22 dezembro 2020

Crônica do início da manhã

Palavras muito mais do que palavras

Luciano Siqueira

 

Vi de relance uma declaração em vídeo do poeta Manoel de Barros:

- As palavras me fascinam, diz.

Palavras fascinam a todos nós - pela sonoridade, pelo sentido.

Mas é claro que depende de como são pronunciadas e em que tom. Uma mesma frase pode soar carinhosa ou autoritária.

Poetas guardam com as palavras uma relação de amor e ódio.

Basta ler atentamente os versos de um João Cabral, Vinícius, Drummond ou – para citar a poeta pernambucana que ganhou audiência nacional com o Prêmio Jaboti – Cida Pedrosa para muitas vezes sentir que as palavras ali contidas brotaram da sensibilidade, da inquietação, da busca.

Dizem que Caymmi demorava meses a fio para concluir a letra de uma canção, aguardando que a palavra adequada lhe chegasse.

O mesmo ocorre com romancistas e contistas. O moçambicano Mia Couto nos dá a impressão de que sua relação com o idioma é um caso de imorredoura paixão, ora alimentada com leveza, ora com certa rispidez. Navega entre o real e o imaginário com fascinante habilidade. As palavras fluem com sedutora intimidade.

Mas não perdoam quando maltratadas.

Conheço pelo menos uns três escribas que se dão ao trabalho de vagar por dicionários em busca de expressões pouco usadas, na tentativa de demonstrar erudição que não possuem.

A um deles eu disse certa vez que sua atitude era digna de um Marquês do Pombal, que a seu tempo foi reconhecido por ressuscitar termos ultrapassados.

Não combina.

Um personagem humorístico de Chico Anízio costumava encerrar seus discursos afirmando que “palavras são palavras, não mais do que palavras” ...

Porém tem razão o poeta Manoel de Barros: a palavra é tudo.

Veja uma dica de leitura: Raimundo Carrero https://bit.ly/3pCHkXY

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