Os extremos se cruzam
Luciano Siqueira, no Vermelho www.vermelho.org.br
A luta política decididamente não é para principiantes, até porque é a
face institucional da vida como ela é — e muita gente não entende isso.
Uma das fontes de incompreensão e mal entendidos é precisamente a maldita
da realidade concreta no que diz respeito à correlação de forças na peleja em
curso.
Forças que se digladiam em campo aberto são necessariamente compelidas a
avaliarem as condições concretas da luta: o poderio real dos dois polos
opostos, o exército de origem de cada um, aliados agregados e novos aliados
hipoteticamente passíveis de serem agregados e outros tantos que pelo menos
possam ser neutralizados.
Vale para o conflito militar e igualmente para a luta política e
eleitoral.
Nas eleições gerais do Brasil de hoje, em meio a multifacetada e arriscosa
crise e sob ameaças cotidianas de ruptura institucional, essa comparação entre
os "exércitos" litigantes é não apenas necessária, como exige
respeito à experiência acumulada, descortino histórico e tático, largueza de
espírito e muita habilidade.
Na disputa presidencial, é óbvio que entre os dois principais contadores —
Bolsonaro e Lula — se estabelece conflito aberto entre duas concepções táticas.
O presidente atual, de extrema direita, aprofunda o discurso negacionista
em todas as dimensões da vida e do exercício do poder e se isola numa caixa
metálica constituída por extensa, porém insuficiente, legião de ensandecidos e
inescrupulosos. Aprofunda o discurso do ódio aparentemente desatento à
necessidade de arregimentar mais forças e se apequena.
No outro polo, o ex-presidente Lula consolida uma candidatura assentada em
alianças que vão muito além da sua força de origem, a esquerda. A coalizão que
o apoia vai se constituindo num verdadeiro arco-íris capaz de encantar a
maioria do eleitorado, como diria João Amazonas.
Leia também: Lula-Alckmin e o gesto taticamente contido: https://bit.ly/3A39tiS
Mas a frente ampla em torno de Lula assiste também inusitada convergência
entre correntes extremadas de matriz conservadora e "esquerdista".
De um lado, segmentos do grande empresariado, incluindo o rentismo e o
agronegócio poderosos, são atraídos para opção Lula em razão do desastre
bolsonarista, entretanto exercendo pressão sobre o sistema de ideias que
lastreiam o futuro programa de governo. Esperneiam através da grande mídia
monopolizada, pondo gosto ruim em tudo que contrarie preceitos ultraliberais
que lhes são tão caros.
Já à "esquerda" grupos barulhentos, contraditoriamente alguns
ainda alojados na legenda petista, protestam contra a amplitude das alianças.
Em passagem recente de Lula por Pernambuco, facção barulhenta que na
disputa estadual opta por ex-militante do PSB e do PT, hoje no Solidariedade,
tem o desplante de comparecer aos eventos para agredir com palavras de ordem
ofensivas e vaias componentes da frente popular e democrática reunida em torno
da sua candidatura.
Como Lula tivesse sido eleito presidente duas vezes, e Dilma também
duas vezes, impondo atestado ideológico ou folha corrida de coerência aos
aliados de diversos matizes!
Assim, a velha assertiva de Lenin de que frequentemente os extremos se
encontram no curso da luta concreta mais uma vez se confirma.
Ainda bem que o principal líder da empreitada tem maturidade e competência
suficientes para seguir adiante se possível ampliando mais ainda o leque de
alianças — para vencer e governar.
Veja: Os partidos e suas alianças nas eleições de outubro https://bit.ly/3tThW49
Excelente texto,muitos ainda não deram conta do tamanho da batalha que será esta eleição.
ResponderExcluirQuanto mais ampla a frente maior é a chance de derrotar o obscurantismo.
Realmente, há insanos em ambos os lados, porém vale lembrar a frase parafraseada que Lula tem repetido, de Paulo Freire, que é necessário reunir os divergentes para enfrentar os antagônicos.
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