Ônibus na pandemia
Melka*
Desde o início da pandemia em 2020,
parei de usar o transporte público, o ônibus era quem me levava ao trabalho
todos os dias. Mas devido a questão de segurança, comecei a usar o carro, que
preferia não usar, por várias questões.
Só que vez ou outra, preciso usar
ônibus e eu sinto tanta coisa, é como eu costumo dizer, se quiser conhecer o
povo, tem que andar de ônibus (ou metrô). É lá que nosso povo se encontra e a
vida acontece, já pensei até em escrever um livro de crônicas com histórias
ouvidas nos ônibus, se tem contato mais próximo, desconheço.
Só que estamos na pandemia e esse é o
problema, o contato que os transportes públicos promove. Tá errado. Nessa
semana, soube que um irmão de um colega de trabalho morreu com covid, foi três
dias entre internar e evoluir pra morte, ele era motorista de ônibus, e foi
quando me perguntei "quantos motoristas de ônibus morreram nessa
pandemia?" Eu não sei. Mas o fato é que se eu que sou enfermeira estou
exposta na enfermaria de covid do hospital, nos ônibus eles estão tão expostos
quanto eu, na verdade estão mais.
Os motoristas de ônibus deveriam estar
na primeira fase de vacinação e eu me atrevo a defender, antes mesmo que
professores e professoras, porque se as aulas pararam e é verdade que existe
grande pressão para o retorno, os motoristas nunca pararam, estão na linha de
frente, transportando quem sabe pelo menos algumas pessoas contaminadas, todos
os dias. É muito triste.
No outro dia, fui de ônibus pra o
trabalho e o que eu senti foi: revolta pelo preço da passagem, indignação pela
dupla função do motorista e pela falta de disponibilidade de sequer um
burrifador de álcool, vontade de levantar que nem uma doida e começar a
falar com as pessoas sobre a pandemia e o governo Bolsonaro. Eu me senti muito
impotente.
A passagem, meus amigos e amigas, meus
camaradas, está muito cara, nosso povo está sem trabalho e renda, e quem tem
alguma renda ainda sofre com o alto custo da mobilidade, os motoristas dirigem
passando troco e liberando catraca, as pessoas estão em contato em cada e
qualquer viagem de maior ou menor duração, o vírus está circulando nos
transportes públicos. É o genocídio do nosso povo. Estamos nos matando. E eu
não isento aqui nenhum governante sobre sua responsabilidade.
É de sentir vontade, antes de qualquer
um dos sentimentos que tive, de chorar desesperadamente.
*Melka Pinto, ex-presidente da União dois Estudantes de
Pernambuco-UEP, é enfermeira na rede pública.
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Veja: Eu e você nas redes https://bit.ly/3mLkOvf
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