21 julho 2023

Mortes por controle remoto

É hora de enquadrar os drones assassinos

Campanha global propõe: é urgente criar um tratado para frear as mortes por controle remoto. Com avanço da IA, algoritmos poderão decidir os alvos e apertar o gatilho – e dizimar ainda mais civis no Sul. ONU se omite diante das violações
nn Wright para El Salto Diario | Tradução: Maurício Ayer / OutrasPalavras


 

O ativismo cidadão pelas mudanças na forma como as guerras brutais são travadas tem uma luta extremamente difícil, mas não impossível. Os cidadãos conseguiram que a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovasse tratados que abolem as armas nucleares e proíbem o uso de minas terrestres e munições cluster. É claro que os países que querem continuar usando essas armas não seguirão o exemplo da grande maioria dos países do mundo que assinaram esses tratados.

Os Estados Unidos e os outros oito países que possuem arsenais nucleares se recusaram a assinar o tratado para abolir as armas nucleares. Da mesma forma, os Estados Unidos e outros 15 países, incluindo a Rússia e a China, recusaram-se a assinar a proibição do uso de bombas de fragmentação. Os Estados Unidos e outros 31 países, incluindo Rússia e China, recusaram-se a assinar o tratado de proibição de minas terrestres. 

No entanto, o fato de países “canalhas” e belicistas, como os Estados Unidos, se recusarem a assinar os tratados que a maioria dos países do mundo deseja, não impede que pessoas com consciência e responsabilidade social tentem trazer estes países à razão, para o bem da sobrevivência da espécie humana.

Sabemos que estamos enfrentando ricos fabricantes de armas que compram os favores de políticos nesses países em guerra por meio de doações de campanha e outros regalos. Na contramão desses prognósticos, será lançada em 10 de junho de 2023, em Viena, Áustria, a mais recente iniciativa dos cidadãos para proibir um artefato de guerra específico, na Cúpula Internacional pela Paz na Ucrânia.

Uma das armas de guerra preferidas do século XXI são os veículos aéreos não tripulados. Com essas aeronaves automatizadas, os operadores humanos podem estar a dezenas de milhares de quilômetros de distância, observando por meio das câmeras a bordo da aeronave. Nenhum ser humano deve estar no solo para verificar o que os operadores acham que veem do avião, que pode estar a milhares de metros de altura.

Como resultado da imprecisão da análise dos dados feita por operadores de drones, milhares de civis inocentes – no Afeganistão, Paquistão, Iraque, Iêmen, Líbia, Síria, Gaza, Ucrânia e Rússia – foram massacrados por mísseis Hellfire e outras munições disparadas por esses pilotos. Civis inocentes, por comparecerem a casamentos e funerais, foram massacrados por operadores de drones. Até mesmo as pessoas que vêm em socorro das vítimas de um primeiro ataque de drones têm sido mortas nos chamados “toques duplos”.

Muitos exércitos ao redor do mundo estão seguindo o exemplo dos EUA no uso de drones assassinos. Os Estados Unidos usaram drones armados no Afeganistão e no Iraque, matando milhares de cidadãos inocentes desses países. Ao usar drones, os militares não têm a obrigação de ter pessoas no solo para confirmar os objetivos ou verificar se as pessoas mortas eram os alvos pretendidos.]

Para os exércitos, os drones são uma maneira segura e fácil de matar seus inimigos. Civis inocentes mortos podem ser considerados “danos colaterais” e raramente se investiga o processo de inteligência que levou à morte de civis. Se uma investigação acontecer, os operadores de drones e analistas de inteligência estão isentos de responsabilidade pela morte extrajudicial de civis inocentes.

Um dos mais recentes ataques de drones contra civis inocentes, que foi amplamente divulgado, ocorreu na cidade de Cabul, no Afeganistão, em agosto de 2021, durante a desastrada evacuação daquele país pelos EUA.

Depois de seguir por horas um carro branco que os analistas de inteligência acreditavam possivelmente estar carregando um terrorista do ISIS-K, um operador de drone dos EUA lançou um míssil Hellfire no carro quando ele entrou em um pequeno complexo residencial. Naquele momento, sete crianças pequenas corriam até o carro para fazer com ele o percurso restante dentro do complexo. Embora os principais comandantes militares dos EUA inicialmente tenham descrito as mortes dos indivíduos não identificados como um ataque de drone “justo”, quando a mídia investigou quem havia sido morto no ataque, revelou-se que o motorista do carro era Zemari Ahmadi, funcionário da Nutrition and Education International, uma organização de apoio com sede na Califórnia, que cumpria sua rotina diária entregando suprimentos para vários locais em Cabul. Todos os dias, quando ele chegava em casa, seus fi lhos corriam para encontrá-lo e faziam com ele, no carro, os poucos metros até onde ele estacionava. Três adultos e sete crianças foram mortos no que mais tarde foi confirmado como um ataque “infeliz” a civis inocentes. Nenhum militar foi repreendido ou punido pelo erro que matou dez inocentes.

Nos últimos 15 anos, viajei para o Afeganistão, Paquistão, Iêmen e Gaza para falar com famílias que tiveram entes queridos inocentes assassinados pelas mãos de pilotos de drones que os operavam a centenas, senão milhares de quilômetros de distância. As histórias são semelhantes. O piloto do drone e os analistas de inteligência, geralmente homens e mulheres jovens, na faixa dos 20 anos, interpretaram mal uma situação que poderia ter sido facilmente resolvida com os “pés no chão”. Mas os militares acham mais fácil e mais seguro matar civis inocentes do que colocar seu próprio pessoal em campo para fazer avaliações no local.

Inocentes continuarão morrendo até encontrarmos uma maneira de impedir o uso desse sistema de armas. Os riscos aumentarão à medida que se delegar para a IA cada vez mais as decisões de direcionamento e lançamento. O projeto do tratado é um primeiro passo na batalha difícil para conter a guerra de drones de longo alcance cada vez mais automatizada e armada. Junte-se a nós na Campanha Internacional pela Proibição de Drones Armados e assine a petição e a declaração que apresentaremos em junho em Viena e que, por fim, levaremos às Nações Unidas.

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