Com fala sem novidades na ONU,
Bolsonaro mostra que só quer exposição
Presidente leva plataforma de
baixa credibilidade a Nova York, em horário eleitoral de alto custo
Bruno Boghossian, Folha de
S.Paulo
Em pouco menos de 20 minutos na ONU, Jair Bolsonaro preencheu quase
toda a cartela de sua plataforma de campanha. O presidente falou bem do
governo, direcionou críticas a adversários políticos, prometeu tempos melhores
na economia e repetiu distorções já conhecidas sobre a própria conduta na
pandemia.
O falatório sem grandes novidades mostra que o foco principal de
Bolsonaro não era tanto o conteúdo das declarações, mas o simples fato de ter
tomado o púlpito. O presidente viajou aos EUA em busca de um reforço para a
pose de governante e a impressão de que leva sua agenda eleitoral para um foro
de prestígio.
A ida a Nova York, depois da passagem por Londres, se tornou
especialmente importante para um presidente que enfrenta dificuldades
crescentes dentro de casa. Com a reeleição em risco, Bolsonaro saiu em turnê
internacional para evitar (ou ao menos adiar) a síndrome do pato manco —aquela que drena o
poder de governantes em fim de mandato.
Sem esconder a vontade de se dirigir ao público brasileiro, o
presidente tentou transmitir na ONU a percepção de que preserva sua autoridade.
Mais do que isso, quis apresentar o argumento de que há um governo a ser
defendido, sem se importar com a realidade de que praticamente todos os
elementos do discurso eram conhecidos e enfrentam certa desconfiança do
eleitorado.
Os problemas de credibilidade abalam até mesmo o esforço de
Bolsonaro para modular a retórica inflamada. O presidente pode ter reduzido o
tom belicoso do pronunciamento de 2019, mas ainda aplicou uma carga ideológica
ao discurso e terminou com uma versão do conhecido lema "Deus, pátria e
família", adotado por fascistas brasileiros.
No fim das contas, a passagem de Bolsonaro pela ONU completou o
horário eleitoral de alto custo em que ele transformou sua turnê internacional.
A menos de duas semanas do primeiro turno, resta ao presidente ampliar sua
exposição a qualquer custo, mesmo que muita gente já saiba o que ele tem a
dizer. [Ilustração: Laerte]
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