BNDES executa só 29% do pacote anticrise
Valor Econômico
Essa
matéria, que transcrevo do Valor de hoje, é emblemática da dificuldade do
governo federal viabilizar, de fato, o socorro aos diversos segmentos da
economia afetados pela pandemia. Não apenas por obstáculos burocráticos, mas
por uma espécie de incompetência e de desconhecimento da realidade
institucional e empresarial.
O pacote do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para combater os efeitos da covid-19
na economia teve execução de 29% do autorizado, mostra documento enviado ao Congresso.
Dos R$ 87,1 bilhões previstos, foram liberados R$ 25 bilhões em empréstimos,
doações e suspensão de pagamentos. O único programa que atingiu a meta foi o de
empréstimos para capital de giro de micro, pequenas e médias empresas. Lançada
em março, a linha liberou inclusive mais do que o previsto inicialmente,
atingiu R$ 5,3 bilhões e já não permite mais contratações. Ela será reaberta
com mais R$ 5 bilhões. Entre os desempenhos mais fracos estão os empréstimos
para hospitais e laboratórios médicos se equiparem para a covid-19. Foram
apenas nove clientes, atingindo só 13% dos R$ 2 bilhões colocados à disposição.
O banco diz que houve baixa demanda. O superintendente da Federação Brasileira
de Hospitais, Luiz Fernando Silva, explica que isso ocorreu porque a linha era
para investimentos, o que tenderia a gerar ociosidade depois. “Não teria lógica
pegar esse dinheiro. Depois que passar a pandemia os hospitais ficariam
estocados e com uma dívida”, diz. Silva afirma que a necessidade do setor, que
enfrenta dificuldades, é por linhas de capital de giro e que a oferta de
recursos para isso é insuficiente. O BNDES informa que lançou uma nova linha de
R$ 2 bilhões com esse objetivo, embora esse programa seja para grandes empresas
do setor. As menores estão sendo direcionadas para o Programa Emergencial de
Acesso ao Crédito (PEAC).
No documento consta também a campanha
(“Salvando Vidas”), em que o banco dobra a doação de empresas para compra de
equipamentos para hospitais públicos. Divulgada em abril com “potencial para se
tornar a maior ação desse tipo na história do país”, até agora alcançou R$ 23
milhões de R$ 100 milhões autorizados.
A pior execução é o Programa
Emergencial de Suporte ao Emprego (Pese), considerado um fiasco no próprio
governo. A linha ofertou R$ 40 bilhões para empresas pagarem a folha de
salários, com compromisso de manter os empregos por igual período, mas entregou
apenas um décimo disso. O BNDES afirma que entraves foram percebidos (como o
limite de faturamento baixo e exigência de financiar toda a folha) e estão
sendo ajustados no Congresso para o “Pese 2”. Fontes do banco dizem ainda que
muitas empresas recorreram a outra proposta do governo, que permitiu corte de
salários e jornada, em vez de se endividarem para pagar a folha.
Outra medida que não atingiu todo seu
potencial, segundo o documento, foi o “stand still” (suspensão dos pagamentos)
dos empréstimos para empresas por seis meses (o valor não pago é recalculado
com juros e acrescido às parcelas). O banco autorizou que R$ 29,5 bilhões
fossem suspensos, mas só 39% dos clientes usaram isso. A instituição diz que o
volume previsto considerou a hipótese extrema de todos os clientes aderirem a
esse adiamento, mas essa é uma decisão individual.
O apoio ao setor aéreo, com R$ 6
bilhões disponíveis, até agora não saiu. O banco informou que continua
negociando emprestar com instrumentos de mercado para as companhias do setor,
que é um dos mais afetados pela crise, mas evitou entrar em detalhes. Para o
presidente da Associação dos Funcionários do BNDES, Arthur Koblitz, o nível de
execução reflete uma combinação de problemas. Entre eles, a elevação recente da
TLP, a taxa de referência de grande parte das operações, o prêmio de risco
elevado dos bancos repassadores e o desinteresse deles por algumas operações.
“O ideal era modificar a TLP e trabalhar mais articulado com bancos públicos
para conseguir prêmios de risco menores”, disse. O BNDES, contudo, avalia que a
questão principal é a oferta de recursos e não os custos da TLP.
Gerente-executivo de Economia da Confederação Nacional da Indústria (CNI),
Renato da Fonseca, afirma que os programas de financiamento são onde as
políticas governamentais têm sido menos eficazes. O Pese, ressalta, teve muitas
travas, mas há expectativas que as mudanças façam o dinheiro começar a sair,
como no Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte
(Pronampe). “Mas há dúvidas se o PEAC terá o mesmo sucesso do Pronampe, já que
as garantias do governo são menores”. Relator da comissão da covid-19, o
deputado Francisco Junior (PSD-GO) diz que os empréstimos são uma das
principais batalhas do grupo nas audiências com a equipe econômica. “Eles dão
explicações técnicas, dizem que estão fazendo o possível e responsabilizam os
bancos”, disse. “A informação é de que está melhorando, mas ainda não estamos
satisfeitos.”
Nem
clarins, nem tambores. Muita luta, sim https://bit.ly/2CwMpND
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