01 janeiro 2022

Crônica da sexta-feira

A feijoada azul

Luciano Siqueira

 

Como todos os anos, a gostosa algazarra do réveillon.

No ano passado a pandemia não permitiu. Porém agora, cuidados sanitários resguardados, voltamos a reunir a família e agregados.

- Qual será o almoço do dia 31?

- Uma baita feijoada feita a muitas mãos.

Enquanto uma parte da turma toma birita na varanda, outra parte — pelo menos 5 entre veteranos e jovens — se amontoa na cozinha, todos se autoproclamando competentes no ofício.

Com uma boa cota de divergências.

Polêmicas incompreensíveis para um observador como eu, absolutamente ignorante na matéria.

A intenção é preparar um caldeirão de feijoada de véspera, para que ela curta o suficiente e seja degustada dia seguinte, "no ponto".

Alguém tem a ideia meter colorau na feijoada, sob protestos generalizados.

- O colorau é para que ela fique com uma boa aparência, justifica o transgressor.

- Como assim, se colorau é vermelho!?

- Depois que ferve fica escuro, ora!

Todos os que estão na cozinha se consideram expert e cada um a seu critério acrescenta algum ingrediente.

Lá pras tantas alguém denuncia:

- A feijoada está ficando azul!

Perplexidade de alguns, tranquilidade de outros.

Eu mesmo, em minha irrecuperável ignorância, jamais ouvira falar em feijoada azul.

- Foi o colorau, protestou alguém.

- Garanto que amanhã ela amanhecerá preta, asseverou o dito especialista.

O fato é que a feijoada amanheceu preta como naturalmente é, para alegria de todos.

E na hora prevista, alguns saboreando uma lapada de uma boa cachaça, outros optando pela cerveja convincentemente gelada, houve concordância unânime quanto a qualidade da feijoada.

- Arretada!

- Porreta!

- Eu não disse!?

- Nesses anos todos em que nos juntamos para o réveillon, nunca vi uma feijoada assim tão gostosa, proclamou alguém com a voz enviesada pela quantidade de hidroxilas consumidas.

Fiz meu prato em silêncio, pois quem sabe apenas lavar a louça não deve se imiscuir entre cozinheiros.

Falei baixinho para mim mesmo:

- O sabor é razoável, mas a variedade das carnes deixa a desejar...

- E aí, concorda que é a melhor feijoada de todos os tempos?

Apenas fiz um leve aceno de concordância, meio que em cima do muro, para não me comprometer.

E assim todos devoraram a dita cuja em clima de comemoração — e de expectativa de um 2022 pleno de lutas e vitórias.

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Veja: Respostas a várias questões resumidas em 2 pontos https://bit.ly/3ppTPqL

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