Os bilhões dos milhões de vacinas
A CPI está em tempo de se voltar
para o lado do dinheiro na investigação
Janio de Freitas, Folha de S. Paulo
O boicote à vacinação, pela sabotagem à compra de vacinas, é uma aberração que justifica o interesse nela concentrado pela CPI —que vai bem, obrigada. Mas daí deriva a ausência de questionamento, a todos os depoentes, sobre um tema que pode estar na raiz de parte dos transtornos enfim investigados.
As compras de vacinas, ou de ingredientes, movimentam quantias montanhosas. A guerra comercial entre as vacinas, pela conquista da opinião pública e pressão sobre os governos, extravasa em acusações de risco feitas e desfeitas em torno de bilhões. Nem foi outro o motivo da apressada recomendação (se foi só isso) dos Estados Unidos para aqui não se comprar a Sputnik V, que, sobre ser russa, tem preço baixo. A velha proteção comercial americana não se distrai.
A compra que o ministro Marcelo Queiroga comemorou
nos últimos dias é de 100 milhões de doses da Pfizer. Em breve passagem de sua
entrevista à Veja, Fabio Wajngarten referiu-se ao preço da Pfizer, com a qual
negociava: os diretores da farmacêutica “toparam até mesmo reduzir o preço da
unidade, que ficaria abaixo dos US$ 10”. Abaixado também o dólar para uma
estimativa, só essa compra anda pelos R$ 5 bilhões.
Negócio com tamanho custo para o dinheiro público
foi conduzido junto à Pfizer, no entanto, pelo então secretário de Comunicação
da Presidência, não pelo ministro da Saúde com sua assessoria técnica, nem pelo
ministro da Economia e seus técnicos. Por que o alheio Wajngarten estava “autorizado pelo presidente” para a
negociação? Foi acompanhado apenas, em uma reunião com a
Pfizer, pelos não menos inabilitados para representar o governo, e o próprio
país, Filipe Martins, assessor no Planalto, e o vereador Carlos Bolsonaro.
A CPI está em tempo de se voltar também para o
lado do dinheiro na investigação. Há perguntas indispensáveis: como negócios
comerciais, as transações com as indústrias das vacinas têm intermediação
remunerada? Comissão? De quanto e paga por que lado? Nas compras à Pfizer, há
intermediação empresarial remunerada? Em caso positivo, de que empresa(s)? E
alguma outra
modalidade de comissão, destinada a quem e de que
forma?
São informações relevantes em qualquer sentido,
inclusive para exteriorizar a importância da tarefa incumbida à CPI.
Wajngarten foi exonerado em circunstâncias algo
estranhas, no mesmo março em que, dia 8, o governo aceitou o contrato proposto
pela Pfizer e, dia 19, assinou-o. No controle da propaganda do governo,
Wajngarten foi acusado de ganho indireto, por triangulação de empresas, com parte das comissões por
veiculação de campanhas. Negou, claro. Continuou polêmico, grosseiramente
presunçoso e ambicioso.
De repente, ofereceu-se à entrevista de acusações ao general Eduardo Pazuello e ao Ministério da Saúde, na Veja, cuidando de proteger Bolsonaro & família. A interpretação de que agiu por vingança consolidou-se. E fez esperar que Wajngarten na CPI seria fulminante.
A CPI não sabe por que Wajngarten desdisse a entrevista gravada, mentiu o tempo todo, a cara suarenta de pânico, uma
pusilanimidade de dar repugnância. Wajngarten não tinha mais motivo para
incomodar o governo. Fazê-lo seria atingir Bolsonaro em cheio: era ele, e só
ele, quem impedia o fechamento do negócio, afinal autorizando o que antes
considerara “leonino”. O argumento de autorização do Senado para aceitar as
condições da Pfizer é falso, porque a alegada inconveniência não foi retirada
pela medida parlamentar. Bolsonaro aceitou a grande compra negociada por
Wajngarten com outras quaisquer motivações.
As mentiras e silêncios de Fabio Wajngarten não
importam. O que importa é o que o fez adotar os silêncios e mentiras em lugar
das acusações que traziam, implícitas, outras possíveis. Piores.
.
Veja: Pelo impeachment ou pelo voto https://bit.ly/3uEnGxa
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