidade de decisões soberanas sobre o ritmo de produção e, ao
mesmo tempo, os ganhos seriam destinados ao Tesouro e usados em benefício de
toda a população”, defendeu Sauer.
“O abandono pelos governos Lula e
Dilma ao projeto de desenvolvimento nacional, a sua substituição por Michel
Temer e, depois, a chegada ao poder desse grupo de protofascistas, que mantém e
aprofunda a desastrosa política econômica neoliberal, que já vinha corroendo a
economia do país há décadas, está deixando o Brasil numa condição altamente
vulnerável”, observou Sauer.
“A presença desse grupo protofascista no governo e as aberrações
defendidas pelo chefe do Executivo, agravam ainda mais a instabilidade vivida
pelo país. A insistência em manter essa política desastrosa agravará a crise. A
insanidade do atual governo, sua índole autoritária e o agravamento da crise
está colocando em sério risco a democracia brasileira”, advertiu Ildo Sauer. (Fonte:
Hora do Povo)
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