Pequeno balanço do sistema eleitoral brasileiro
Cinco grandes modificações o marcaram: voto
secreto, cédula oficial, sistema de 2º turno, urna eletrônica e reeleição. Dos
38 presidentes, só 18 passaram pelo crivo da eleição direta. Candidatos de
oposição venceram apenas cinco vezes
Márcio
Pochmann, Outras palavras
O Brasil se encontra diante de mais uma sucessão presidencial,
possivelmente a mais importante desde que transitou dos 21 anos da ditadura
civil-militar (1964-1985) para o regime democrático. Isso, por si só, aumenta a
relevância do poder do voto popular, ainda mais se considerarmos a trajetória
nacional de contida cultura democrática ao longo do tempo.
Sabe-se que desde o período colonial já existia a prática do voto para a
escolha de governantes, mesmo quando ainda predominava a denominada América
Portuguesa. De fato, a primeira eleição ocorreu em 1532 para a definição dos
cargos de representação dos residentes na câmara legislativa da vila colonial
de São Vicente.
Aliás, a administração municipal prevaleceu como sendo atribuição do
poder legislativo desde o começo do século 16 ao início do século 20. Neste
longevo período, o vereador mais votado respondia pela presidência da câmara,
exercendo funções equivalentes às dos prefeitos na atualidade, com a
denominação de intendente.
Somente com a Revolução de 1930 foi que o papel das prefeituras assumiu
relevância no sistema federativo nacional. A partir daí, os municípios passaram
a ser administrados pelo poder executivo, liderado por um prefeito escolhido
pelo voto para o exercício exclusivo da função de gestor local.
No caso da eleição presidencial, a experiência brasileira é
relativamente recente, pois foi implementada somente com o nascimento da
República, em 1889. Antes disso, o período monárquico prevaleceu por 67 anos,
tendo sido o país independente governado por dois imperadores, o pai (D. Pedro
I) e o filho (D. Pedro II).
Em 133 anos de existência da República, o país teve 38 presidentes,
porém somente 18 passaram pelo crivo da eleição direta. A maior parte dos
presidentes da República no Brasil (52,6% do total) ascendeu ao cargo máximo do
poder executivo federal através de eleição indireta (7 ou 18,4% do total dos
presidentes) ou pela linha natural de sucessão, como vice-presidente ou
presidente do poder legislativo (13 ou 34,2% do total).
Se considerarmos que até o ano de 1932 não havia Justiça eleitoral,
sendo o direito ao voto não secreto (e exposto) concedido a apenas cerca de 5%
da população devido à clivagem religiosa, racial, educacional, de gênero,
econômica e política, constata-se que somente 12 presidentes foram eleitos em
contexto democrático (31,6% do total). Para isso, pelo menos cinco mudanças
institucionais se destacam no processo constitutivo da evolução do sistema
eleitoral no país.
A primeira relacionada à criação da Justiça Eleitoral e à instalação do
voto secreto e universal para alfabetizados em 1932. Recorda-se, contudo, que o
analfabeto somente pode votar a partir de 1985.
A segunda modificação de relevância no sistema eleitoral ocorreu em
1955, quando, pela primeira vez, a eleição presidencial teve cédula eleitoral
oficial, confeccionada pela própria Justiça Eleitoral. Antes disso, as cédulas
eleitorais eram fornecidas pelos próprios partidos políticos.
A terceira mudança foi impulsionada pela Constituição Federal de 1988
que reorganizou o sistema eleitoral dos cargos majoritários em dois turnos. Em
função disso, toda vez que o candidato vencedor no executivo municipal,
estadual e federal não tiver recebido mais da metade dos votos válidos, deve
ser realizado o segundo turno entre os dois candidatos mais votados dentre
todos os concorrentes.
A partir de 1996, com a adoção progressiva da urna eletrônica, aconteceu
a quarta alteração no sistema eleitoral brasileiro. A informatização do voto
concedeu agilidade ao sistema eleitoral num país de dimensão continental e de
grande diversidade territorial.
Por fim, a quinta modificação relacionada ao estabelecimento do direito
à reeleição para os cargos executivos. A inovação foi instituída no ano de 1997
e permitiu que, desde a eleição presidencial de 1998, todos os presidentes
eleitos fossem reeleitos.
Diante disso, percebe-se que o sistema eleitoral brasileiro apresenta ao
longo da trajetória republicana o conservadorismo em relação aos presidentes
eleitos. Até 2018, por exemplo, apenas cinco eleições presidenciais foram
vencidas por candidatos de oposição ao governante (1955, 1960, 1985, 1989 e
2002), sendo quatro delas por votação direta e uma indireta (1985).
Leia também: O pomo da concórdia https://bit.ly/3AMYz0w
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