21 maio 2020

Retorno a que passado?


Desconstruindo Hamilton

Thiago Modenesi

O recente artigo do vice-presidente Hamilton Mourão no jornal O Estado de São Paulo, publicado em 14 de maio, acendeu o sinal de alerta na imprensa, no Judiciário, no Legislativo e na sociedade brasileira em geral. O texto revela uma espécie de Bolsonaro mais articulado com as palavras, porém a essência é a mesma do chefe do Poder Executivo: critica a todos os poderes, governadores, prefeitos e o que mais for possível, mas autocrítica do poder executivo quase zero…
O tom ameaçador do General lembra os piores anos do Brasil, do triste papel que os militares tiveram no fim do Governo Vargas que acabou culminando com o suicídio daquele presidente e da Ditadura Militar brasileira, com seus 21 anos de obscurantismo.
O vice-presidente pede respeito ao Executivo, mas este executivo precisa se dar ao respeito. É curioso o comportamento do Chefe-Maior do país, que ataca abertamente a todos os governadores e prefeitos e pede respeito dos mesmos, cria um clima belicoso, mas cobra a submissão de todos a ele. Isso não é um presidente, é um projeto de rei, um protótipo de déspota que não respeita os freios e contrapesos de uma república, esses sim na melhor tradição da constituição norte-americana de 1787 que norteia praticamente o conjunto das constituições das Américas.
O que impede a saída da quarentena, a flexibilização e a retomada da economia é Jair Bolsonaro. Se ele tivesse exercido o papel que lhe cabe, se tivesse apontado há 2 meses o caminho do isolamento social de grande monta, nossos números já teriam caído, a curva teria sido achatada, mas o que ocorreu foi o oposto. O presidente criou um clima de boxe no país, agravou a polarização, brigou com praticamente todos os seus ministros, com o General Santa Cruz, Henrique Mandetta, Nelson Teitch, Sérgio Moro, este último, ícone de seu governo. O inimigo da economia é a pandemia, não a quarentena, caminhamos para as cabeças entre os países com mais casos do mundo, esse sangue está nas mãos do presidente, por todo seu autoritarismo e belicismo que impedem a unidade nacional para salvar vidas.
Quanto a John Jay e James Madison que, junto com Alexander Hamilton, operaram a ampliação da força do poder executivo, mas não o fizeram para sufocar o Legislativo e o Judiciário e sim para garantir o maior equilíbrio entre os 3 poderes, como já propalavam os clássicos de Montesquieu, Locke e outros.
Os chamados Founding Fathers norte-americanos positivaram na sua Constituição a defesa de uma divisão funcional dos poderes, inclusive com os 3 primeiros artigos da carta indicando as responsabilidades de Legislativo, Executivo e Judiciário. Estes lutaram pela defesa da Constituição e a real articulação de poderes, muito distante do que descreve o general em seu artigo.
O que o vice-presidente defende, uma espécie de “coordenação de poderes”, lembra mais a Carta Constitucional de 1937, de inspiração fascista, baseada na Constituição polonesa e há muito sepultada e superada. Esperar que um presidente que não coordena nem seu governo pudesse coordenar os demais poderes é surreal, além de ferir os princípios republicanos da tripartição de poderes e de freios e contrapesos na sua essência.  

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