30 setembro 2022

Debate: impressões

Escrevi no twitter durante o debate, ontem

- No debate da Globo, Ciro traduz toda a sua frustração de candidato derrotado fazendo coro com a direita e tendo Lula com o seu alvo principal. Lamentável.

- Para um indivíduo absolutamente avesso ao debate de ideias, como Bolsonaro, ouvir críticas e ser instado a se explicar é verdadeiramente uma tortura...

- Nunca tinha ouvido falar nesse padre Kelmon, do PTB. Que ridículo!

- Ciro é um cara experiente e deve ter uma boa assessoria. Por que tanta empáfia?

- Alguém poderia sugerir algum tema para debate no qual o atual presidente da República pudesse se dar bem?

- Esse padre Kelmon é padre mesmo!? Um provocador de baixíssimo nível. Qual regra permitiu esse cara participar desse debate?

- Infelizmente, um debate muito precário e anos luz de distância de alternativas concretas para a superação da crise do Brasil. A própria dinâmica estabelecida não ajuda.

- Que bate boca precário agora entre a candidata Simone e Bolsonaro! Qual o tema mesmo da pergunta? Pensei que fosse golpe de estado...

- Agora a cena deveria se chamar "o elogio à mediocridade e ao achincalhe": Bolsonaro pergunta e o tal padre responde.

- Modéstia à parte, reivindico para mim mesmo a medalha de ouro da paciência: passa de 1:30 da manhã e eu ainda estou aqui vendo o debate da Globo!

Agora “santinhos” fazem a diferença https://bit.ly/3SeQTdN

29 setembro 2022

Pode ser domingo

Pesquisa Datafolha: Lula tem 50% dos votos válidos e mantém chances de vitória no primeiro turno

Há uma semana, o ex-presidente tinha mesmo percentual pelo cálculo que exclui indecisos e votos brancos e nulos. Bolsonaro tem 36%
Marlen Couto, O Globo

 

A nova pesquisa do Datafolha, divulgada nesta quinta-feira, mostra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com chances de ser eleito para um novo mandato já no próximo domingo. O petista tem 50% dos votos válidos, mesmo percentual da semana passada. Já o atual presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), atinge 36% dos votos válidos no primeiro turno, ante 35% na pesquisa anterior.

Pela margem de erro da pesquisa, de dois pontos percentuais para mais ou menos, Lula teria de 48% a 52% dos votos válidos se a eleição fosse hoje. Só é dispensada a realização de segundo turno caso algum candidato obtenha maioria absoluta na votação marcada para 2 de outubro.

O cálculo dos votos válidos desconsidera brancos e nulos e os eleitores que não responderam. A conta é comparável à utilizada pela Justiça Eleitoral na hora da apuração oficial.

O candidato Ciro Gomes (PDT) tem 6% dos votos válidos. A senadora Simone Tebet (MDB) chega a 5% por esse cálculo. Já Soraya Thronicke (União Brasil) marca 1%.

Os apoiadores de Ciro e Tebet foram nas últimas semanas um dos focos da campanha de Lula, que intensificou a busca pelo chamado “voto útil” para tentar vencer a eleição sem a necessidade de uma disputa em segundo turno.

O ex-presidente angariou novos apoios na reta final da campanha, inclusive de artistas que antes declaravam voto em Ciro. As investidas do petista incomodaram o candidato do PDT e Tebet, que reagiram contra Lula em discursos e propagandas na TV, no rádio e na internet.

Considerando os votos totais, Lula oscilou um ponto para cima e agora tem 48%. Já Bolsonaro soma 34%, também um ponto a mais que na semana anterior. Ciro marca 6% e Tebet soma 5%. Votos em branco e nulo são 3%. Outros 2% afirmam não saber em quem votar. Na pesquisa espontânea, quando a lista de candidatos não é apresentada, esse índice chega a 11%.

Leia também: Fake news sobre urnas, pesquisas e TSE dominam retórica da mentira https://bit.ly/3BQHoup

O Datafolha questionou os entrevistados sobre a decisão do voto: 85% dos eleitores estão totalmente decididos em que irão votar para presidente, número que é puxada pelos eleitores de Lula e de Bolsonaro. Os que dizem que ainda podem mudar de voto são 15%. Na última pesquisa, na semana passada, 18% diziam que ainda podiam mudar de candidato.

Os eleitores com voto decidido estão em menor número entre os entrevistados que apoiam Ciro e Tebet. Entre os que escolhem o candidato do PDT, 54% dizem estar totalmente decididos, índice que é de 62% entre os hoje eleitores da emedebista.

Ainda segundo o instituto, Lula é citado como segunda opção de voto por 21% dos eleitores que ainda podem mudar de ideia. O petista está empatado tecnicamente com Ciro, que é citado por 19%.

Vantagem de Lula entre mulheres e mais pobres

Nos estratos, Lula segue com vantagem em grupos que representam a maioria do eleitorado. Entre as mulheres, o petista está 22 pontos à frente de Bolsonaro (53% dos votos válidos a 31%). A vantagem cai para seis pontos entre os homens (47% a 41%).

No eleitorado com renda familiar até dois salários mínimos, Lula tem 32 pontos de vantagem nos votos válidos (59% a 27%). Ao longo da campanha, não houve impacto do aumento do Auxílio Brasil para R$ 600 e de outras medidas econômicas anunciadas pelo governo. Nas faixas com maior renda, que têm peso menor entre os eleitores, o atual presidente tem desempenho melhor. No grupo com renda de 5 a 10 salários, ele chega a 50% dos votos, contra 35% de Lula.

O país também segue com votos distintos a depender da religião do eleitor. Lula segue com vantagem entre católicos (57% a 29%), enquanto Bolsonaro lidera entre os evangélicos (53% a 32%).

No Sudeste, não houve mudança no placar. Lula lidera com 45% dos votos válidos, contra 38% de Bolsonaro. O petista segue com ampla vantagem no Nordeste (66% a 23%), enquanto o atual presidente agora aparece numericamente à frente no Sul, com 46%, ante 41% de Lula. Os dois estão empatados no limite da margem de erro para a região, que é de cinco pontos.

No Centro-Oeste, Bolsonaro tem 45% e Lula tem 41%. No Norte, o petista tem 45% e o candidato do PL marca 42%. Nas duas regiões, os candidatos também estão empatados na margem de erro.

Rejeição

Ainda segundo a pesquisa, mais da metade do eleitorado (52%) não Contratado pela “Folha de S.Paulo” e TV Globo, o Datafolha entrevistou presencialmente 6.800 eleitores de todo o país entre os dias 27 e 29 de setembro. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para um nível de confiança de 95%. A pesquisa está registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com o número BR-09479/2022.votaria em Bolsonaro de jeito nenhum. Os que dizem não votar em Lula somam 39%.

Já a avaliação do governo Bolsonaro ficou estável. De acordo com o Datafolha, 44% dos brasileiros reprovam o governo. Os que aprovam são 31%, e os que consideram regular são 24%.

O Datafolha também mediu um cenário de segundo turno. Lula teria 54%, contra 39% de Bolsonaro. Na comparação com a semana passada, o atual presidente variou um ponto para cima e o petista tem o mesmo resultado.

Leia também: Na boca da urna, qual programa? https://bit.ly/3fplfvA

Enio Lins opina

TRAIÇÃO COM DIGITAL EXPOSTA

Enio Lins, tribunahoje.com

 

Briga familiar faz parte da história da luta pelo poder, em todos os tempos. Roma, por exemplo, testemunhou o punhal de Brutus descendo sobre seu padrinho César, nos idos de março do ano 44 a.C., e em junho de 1497 o assassinato de Giovani Bórgia gerou suspeitas sobre seus irmãos César e Godofredo (os três eram filhos do Papa Alexandre VI). Não foram grandes surpresas.

Na França moderna
, talvez o grande escândalo político/familiar tenha sido a reação da madame Le Pen às provocações machistas de seu ex-marido, que a mandou arranjar uma colocação de empregada doméstica. Ela procurou a revista Playboy e se propôs a fazer um ensaio erótico, nua, como numa faxina. Publicado na edição de 10 de junho de 1987, sujou a carreira de Jean-Marie Le Pen, então astro do neofascismo francês. Apesar da criatividade do gesto, alguma incisiva resposta dela era esperada.

O clã do Jair
 se abalou com a guerra entre ele e a ex-esposa 02, Ana Cristina Valle, que se sentindo lesada na separação, em 2007, acusou formalmente Jair Messias de várias falcatruas, como lhe furtar um cofre de banco, ocultar patrimônio, receber pagamentos não declarados e agir “com desmedida agressividade”. Ela pediu apoio diplomático para deixar o País como forma de garantir a própria vida. Em 2018, num acordo com o ex, voltou ao Brasil para tentar a carreira política, sem sucesso até agora. Mas os conflitos do casal eram notórios, sem surpresas.

Em Alagoas
, o deputado Arthur Lira vive um tumultuado processo pós-separação de Jullyene Lins, sua ex-esposa e atual candidata a deputada federal, que apresenta um extenso rol de acusações – e que está impedida por decisões judiciais de fazer essas denúncias durante a atual campanha –, mas esse quadro também não é novidade.

Novidade mesmo
 é um pai tentar impedir a eleição do filho, até então seu correligionário e apoiador. Luís teve Paulo como auxiliar na presidência da Assembleia durante anos, depois o apoiou como seu substituto no Legislativo, depois o prestigiou como governador-tampão, foi prestigiado de volta, e, sem aviso, tentou um cavalo-de-pau na reta de chegada. O inesperado ataque tem a digital bolsonarista bem visível, e não teve efeito significativo sobre a liderança de Paulo Dantas, que segue como primeiro colocado, mas é uma prova do que os seguidores do mito podem fazer em termos de golpes e traições – inclusive familiares. [Ilustração: Amarildo]

Leia também: Na boca da urna, qual programa? https://bit.ly/3fplfvA

Pode ser

Datafolha: Lula tem 50% dos votos válidos e pode vencer no 1º turno.
Lula, Bolsonaro, Ciro e Tebet mantiveram as mesmas pontuações da semana passada, conforme o levantamento. Leia mais https://bit.ly/3y5zooh

Violência de gênero

Violência: armas apontadas para elas

Incentivo ao armamento e corte de 90% das verbas para combate à violência doméstica são parte da receita misógina de Bolsonaro. Assassinatos, ameaças e tortura dispararam. Hoje, 1 em cada 4 homicídios de mulheres ocorre dentro de casa
Carolina Ricardo
 e Natália Pollachi na Piauí

 

O país acompanhou aterrorizado as imagens da execução de Michelli Nicolich, assassinada em São Paulo na semana passada pelo seu ex-marido, Ezequiel Lemos Ramos, pai da criança de 2 anos que ele também matou. O agressor era registrado pelo Exército como CAC (categoria que inclui caçadores, atiradores e colecionadores) e já havia sido denunciado por Michelli por ameaças de morte. Ele chegou a ser preso preventivamente, e a delegada responsável pelo caso solicitou corretamente a apreensão de duas armas que ele mantinha em casa, além da suspensão do registro de Ramos junto ao Exército.

A legislação brasileira permite que, em caso de acusação de violência doméstica, o registro de armas do denunciado seja imediatamente suspenso e que seja solicitada a apreensão cautelar das armas. Tal possibilidade foi incluída na Lei Maria da Penha em 2019, por meio da Lei n.º 13.880, cuja tramitação contou com apoio de várias organizações da sociedade civil, entre elas o Instituto Sou da Paz.

Veja: De poeta para poeta em defesa da democracia https://bit.ly/3DLZpMN

O agressor de Michelli, no entanto, teve a prisão preventiva convertida em uso de tornozeleira eletrônica como medida cautelar alternativa. Assim que a ex-esposa se mudou para São Paulo, esse uso não foi mais considerado necessário pela Justiça. Quatro meses após o boletim de ocorrência de ameaça, ele viajou mais de 1 mil km e usou uma terceira arma para cometer o duplo assassinato em plena luz do dia.

Esse caso reflete muitas questões estruturais e urgentes do país. De imediato, evoca a necessidade de colocar em prática políticas públicas multissetoriais e constantes para reforçar a igualdade de direitos em um país marcado pelo machismo estrutural. Graças a ele, nós, mulheres, ainda somos vistas como cidadãs de segunda categoria, como propriedades das nossas famílias ou companheiros, corpos à disposição, predestinadas a realizar o trabalho não remunerado de cuidado doméstico e familiar que viabiliza o funcionamento da sociedade.

O assassinato de Michelli Nicolich também explicita a necessidade urgente de rever o descontrole no acesso a armas e munições. O governo Bolsonaro desfigurou a legislação do setor por meio de decretos e portarias, boa parte legalmente questionáveis (havendo decisões do STF que suspendem parcialmente algumas das medidas). Os pronunciamentos públicos do presidente incentivam uma corrida armamentista diária. O resultado é inquestionável: mais que dobrou a quantidade de armas em mãos de pessoas comuns, especialmente as registradas como CACs – que podem comprar maiores quantidades, tipos mais potentes e não precisam justificar sua necessidade.

Ao mesmo tempo, o governo deliberadamente atrasou investimentos em tecnologia de controle e fiscalização dessas armas. Isso fez com que até hoje as polícias estaduais não possam consultar o sistema do Exército em que as armas de CACs estão registradas. Já foi confirmado que o agressor tinha uma terceira arma registrada em seu nome, possivelmente a arma usada no crime. Independentemente de ter sido usada ou não, essa terceira arma não foi imediatamente identificada e apreendida no momento da primeira denúncia pela falta de acesso das polícias ao sistema do Exército – que, por sua vez, também tardou a cooperar no fornecimento dessa informação.

Fiscalização eficaz e respostas rápidas são essenciais para mitigar riscos. As mulheres brasileiras sabem que critérios objetivos para adquirir uma arma, como não ter antecedentes criminais, ter um emprego fixo e ter feito um teste psicológico até dez anos antes, não são garantias suficientes. Boa parte das agredidas são vitimadas por ex-companheiros ou familiares, pessoas que antes detinham sua confiança, o típico “cidadão de bem”.

Não é à toa que a rejeição da política armamentista é mais alta nesse grupo. Enquanto o porte generalizado de armas é rejeitado por 83% do público, a rejeição sobe para 88% entre mulheres, segundo pesquisa Datafolha realizada em junho de 2022. Ao contrário do que afirmam seus defensores, a ampliação do porte é apoiada por apenas 15% da população, uma pequena minoria composta majoritariamente por homens, brancos e de alta renda – um perfil de beneficiários que coincide com a maior base do atual governo e com a tentativa de reafirmação de papéis tradicionais de gênero que as armas também carregam. É simbólico dessa priorização que o mesmo governo que publicou mais de quarenta normas para facilitar o acesso a armas tenha cortado em 90% a verba para proteção de mulheres.

Leia também: O ódio às mulheres desmascarado https://bit.ly/3NAdNch

Essa retórica armamentista e toda a indústria que dela se alimenta têm disseminado o argumento, importado dos Estados Unidos, de que armas serviriam ao empoderamento feminino, gerando super-heroínas invencíveis. Ocorre que essa ideia não tem respaldo em dados de realidade, que indicam que mais armas geram mais violência em cenários de desigualdade social e que as chances de reação armada bem-sucedida são baixas. Funciona ainda menos em casos de violência doméstica, situações de profunda vulnerabilidade psicossocial, dependência econômica e baixa capacidade de reação em um duelo caseiro. Para fortalecer essas mulheres, é preciso consolidar uma rede de apoio de políticas públicas capazes de oferecer suporte psicológico, abrigo emergencial e capacitação profissional para mantê-las longe do agressor, assim como um sistema de justiça e segurança pública apto e eficiente para responsabilizá-lo.

Dados do Ministério da Saúde indicam que 51% das mulheres mortas por agressão foram vitimadas com armas de fogo e que 70% delas eram mulheres negras. De 2012 a 2019, a proporção dessas mortes que ocorreu dentro de casa, forte indício de violência de gênero, subiu de 1 a cada 5 casos para 1 a cada 4. Além das mortes, a arma dentro de casa é um forte elemento para a prática de ameaças físicas e de violência psicológica, além de dificultar a ruptura do relacionamento abusivo ou mesmo a denúncia por parte da mulher.

Com o aumento da participação de arma de fogo na morte de mulheres por violência de gênero, é fundamental disseminar a determinação da Lei n.º 13.880 para que as armas dos agressores sejam apreendidas, que todas as delegacias passem a aplicar a regra e que as mulheres saibam que essa é uma medida de proteção disponível. Como os bancos de armas de CACs não estão disponíveis para as polícias estaduais, é urgente que o Exército acelere essa evolução tecnológica e reveja processos para garantir que todas as armas e autorizações de compra em nome de acusados de agressão sejam identificadas e recolhidas. É importante também entender se a Justiça poderia ter mantido o monitoramento eletrônico ou outras medidas cautelares, considerando a gravidade das ameaças.

É essencial entender e corrigir todas as falhas que resultaram no assassinato de Michelli Nicolich. O Estado e o sistema de Justiça e Segurança por muito tempo ignoraram ou negligenciaram a proteção de mulheres. Casos como esse não são mais aceitáveis.

_________________

Carolina Ricardo e Natália Pollachi são, respectivamente, diretora-executiva e gerente do Instituto Sou da Paz.

Leia também: Fake news sobre urnas, pesquisas e TSE dominam retórica da mentira https://bit.ly/3BQHoup 

Minha opinião

Na boca da urna, qual programa?
Luciano Siqueira


Toda eleição para cargos executivos é assim. Num dado momento, por boas ou más intenções surge a cobrança do chamado programa de governo, em geral da candidatura mais cotada para vencer.

Recordo-me do ex-governador Miguel Arraes, aliado do PCdoB, com quem tive a oportunidade de conviver por 24 anos.

Em 1982, ainda pelo MDB (que então encarnava a frente ampla democrática de resistência à ditadura militar), o senador Marcos Freire despontava como forte candidato oposicionista ao governo do Estado.

Arraes não simpatizava com essa alternativa: "Cadê o programa?"

Quatro anos após, em 1986, ele próprio é que foi o candidato, eleito em memorável campanha que marcou a história de Pernambuco:

"Programa? Não há necessidade, o povo sabe o que eu penso", dizia ele.

Dois pesos, duas medidas conforme as circunstâncias. E a correlação de forças.

Agora a cobrança recai sobre Lula, que tem chances reais de vencer o pleito presidencial talvez até já no primeiro turno.

A grande mídia, que circunstancialmente reforça a candidatura do ex-presidente — Bolsonaro é o inimigo comum declarado —, diz-se desinformada sobre a proposta programática do futuro governo da coalizão Brasil da Esperança. 

Isso apesar da plataforma apresentada por Lula e Alckmin no início da campanha e que vem ensejando proposições do conjunto da sociedade e de segmentos organizados, através de plataforma digital.

Na verdade, colunistas e editorialistas, movidos pelos interesses do mercado financeiro e do poderoso agronegócio, mostram-se inquietos em relação à política econômica do futuro governo.

Desejam uma solução “frankenstein” para a crise: derrotar o fascismo, mas conservar, na essência, o figurino neoliberal.

A cobrança é uma impropriedade, tanto porque programa de governo propriamente dito só se estabelece quando o governante toma posse e se assenhora plenamente da situação real que encontra, como porque, no caso específico da candidatura de Lula, a agregação de novas forças à frente ampla que a sustenta prossegue incorporando opiniões diversas.

Confirmando-se a vitória, pelo menos teoricamente se terá três meses de transição do atual para o futuro governo. Tempo para pisar nas condições concretas de governo e de decantar as proposições recolhidas.

Agora, bem que Lula poderia — ao estilo Miguel Arraes — ponderar: "Para que antecipar um programa de governo se a nação já sabe o que penso e as motivações dos variados apoios que recebo?"

Na verdade, como todo governo, o próximo será de intensa disputa interna entre as forças que o comporão, tão amplas e diversificadas quanto complexos são os problemas a serem enfrentados sob a consigna da reconstrução nacional.

Agora “santinhos” fazem a diferença https://bit.ly/3SeQTdN 

Voto útil

Voto útil em Lula já é realidade e acentua crise na campanha de Ciro. Levantamentos internos já apontam o risco de Ciro se desidratar ainda mais, a ponto de ser ultrapassado, nesta reta final, pela presidenciável do MDB, Simone Tebet. Leia mais https://bit.ly/3UHwvUl

Retórica da mentira

Fake news sobre urnas, pesquisas e TSE dominam eleição de 2022

Mentiras de 2018 focavam questões morais, como 'mamadeira de piroca'; agora, sistema eleitoral é um dos principais alvos
Patrícia Campos MelloPaula SopranaRenata Galf, Folha de S. Paulo

 

A "mamadeira de piroca", notícia falsa que marcou a eleição de 2018, deu espaço em 2022 para denúncias infundadas sobre urnas e pesquisas eleitorais, conspirações sobre a TV Globo e a corte eleitoral e o boato de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fechará igrejas caso eleito.

Em 2018, a campanha foi dominada por fake news ligadas a questões morais e de gênero, como a mensagem dizendo que mamadeiras com bico em formato de pênis tinham sido distribuídas
em creches pelo PT e o boato da criação de um "kit gay" pelo então candidato à Presidência Fernando Haddad para doutrinar crianças.

Naquele ano em que a avalanche de notícias falsas surpreendeu os eleitores e as autoridades, montagens mostrando a ex-presidente Dilma Rousseff com o ex-ditador cubano Fidel Castro e acusações de terrorismo contra políticos também inundaram os grupos de WhatsApp, segundo levantamentos feitos pelas agências de checagem Lupa e Aos Fatos, pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e
pela USP na época.

Já em 2022, segundo mapeamento da Palver, empresa de tecnologia que monitora mais de 15 mil grupos públicos de WhatsApp, as mensagens desinformativas que mais viralizaram questionam de algum modo as urnas ou as autoridades eleitorais.

Uma das mais compartilhadas de 15 de agosto, início da campanha, a 15 de setembro dizia que o voto para presidente seria invalidado caso o eleitor não votasse para os outros cargos. Outra narrativa afirmava que o ex-delegado da Polícia Federal Protógenes Queiroz havia investigado as urnas eletrônicas e descoberto que o PT nunca teria vencido às claras no Brasil.

Na reta final para o primeiro turno, entre 5 de setembro e o dia 28, explodiu o volume de mentiras sobre o sistema eleitoral, pesquisas de opinião e ministros do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Um dos conteúdos falsos de maior circulação dizia que as urnas já estavam sendo abertas e fraudadas em um sindicato ligado ao PT, em Itapeva: "Denúncia urgente! Bomba! Urnas eletrônicas sendo modificadas dentro do Sindicato do PT em Itapeva, São Paulo. A fraude sendo revelada antes da eleição".

Segundo a Palver, com base no número de usuários que receberam a mensagem na amostra, ao menos 130 mil pessoas foram expostas a ela.

Na segunda-feira (26), o TSE esclareceu que, desde 2014, um cartório eleitoral de Itapeva realiza o procedimento de carga e lacração das urnas do Sinticom (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário) por falta de espaço no cartório, e que os funcionários que atuam no procedimento foram contratados por licitação. Mas a ideia continua circulando.

No Facebook, um vídeo da deputada federal Carla Zambelli (PL) sobre o sindicato somou mais de 600 mil visualizações em menos de 24 horas.

No YouTube, foram 84 mil. No Kwai, dezenas de vídeos circulam com as imagens gravadas no local. Alguns deles vêm acompanhados dos termos "golpe das urnas" e "fraude escancarada". O mais viral tinha 194 mil visualizações.

Outro discurso de destaque convoca apoiadores de Bolsonaro a enviar fotos dos comprovantes de voto para determinados grupos de Telegram, um tipo de contagem paralela.

Já um boato, cujas variações atingiram ao menos 20 mil pessoas, diz que a totalização dos votos será fraudada para "apresentar números iguais aos das pesquisas".

Ainda há teorias populares dizendo que as urnas eram entregues na favela e carregadas por garis; que 80% delas têm o código-fonte programado para adulteração; e que o TSE reduziu o número de urnas para brasileiros que vivem no exterior, maioria que seria eleitora de Bolsonaro, e ampliou nos presídios. O texto ainda incita bolsonaristas a seguir o exemplo da invasão do Capitólio nos EUA, em 6 de janeiro.

"Em 2018, a desinformação tinha o objetivo construir a polarização, colocando de forma antagônica temas que não estavam sendo debatidos dessa forma pelas pessoas, causas feministas, questões LGBT", diz Fabrício Benevenuto, professor de ciência da computação da UFMG e coordenador do projeto Eleições
Sem Fake.

"Em 2022, a polarização já está formada e a desinformação está focada em atacar os candidatos e deslegitimar as eleições e as pesquisas."

É o caso da montagem de uma fotografia em que Lula aparece abraçando e beijando Suzane von Richthofen, condenada a 39 anos de prisão pelo assassinato dos pais. Em alguns casos, afirmava-se também, falsamente, que Richthofen seria candidata pelo PT.

Outra diferença entre os dois pleitos é que, em 2018, a maioria das fake news circulava em formato de imagem (59,7%), diante de 19,6% em vídeo, 12,5% em texto e 8,2%, áudio.

Neste ano, segundo a UFMG, a maior parte está em vídeo (37,3%), depois em texto (32,9%), imagem (22,6%) e áudio (7,2%). O monitoramento também mostra vídeos do TikTok e Kwai entre os mais compartilhados.

O cenário ainda conta com amplo uso de redes de nicho, como Gettr, BitChute e Rumble, usadas em especial pela extrema-direita, pontua Tai Nalon, diretora-executiva do Aos Fatos, a partir de dados da organização.

"O ambiente para a desinformação está mais fragmentado, porém muito mais amplo, com mais lugares de distribuição do que em 2018", diz.

Há quatro anos, eram poucos os grupos de esquerda. Agora, dados da UFMG mostram que uma pequena parte dos conteúdos dos grupos desse espectro já aparece entre os mais compartilhados —embora a direita ainda protagonize a disseminação de fake news.

Outra novidade de 2022 é a popularização dos deep fakes e de vídeos manipulados. Entre os mais difundidos de 15 a 26 de setembro em grupos de WhatsApp acompanhados pela UFMG está o
deepfake em que o âncora do Jornal Nacional, William Bonner, anuncia resultados falsos de uma pesquisa Ipec que teria Bolsonaro à frente de Lula.

Segundo Cristina Tardáguila, fundadora da Agência Lupa e diretora do International Center for Journalists, a desinformação de 2018 estava no WhatsApp.

Agora, é cada vez mais comum mensagens com links chamando para assistir a lives, ou com vídeos, de youtubers, podcasts ou veículos de mídia favoráveis ao governo, como Jovem Pan, Gustavo Gayer, RedeTV! e Record.

Nos vídeos, diz Tardáguila, proliferam afirmações falsas sobre o processo eleitoral, as urnas e os candidatos.

"São conteúdos geralmente muito longos, que oferecem dificuldade para os checadores verificarem, e as checagens não aparecem no mesmo espaço", diz. "E é difícil as plataformas derrubarem um vídeo de três horas por causa de duas ou três afirmações falsas."

Os boatos sobre a Globo, o STF e de uma suposta perseguição do PT a cristãos também ganharam tração na reta final. O Monitor de WhatsApp da UFMG apontou que, entre os 10 textos mais compartilhados no aplicativo, 3 diziam que Lula ataca cristãos e que fecharia igreja e prenderia pastores, o associando ao ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, ao demônio e a religiões de matriz africana.

IMAGENS, VÍDEOS E MENSAGENS DE TEXTO DESINFORMATIVOS MAIS COMPARTILHADOS EM 2022

Lista é feita com base em conteúdos que aparecem entre os mais virais dos levantamentos de Palver e UFMG

·         Título de eleitor falso com código de validação e QR-code pró-Lula

Código no documento, que nada tem a ver com o voto, transferiria voto para candidato do PT

·         Imagens de manifestações a favor de Jair Bolsonaro com o texto: #GloboLixo não engana mais –analistas políticos internacionais afirmam que Bolsonaro passará de 100 milhões de votos

·         Foto que mostra suposta fazenda da família do ex-presidente Lula, que, na verdade, é a fazenda Nova Piratininga, que fica em São Miguel do Araguaia, norte de Goiás

A narrativa falsa é de 2019

·         Mensagem sobre bloqueio de bens do ex-presidente Lula: “A Receita Federal está sendo impedida de agir. Lula quer impedir a Receita Federal de avaliar o patrimônio que ele e Lulinha montaram com evidências de mutretas”

·         Suposto esquema de recebimento de recursos Grupo Globo para os ministros do STF Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski

·         Imagem manipulada em que Lula aparece beijando e abraçando Suzanne von Richthofen

·         Vídeo do youtuber Gustavo Gayer dizendo que o IPEC funciona no mesmo endereço que a sede do Instituto Lula

O TSE determinou que Twitter, Facebook e TikTok removam conteúdo do ar

·         Vídeo de Bolsonaro no 7 de Setembro ao lado do empresário Luciano Hang em Brasília

Divulgação foi proibida pelo TSE e enquadrada como propaganda irregular devido ao uso de aparato estatal

·         Vídeo deep fake do presidente Lula em um comício, dizendo que seus eleitores são vagabundos, traficantes e bandidos

·         Vídeo deep fake de William Bonner anunciando falso resultado da pesquisa Ipec com Bolsonaro à frente

·         Montagem com a entrevista de Lula ao Jornal Nacional

·         Mensagens sobre diversos tipos de fraude nas urnas

·         Mensagens dizendo que Lula ataca cristãos, fecharia igrejas e prenderia pastores

Associam o ex-presidente ao ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, ao demônio e a religiões de matriz africana, vistas de modo intolerante

·         Vídeo atribuído à Ursa diz que TSE deixa parte do código com erros propositais para que as urnas das localidades onde Bolsonaro tem mais votos sejam substituídas

A Ursal não existe e virou meme em 2018 ao ser citada por Cabo Daciolo como uma possível organização de esquerda de países latinos

·         Mensagens associando o ministro Alexandre de Moraes e o TSE a conluios com a TV Globo para fraudar a eleição

CONTEÚDOS MAIS DIFUNDIDOS EM 2018

Lista feita a partir de levantamentos da UFMG e da Lupa

·         Montagem de foto mostrando “Dilma e Fidel em Cuba”

·         Suposta ficha criminal de Dilma acusada de terrorismo

·         Foto de parada gay em Nova York dizendo ser de pessoas ligadas à TV Globo, afirmando que não votam em Bolsonaro

·         Montagem mostrando supostas feministas fazendo sexo e defecando em igreja

CONTEÚDOS DESINFORMATIVOS MAIS VIRAIS EM 2018 NO FACEBOOK

Elaborado a partir de levantamento da agência Aos Fatos

·         Urnas eletrônicas que autocompletavam para o PT

·         Kit gay –projeto Escola sem Homofobia idealizado pelo então candidato Fernando Haddad seria usado para doutrinar crianças de 6 anos

O projeto era voltado para o Ensino Médio e não foi adotado em escolas públicas

·         Montagem antiga de uma capa da revista Veja, de 2014, com a foto do ex-ministro do STF Joaquim Barbosa pedindo para que os brasileiros não votassem no PT

·         Áudio falso do Padre Marcelo Rossi declarando apoio a Bolsonaro

·         Postagem falsa dizendo que Haddad teria defendido em livro sexo entre pais e filhos

·         Mamadeira de piroca

Boato dizendo que mamadeiras eróticas teriam sido distribuídas pelo PT em escolas

Para a turma de Lula agora “santinhos” fazem a diferença https://bit.ly/3SeQTdN