21 dezembro 2020

HQ, gênero vivo

 

Histórias em Quadrinhos e educação caminham juntas

Thiago Modenesi, portal Vermelho

 

Os quadrinhos hoje estão não moda, passaram a ser protagonistas da cultura pop dos nossos tempos, estão nas adaptações feitas para os cinemas, desenhos animados, camisetas vendidas em grandes lojas, pijamas, chinelos, cadernos, para onde olhamos há referências as histórias em quadrinhos.

Está forma de arte e entretenimento já viveu várias fases, é um fenômeno mundial que carrega as características dos mais variados povos e nações, isso aparece claramente seja nos mangás japoneses ou nos super-heróis estadunideneses, só para citar dois exemplos, são representações de sua cultura, de sua forma de vida.

Uma das muitas possibilidades do surgimento dessa que é chamada de nona arte foi em 1895 com o Yellow Kid, uma criação do estadunidense Richard Outcault. Ali aparecem quase a totalidade dos elementos que definem uma HQ: temos pela primeira vez a presença de um personagem principal fixo, de algo parecido com o que viriam a ser os balões de fala e de uma história mais consistente. Tal HQ foi um fenômeno em sua época, disputada por vários jornais do país, mas possui antepassados, outras publicações que podem sim ser caracterizadas como quadrinhos, entre eles a de um ítalo-brasileiro.

Angelo Agostini e mais alguns europeus já desenhavam e publicavam obras que uniam desenhos e textos antes de Outcault, esses não estavam, porém, ainda em balões e nem tão pouco possuíam personagens fixos, eram uma das raízes da árvore genealógica dos quadrinhos.

No Brasil eles aparecem no século XIX, tem destaque na luta pelo fim da escravidão e contra a monarquia, figuram em dezenas de publicações de várias províncias da época. A escravidão e o império acabam, mas os quadrinhos se fortalecem, ganham espaço em jornais, passam a ter suplementos exclusivos em alguns periódicos, surge a publicação que viraria sinônimo de HQ no Brasil: o Gibi, uma alusão a um menino negro que sempre figurava na capa da revista.

A relação das histórias em quadrinhos com a educação se fez presente já no Império, com as histórias de Angelo Agostini educando os que não eram alfabetizados através de sua arte, contra a escravidão. Na sequência temos a mesma publicação criada por Agostini fazendo a defesa da República e dos novos hábitos e costumes que esta trazia, educando nesta perspectiva.

Os exemplos de publicações de quadrinhos com fins educacionais são incontáveis, seja nas campanhas publicitárias de governos sobre os mais diversos temas, várias que já tiveram como protagonistas os personagens de Mauricio de Souza e de Ziraldo, da campanha pelo alistamento de jovens para servir as Forças Armadas ou para soldados em atividade que recebiam suas instruções na forma de revistas em quadrinhos na Segunda Guerra, essas criadas por Will Eisner e outros.

Mais recentemente, um forte marco da utilização das HQs com fins educacionais se deu com a criação dos editais governamentais de apoio à publicação no Brasil, esses vinham gerando um mercado novo, estimulando centenas de adaptações literárias de obras clássicas para este formato, muitos inclusive dando um novo olhar, um enfoque mais moderno a consagradas obras de arte, atualizando-as ao nosso tempo. Tal iniciativa, assim como outras na área da cultura, foram prejudicadas profundamente na atual gestão federal que combate a cultura e seus representantes como se fossem inimigos.

As escolas receberam aos milhares estas publicações, não há biblioteca que não as tenha. A questão é como estimular os professores a criarem planejamentos pedagógicos que incluam histórias em quadrinhos, que essas não sejam utilizadas apenas de maneira pontual, para tornar mais lúdica uma aula específica, mas sim como parte de uma estratégia contínua de educação.

Há várias experiências relatadas, trabalhos produzidos e publicados que ajudam nesse caminho, superam os preconceitos que ainda aparecem quando escutamos que os quadrinhos inibem o gosto pela leitura de livros, que gibis imbecilizam as crianças, ou aquela que atribuem aos quadrinhos, filme e outras formas de cultura pop a responsabilidade por atos violentos que algumas vezes acontecem com a juventude.

Tudo falsa polêmica, hoje as histórias em quadrinhos têm seu posto consolidado, é arte. Pode ser usada tranquilamente para educar, para se divertir, nos faz rir, chorar e refletir. Não perdem em nada para as demais artes, ao contrário, são as únicas que articulam no mesmo espaço o texto e a imagem, que transmitem a sensação de movimento, que nos fazem ir além do que ali figura. Vale a pena conferir uma e ampliar os seus horizontes.

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