O boicote de Campos Neto e a incógnita Haddad
No mundo prático, a vitória será total de Campos Neto, ajudando, sozinho, a inviabilizar um governo eleito por milhões de cidadãos.
Luís Nassif/Jornal GGN
A estratégia de Lula, para enfrentar uma conjuntura amplamente desfavorável, consistia nos seguintes pontos:
- Acalmar as Forças Armadas, com a indicação de um Ministro da Defesa anódino.
- Acalmar a Câmara negociando continuamente com Arthur Lira e administrando as demandas do Centrão.
- Definir uma estratégia econômica para atuar em estrada estreita, visando acalmar o mercado.
Em cima dessa estratégia, o ministro da Fazenda Fernando Haddad definiu seus movimentos. Consistiu nos seguintes pontos:
- Definir uma nova âncora fiscal, o Arcabouço, com um pouco mais de flexibilidade em relação à Lei dos Tetos.
- Trocar o limite de gastos por metas de superávit, confirmado no aumento da arrecadação, através da redução de subsídios e de espaços para engenharia tributária.
- Promover uma aproximação com o mercado, visando reduzir as desconfianças,
Reduzidas as desconfianças, tiraria os principais argumentos do Banco Central, para manter a Selic no nível atual. Haveria pressão de todos os agentes econômicos, obrigando Roberto Campos Neto e reduzir a Selic.
A estratégia foi brilhantemente executada. Eliminou o catastrofismo alimentado pelo mercado, conseguiu a aprovação dos grandes players internacionais, refletida no aumento do ingresso de dólares no país. Simultaneamente, houve uma redução nos preços, um aumento da popularidade de Lula, mesmo antes dos impactos do novo Bolsa Família.
Hoje em dia, há uma frente contra os juros altos, formada por bancos, empresas varejistas, federações do comércio, indústria e agricultura, associações de pequenas empresas, em uma unanimidade poucas vezes vista contra os abusos da Selic.
No anúncio da estratégia, apontamos dois riscos centrais: o primeiro, a dificuldade em retirar subsídios de grandes empresas; a segunda, a dificuldade em abrir a cabeça de Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central. A primeira frente está sendo bem enfrentada. O problema é o fator Campos Neto.
Havia duas hipóteses para a insistência de Campos Neto em manter os juros em níveis extravagantes. A primeira, a supina ignorância em política monetária e no papel do BC. A segunda, a de ser um agente com a missão de boicotar um governo que, em que pese todas as limitações que enfrenta, acabou com o saque ao Estado, com a privatização selvagem e, dando certo, podendo trazer de volta políticas desenvolvimentistas. De fato, com dois anos segurando a Selic na casa dos dois dígitos, Campos Neto matará qualquer possibilidade de reeleição de Lula ou de eleição de um candidato seu.
Com a decisão de hoje, de manter a Selic intocada, robustece-se a hipótese de um boicote intencional da parte do BC, em uma quadra da economia com quebradeira generalizada de empresas de vários tamanhos, com uma crise que atinge todo o comércio varejista e todos os setores que dependem de financiamento.
Ao mesmo tempo, com esse nível de Selic, o serviço da dívida pública consumirá o equivalente ao segundo orçamento de ministérios, perdendo apenas para os gastos da Previdência.
Qual será a saída? Mesmo com a ida de Gabriel Galípolo para a Diretoria de Política Monetária do BC, não há nenhum sinal do BC de iniciar a queda de juros. Mesmo se iniciar, o atraso será tão grande que levará no mínimo dois anos para a Selic voltar à casa de um dígito.
Em algum momento, o governo Lula terá que agir politicamente, negociar com o Congresso e retirar essa independëncia absurda, que joga os destinos do país nas mãos de burocratas que não prestam contas a ninguém.
No futuro, haverá o reconhecimento de que Haddad venceu a discussão teórica, com a história dando a Campos Neto a devida classificação de pior presidente do BC da história. No mundo prático, a vitória será total de Campos Neto, ajudando, sozinho, a inviabilizar um governo eleito por milhões de cidadãos.
Governo Lula e Banco Central travam luta política https://tinyurl.com/2wytpzck
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